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Chapéu
Gestor?

Privatizações e concessões contrariam imagem de Doria

Linha fina
Para economistas, proposta pode ser danosa à população de São Paulo e prefeito poderia elaborar políticas para melhorar gestão dos locais
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Foto: Fernando Pereira / Secom PMSP

São Paulo – A proposta de privatizações e concessões de equipamentos e serviços públicos, anunciada pelo prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), é considerada uma demonstração de incapacidade de gestão pelo economista da Unicamp Guilherme Mello e pelo diretor do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), Cândido Grzybowski. Para ambos, o projeto pode levar à exclusão da população mais pobre e ao sucateamento dos projetos menos rentáveis na cidade, além de ser uma forma de desobrigar o poder público a garantir acesso, estrutura e manutenção de serviços e equipamentos públicos para toda a população.

A gestão Doria anunciou em fevereiro, durante visita do prefeito a Dubai, nos Emirados Árabes, que o governo municipal pretende privatizar ou conceder a gestão de parques – inclusive do Ibirapuera, cartão postal da cidade –, serviço funerário, Bilhete Único, autódromo de Interlagos, estádio do Pacaembu, entre outros. Segundo a gestão, a cidade não tem condições financeiras de manter esses equipamentos e, com a parceria da iniciativa privada, a população teria acesso a serviços melhores. Porém, a gestão ainda não divulgou detalhes sobre a proposta.

“A iniciativa privada busca lucro. Pode prestar um bom serviço, desde que o ganho seja interessante. O poder público deve garantir universalização de acesso e o melhor serviço possível. São coisas que não se misturam. A privatização tende a causar problemas graves no futuro, porque se o lucro não crescer pode levar ao sucateamento ou a uma mercantilização cada vez maior do serviço. Tivemos um exemplo terrível, recentemente, nos presídios que foram privatizados. Crer que só por privatizar vai melhorar é um absurdo”, avaliou Mello.

Para ele, esse tipo de proposta busca transferir a responsabilidade da gestão dos equipamentos e da verba para a iniciativa privada. O que contraria o próprio discurso do prefeito, que na campanha dizia não ser político, mas um gestor. “Essa medida tira do poder público a capacidade decisória e aliena o povo de reivindicar políticas para aquele equipamento ou serviço, por que deixa de ser cidadão para ser consumidor. Se Doria foi eleito com um discurso de gestor, porque agora  abre mão de gerir?”, questionou Mello.

Para Grzybowski, o discurso de que o privado é melhor omite que o dinheiro utilizado pelo concessionário continua sendo público, só que administrado por uma organização de direito privado. Como no caso das Organizações Sociais de Saúde, que administram Unidades Básicas de Saúde e hospitais em São Paulo, mas que não investem no serviço, apenas administram o dinheiro público. “De onde vem o ganho destas organizações? De economia de dinheiro e aplicações de verba pública no mercado de valores. É o mesmo dinheiro que a prefeitura poderia trabalhar para administrar melhor. Mas que está gerando lucro sem melhoria nos serviços”, afirmou.

Outro risco é de as empresas criarem regras cada vez mais excludentes quanto ao acesso das pessoas aos parques, por exemplo. Eventos exclusivos, áreas de acesso restrito, podem ser utilizados como forma de garantir ganhos. Grzybowski lembrou também que muitas vezes a recuperação do serviço depois da concessão pode ser ainda mais onerosa para o poder público. “Se não houver o retorno esperado, a iniciativa privada vai buscar meios de economizar para garantir o lucro. E não vai hesitar em abandonar o projeto. Daí vai voltar pra mão do poder público para reconstruir”, explicou.

O diretor do Ibase defendeu que o melhor seria envolver os cidadãos na gestão do espaço, garantir que eles tenham controle sobre a aplicação dos recursos e as decisões. “Em vez de privatizar, porque não tornar mais público e colocar o povo para fiscalizar? Essa proposta é, além de tudo, antidemocrática. A participação pode ser muito mais efetiva do que a concessão. Até porque uma empresa certamente não vai querer intervenção da população nas suas decisões, que buscam ampliar os lucros”, concluiu Grzybowski.

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