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Repressão na Cracolândia é acerto de contas

Linha fina
Padre Júlio Lancellotti diz que área funciona na base da corrupção com agentes do estado recebendo propina, e ação de terça à noite provavelmente se deu porque “alguém não está recebendo”
Imagem Destaque
Rede Brasil Atual
18/1/2017


São Paulo – A Polícia Militar de São Paulo atacou, com bombas de gás e balas de borracha, dependentes químicos que estavam na região da chamada Cracolândia, no centro da capital paulista, na noite de terça-feira 17. Segundo a PM, ainda durante à tarde, usuários teriam atirado objetos contra uma de suas bases móveis. Mais tarde, três policiais teriam sido feridos. A PM não informou se houve feridos entre os dependentes.

Para o padre Júlio Lancellotti, da Pastoral do Povo de Rua, trata-se de um acerto de contas entre usuários, traficantes e policiais. Ele denuncia que a Cracolândia funciona na base da corrupção. "É alguma coisa que eles estão devendo para a polícia. Sempre é um acerto. É algum problema que está havendo, porque alguém não está recebendo a taxa que deveria receber. Há uma rede de corrupção muito forte. Uma rede em que alguns agentes do estado recebem uma taxa para que aquilo funcione da maneira como funciona", afirma o padre, em entrevista à Rádio Brasil Atual na manhã desta quarta-feira 18.

> Ouça a entrevista à Radio Brasil Atual

Ele diz também que esse "acerto de contas" ocorre todos os anos no mês de janeiro, e compara com casos de corrupção de setores da classe política brasileira. "É um reordenamento. Lembra o Congresso Nacional. Sempre que alguém não votou certo, que alguém ameaça que não vai votar, ou quando o favor não é feito, tem uma rebelião na base do governo. É um esquema de corrupção. Deve ter na Cracolândia uma espécie de mensalão", analisa.

Segundo ele, a cada ação desse tipo, quem sofre são os moradores e os dependentes, os "desprotegidos". "Essa negociação não é feita por quem está segurando o seu cachimbinho. Esse faz parte da engrenagem. É como na corrupção do Congresso: tem os que comandam o esquema e os outros que fazem parte da engrenagem."

Outro efeito nocivo, segundo Lancellotti, é que as ações sociais e de assistência psicossocial aos usuários desenvolvidas na Cracolândia são afetadas por causa desses acertos. "Depois de ontem, foi tudo para o zero outra vez."

Prisão de Boulos – Padre Júlio lamentou ainda as ações de repressão da PM durante uma desocupação na zona leste da capital na manhã de terça-feira, que deixou 3 mil pessoas sem teto – inclusive crianças e idosos – e culminou com a prisão de Guilherme Boulos, líder do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST). "Todos os que estiverem na resistência serão punidos", ele prevê.

> Boulos foi preso em desocupação violenta em SP

Presente na delegacia em que Boulos esteve detido, padre Júlio também relatou o momento em que a vereadora Juliana Cardoso (PT) recebeu ordem de prisão por "resistência ideológica". "Como vamos viver em um regime democrático sem resistência ideológica? O direito de desobedecer a ordens injustas, segundo São Tomás de Aquino, é uma obrigação", questionou.
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