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Lógica excludente de moradia predomina em SP

Linha fina
Pobres são afastados do centro da cidade enquanto prédios desocupados acumulam dívidas de IPTU
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São Paulo – Pelo menos 3 milhões de pessoas – quase 30% da população – moram em condições precárias na maior cidade do país, segundo dados da Secretaria Municipal de Habitação de São Paulo. A prefeitura informa ainda que são 380 mil domicílios em favelas, 383 mil em loteamentos e 80,4 mil em cortiços, e que seria necessária a construção de pelo menos 226 mil moradias. Esse déficit sobe para 670 mil quando se leva em conta as habitações com algum tipo de inadequação, entre elas a falta de regularização fundiária.

É o caso das 237 famílias da ocupação Mauá (ao lado), no centro da cidade, que às vésperas do aniversário de cinco anos no prédio, que lhes garantiria o direito de posse por usucapião, receberam ordem de despejo. A Justiça concedeu liminar para reintegração em favor do proprietário, que acumula R$ 2,5 milhões em dívidas de IPTU do imóvel. “A gente não desanima. Quem está acostumado na luta sabe que a luta vai ser permanente”, diz Nelson da Cruz Souza (foto abaixo), uma das lideranças da ocupação.

> Fotos: imagens da ocupação Mauá

A situação é tensa e indefinida. Após uma primeira reunião na Polícia Militar – da qual participaram, além dos movimentos em defesa pela moradia, a Secretaria de Habitação, Ministério Público e Defensoria Pública –, foi determinado que a prefeitura faria o cadastro das famílias antes de qualquer ação de despejo. Mas o prazo para isso, segundo Nelson, expirou sem que nenhum técnico do município aparecesse no local. “Uma fonte disse pra gente não se preocupar que nessa época de eleição a prefeitura não vai querer nenhum despejo. Mas, e quando passar?”, indaga o morador.

Desperdício – Antes de ser ocupado, o imóvel de seis andares ao lado da Estação da Luz ficou abandonado por 17 anos. “Era um prédio em pleno centro da cidade que não cumpria sua função social, e ainda era ponto de uso de droga, violência. Como ele tem muitos aqui na região”, critica Nelson.

  Segundo a arquiteta e urbanista Danielle Klintowitz imóveis abandonados nos centros de grandes capitais são comuns no país. “Em geral, o déficit habitacional nas principais cidades brasileiras corresponde ao número de imóveis inabitados nos centros dessas cidades. E São Paulo segue essa regra”, informa.

Ela destaca que o uso desses prédios como moradias populares seria a solução mais acertada e econômica. “O centro velho e o centro expandido são as regiões com mais infraestrutura e, ao mesmo tempo, mais subutilizadas, já que aproveitadas só durante o dia. Reocupar os imóveis que estão em bairros com empregos, transportes e serviços urbanos é muito mais econômico para a cidade, que não teria de investir em novas linhas de ônibus, vias ou saneamento.”

Exclusão – “As moradias populares em geral são feitas em bairros distantes, como Tiradentes. Ou seja, governos e prefeituras continuam seguindo a mesma lógica excludente, tirando essa população das áreas mais próximas aos locais de emprego. Nesses casos, ou o morador abandona o local, ou permanece na área abrindo mão do que lhe restava de cidadania”, acrescenta a urbanista.

Mobilidade – Danielle destaca ainda que a ocupação do centro seria positiva para toda a cidade, pois melhoraria a mobilidade urbana. “Estudos apontam que 4 milhões de moradores se deslocam todo dia da zona leste, com poucos postos de trabalho, para a região centro-oeste. A zona leste é quase uma cidade dormitório. Diante disso, não ter política de reutilização desses imóveis no Centro, com dívidas gigantescas com o município, é um absurdo.”

Mais de 90% dos moradores da Mauá trabalham próximos às suas residências. “Muitos vêm até almoçar em casa”, conta Nelson. “Já uma parente minha que mora em Tiradentes leva duas horas pra chegar no trabalho”, compara.

Mas o que prevalece, lamenta a liderança, ainda é a especulação imobiliária e o direito dos grandes proprietários. “E o direito à moradia e à cidadania, onde fica?”

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Andréa Ponte Souza - 30/5/2012

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