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Chapéu
Gestão Doria

Chuva, sol e choro diante da prefeitura para Doria 'descongelar'

Linha fina
Músicos tocam e pedem recursos para manutenção do Clube do Choro. Gestão municipal bloqueou grande parte do orçamento destinado à cultura
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Imagem: Reprodução / Clube do Choro

São Paulo – Os primeiros músicos chegaram pouco antes das 11h diante da sede da prefeitura de São Paulo, no Viaduto do Chá, centro paulistano, nesta quarta-feira 12. Meia hora depois, eram dezenas, que começaram a roda de chorinho com Cochichando, de Pixinguinha. Era o início de um protesto musical pela liberação de orçamento para o Clube do Choro de São Paulo, que também perdeu sua sede, o Teatro Arthur Azevedo, na Mooca, zona leste.

Debaixo de sol e chuva, lembrando um choro de Chico Buarque ("uns dias chove, noutros dias bate sol"), em torno de 60 músicos, sendo boa parte bastante jovem, tocaram clássicos do gênero, enquanto pediam o "descongelamento" de recursos. Enquanto tocavam Na Glória (Raul de Barros/Ary Santos), o refrão tradicional que remete ao título da composição virou "ê, Doria", uma reclamação com humor ao prefeito João Doria (PSDB), que contingenciou grande parte do orçamento destinado à cultura, acabando com os recursos para o Clube do Choro e "despejando" seus integrantes do teatro.

"É falta de visão dos governantes", diz o percussionista Yves Finzetto, presidente do Clube, afirmando que a cultura proporciona também dá retorno financeiro. "São Paulo é uma capital cultural e movimenta muito a economia. Os administradores públicos poderiam ter uma visão do século 21", critica. "O choro nunca dependeu de recursos públicos para sobreviver. Há uma profusão de grupos e rodas pela cidade. Mas um centro de excelência amplifica e se torna referência, um polo aglutinador do gênero. Sem a sede, a população perde um ponto de referência."

Já juntando público, os chorões vão de Cheguei (Pixinguinha e Benedito Lacerda) e Doce de Coco (Jacob do Bandolim), passam por Sonoroso (K-Ximbinho), quando começa a chuva. Eles continuam, mas a água aumenta e todos correm para uma marquise, do outro lado da rua. Ao meio-dia, sob as badaladas dos sinos da Igreja de Santo Antônio, a mais antiga do centro, estão sob outra marquise, na Praça do Patriarca, encharcados e tocando. "Isso é Brasil!", grita Sorriso do Bandolim.

Inaugurado em 1952, o Teatro Arthur Azevedo passou por quatro anos de reformas até ser reaberto pela prefeitura (na gestão anterior, de Fernando Haddad), em agosto de 2015, quando se tornou sede do Clube do Choro, com programação regular. Até este ano – não houve mais apresentações no local. "A população local, acostumada, com a programação semanal, achou estranho", lembra Yves. Um jornal da região, a Gazeta da Vila Prudente, procurou a Secretaria da Cultura e foi informado que o teatro não abrigaria mais os músicos do Clube.

Na terça 11, a assessoria de comunicação da secretaria reafirmou que o Arthur Azevedo "não é mais sede" do Clube e que não havia previsão para a retomada das apresentações. Também informou que o orçamento está contingenciado. Desde o início do ano, os músicos fazem gestões e tentam convencer a prefeitura a liberar recursos.

Para Yves, falar em contenção de despesas chega a ser um "argumento perverso", considerando que o orçamento para a área de cultura não atinge 1% do total do município, e que o Clube teria direito a 0,1% desse valor. Nas conversas com representantes da administração, segundo ele, a resposta é que "o processo de descongelamento tem outras prioridades". Ele avalia que a prefeitura tenta apostar em uma divisão, mas acrescenta que "estamos juntos em uma Frente Única da Cultura".

O sol reaparece, já perto das 13h, e as dezenas de músicos atravessam novamente a rua para se instalar outra vez diante da sede da prefeitura, onde alguns funcionários parecem gostar da apresentação. Tocam Tico-tico no Fubá (Zequinha de Abreu) e Noites Cariocas (também de Jacob). Parecem se divertir. Doria viajou segunda-feira 10 para a Coreia do Sul.

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