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Água: contagem regressiva para o fim

Linha fina
Segundo especialistas, inação do governo do estado levou ao esgotamento do sistema Cantareira, que deve deixar 6,5 milhões de pessoas sem água
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São Paulo – O novo presidente da Sabesp, Jerson Kelman, declarou recentemente que o principal sistema de abastecimento de São Paulo, o Cantareira, pode secar em março ou, na melhor das hipóteses, em junho deste ano. O pior, entretanto, é que o Governo do Estado de São Paulo não apresenta nenhuma alternativa de curto prazo para contornar este verdadeiro desastre que deixará 6,5 milhões de pessoas sem água na Grande São Paulo.

Mais impressionante é que essa situação se desenha desde os anos 1990, segundo o especialista em recursos hídricos Renato Tagnin. Foi no final daquela década que o sistema começou a gastar mais água do que capta. Em 2004 já se sabia que a crise seria uma realidade, justamente no mesmo ano em que a Sabesp conseguiu a renovação da outorga para a exploração e distribuição de água no estado.

Em contrapartida para obter a nova licença, a empresa deveria apresentar plano de contingência para situações como a vivenciada atualmente. Esse plano jamais foi apresentado, segundo parecer técnico emitido pelo Grupo de Atuação Especial de Defesa do Meio Ambiente (Gaema), do Ministério Público Estadual (MPE) em Piracicaba, o que ajudou a contribuir com a atual situação.

“O papel do plano de contingência é raciocinar sobre o que fazer diante de alguns cenários, e fazer isso de forma compartilhada, divulgada, e não escondida da população”, explica Tagnin. “Uma das coisas que poderiam ter sido feitas seria o consumo racional daquilo que temos. Vamos comer o que tem. Só tem um bife? Então vamos dividir. Se isso tivesse sido feito em janeiro de 2014, não estaríamos vivendo essa situação”, acrescenta.  

Tagnin refere-se à divisão do consumo entre indústria, agricultura e população. A Lei de Recursos Hídricos (9.433/97) determina que em situações de escassez, o uso deve priorizar em primeiro lugar o consumo humano, depois o animal e, por último, atividades econômicas.  Segundo a ONU, a agricultura utiliza 70% da água. A indústria 22% e o consumo humano apenas 8%.

“Tem de priorizar abastecimento humano, como determina a lei. O governo teria de racionar ainda em 2014 a água para consumidores não humanos, os grandes consumidores, que são a indústria, a agricultura, e isso não foi feito, temendo-se o uso eleitoral”, avalia.

O que fazer - Agora que a situação é irreversível, o que fazer? Marussia Whately, consultora na área de recursos hídricos e sustentabilidade e coordenadora da Aliança pela Água, também acredita que o ano eleitoral de 2014 ajudou a agravar a crise. O medo de perder votos levou o governador Geraldo Alckmin a não adotar medidas impopulares como racionamento ou multas.  “Se essas ações tivessem sido tomadas ainda no ano passado, não estaríamos vivendo essa situação extremamente grave.”

Marussia lamenta o fato de até agora não existir intenção do governo estadual em discutir com a sociedade um plano de emergência. E enumera medidas necessárias como a distribuição maciça de água gratuita para a população de baixa renda, regulamentação do preço do caminhão-pipa, preparação dos postos de saúde para tratar casos de desidratação e ações de incentivo fiscal para adquirir equipamentos de captação de águas pluviais. “Nós temos mais dois meses de verão. Depois acaba o período de chuvas e teremos uma situação bastante alarmante que vai requerer uma operação de guerra que deve prever inclusive manifestações violentas da população”, vaticina.


Rodolfo Wrolli - 22/1/2015

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