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Capital

Programa de Metas de Doria decepciona organizações

Linha fina
Movimentos organizados da sociedade civil acusam a gestão do tucano de dificultar a participação popular na elaboração de plano que deve guiar a gestão até 2020, além de propor "metas muito tímidas"
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Foto: Reprodução Facebook Sérgio Bispo

São Paulo – "O Programa de Metas do prefeito João Doria (PSDB) é decepcionante. Claramente ele foi forjado para que a participação popular fosse ignorada", avalia a ativista Ana Carolina, dos coletivos Cidade a pé e SampaPé. Para reverter a deficiência da gestão em escutar a sociedade, movimentos sociais organizados planejam realizar uma série de intervenções em todas as regiões da capital. A primeira delas foi organizada nesta terça 18, na Praça do Patriarca, ao lado da sede da prefeitura paulistana.

Mais de 50 organizações estão reunidas em torno do movimento Cidade dos Sonhos, que organiza as intervenções, como explicou a representante do projeto Gabriela Vuolo. "Estamos propondo melhorias nas metas apresentadas por Doria. Elas são muito vagas, sem indicadores. Não tem nem orçamento descrito, falta muito 'recheio', não dizem quanto, como e onde fazer o quê, além de serem muito tímidas. Se a prefeitura não apresentou as métricas e os indicadores, as organizações da sociedade civil sabem bem o que precisa ser feito, e estamos assim sugerindo".

A motivação para o movimento partiu do modo como a participação popular em questões essenciais para a cidade foi tratada pela gestão tucana. "A prefeitura concentrou as audiências públicas sobre o programa de metas em três dias. Isso foi péssimo. O período de consulta vai até o dia 30 de abril, mas quem quiser participar presencialmente não tem como, à exceção de uma última audiência na Câmara dos Vereadores, que será feita em uma segunda-feira 24 no período da tarde, isso complica a vida", disse Gabriela.

Ana Carolina destaca os prejuízos da redução da participação popular no processo da produção do documento que deve orientar as ações da gestão até 2020: "Quando falamos em participação das pessoas, precisamos de audiências públicas, e nos bairros. Isso faz parte do aprendizado da democracia. Isso tem muito valor para o fortalecimento da sociedade civil. Isso a prefeitura não entende, que não é uma questão de um site bonito. O valor da audiência pública é muito maior do que algo individual em um site".

Mesmo a possibilidade de participação via internet apresenta dificuldades para o cidadão, aponta Gabriela. "Lançaram duas plataformas confusas e a que representa de fato uma contribuição, o Planeja Sampa, não foi sequer divulgada", afirma.

Recheio de problemas - Entre os presentes na primeira das ações planejadas para fazer o prefeito ouvir a população sobre o que quer para a cidade, uma unanimidade: "o Programa de Metas de Doria é tímido", conclusão refletida em todas frentes de mobilização e organização ouvidas pela Rede Brasil Atual.

Augusto Aneas, da Rede Novos Parques, critica o tratamento dado à questão ambiental no Programa. "O que aparece lá é o plantio de duzentas mil árvores. Isso é uma coisa que nós, dos coletivos, já conseguimos fazer em um ano. Não precisamos de prefeito para isso, e sim para enfrentar questões maiores."

Em oposição ao projeto "humilde" do tucano, Aneas lembra que a prefeitura pode começar cumprindo metas previstas no próprio Plano Diretor Estratégico (PDE) da cidade, elaborado e aprovado durante a gestão de Fernando Haddad (PT). "O PDE foi uma grande experiência. Ele prevê a criação de um fundo para novos parques em uma aliança entre prefeitura e o setor privado. Quem doa alguma quantia para a prefeitura, ela coloca o mesmo montante proporcional. Mas este instrumento ainda não está em vigor. Seria muito importante sair do papel", afirma.

Já o ativista Pedro Telles, representante do Greenpeace, afirma que a entidade centrou esforços na proposição de metas para mobilidade e energia, mas foi, de certa forma, ignorada pela gestão. "A prefeitura não se comprometeu com os planos levantados, não existe nem citação no Programa de Metas. Nos dois temas que atuamos, como em vários outros, o plano (da prefeitura) é bem deficiente. Em mobilidade, nossa atenção foi para ônibus não poluentes. Já existe uma lei municipal de 2009 que prevê, até 2018, todos os ônibus rodando em São Paulo com combustíveis não poluentes. A pergunta que fica é se Doria vai cumprir a lei", questiona.

A questão do cumprimento pela atual gestão de programas oriundos de gestões anteriores, ou mesmo de outras esferas do poder público levanta questionamentos em praticamente todos os setores abordados pelo programa de Doria. O catador de material reciclado Sérgio Bispo, da Kombosa Seletiva, pondera que "a gestão não se compromete a trabalhar com o que já vinha sendo feito. Não adianta criar a roda, tem que fazer ela girar. Já existem programas de reciclagem, de logística reversa, que ele deveria dar continuidade".

Para os movimentos, o programa de Doria tem uma visão puramente assistencialista do catador, como explica Bispo. "A noção da gestão é de que o catador é uma pessoa em situação de rua e o que deve ser feito é um trabalho de assistência social. Esse recorte é pequeno, é hora de enxergar os catadores como empreendedores. Catadores criam postos de trabalho. Precisamos aperfeiçoar o sistema com equipamentos, espaços, logística, assessoria técnica. Hoje é mais fácil criar emprego com a coleta do que em grandes corporações. É mais barato e você ainda cuida do planeta. Todos ganham, em uma grande cadeia", disse.

"A prefeitura tem que pensar não em 2020 (ano de eleições) mas sim em um mundo melhor, uma cidade melhor, mais justa. Uma 'cidade linda' deve ser de todos e não apenas para um grupo", completa Bispo, ao citar a já existente Política Nacional de Resíduos Sólidos, de 2010, "uma lei que contou com anos de estudo e não pode ser ignorada".

Ainda sobre resíduos, Guilherme Turri, do movimento Objetivos da Compostagem, critica a timidez do Programa de Metas. "Falando sobre resíduos, existe uma timidez objetiva e outra, subjetiva. A mais objetiva é que a prefeitura fala em 100 mil toneladas por ano, eles se comprometem a chegar neste número no fim da gestão. Mas isso representa 1,8% do que a cidade produz. São apenas sete dias de coleta de lixo. Essa meta é possível de ser atingida sem ninguém fazer nada. No aspecto subjetivo, esperávamos também algo muito mais ousado. Esperávamos que a gestão olhasse para coisas que já foram feitas e importantes, independentemente de filiação política. A gestão ignora o (programa) Compostas São Paulo, só porque veio do prefeito anterior, mas é o maior projeto do mundo de compostagem doméstica, amplamente elogiado", afirma.

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