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Contra falta d'água, ato cobra propostas efetivas

Linha fina
Ativistas de diversos movimentos sociais são unânimes em apontar real origem da crise: privatização de parte da Sabesp promovida pelo governo do estado, que prioriza lucros dos acionistas em detrimento de investimentos na captação e distribuição de água
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São Paulo – “O governador culpa São Pedro, mas São Pedro está fazendo a parte dele. Essa desculpa não cola.” A afirmação em tom de brincadeira, mas com fundo de seriedade, foi dita nesta sexta-feira 20, debaixo de uma forte tempestade, durante Ato de Luta pela Água promovido pelo coletivo homônimo formado por diversos movimentos sociais e entidades sindicais.

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A manifestação se concentrou na praça Oswaldo Cruz e percorreu a Avenida Paulista até a Secretaria de Saneamento e Recursos Hídricos do Estado de São Paulo, localizada na Rua Bela Cintra. Em frente ao prédio, uma comissão formada por integrantes do coletivo entregou a um assessor jurídico da pasta, Vanildo Neubauer, documento contendo sugestões a serem implantadas pelo governo para que a população sofra menos com a crise de falta de água. A reivindicação dos manisfestantes era serem recebidos pelo secretário de Saneamento e Recursos Hídricos, Benedito Braga, o que não ocorreu. 

As medidas propostas são: decretar imediatamente estado de calamidade pública; não ao aumento de tarifas de água e sim ao cancelamento dos descontos concedidos aos grandes consumidores (shoppings, jornais, emissoras de TV, condomínios de luxo etc.); requisitar poços artesianos para uso comum; implantar programa de cisternas e reservatórios coletivos; e elaborar plano de emergência com ampla participação popular.

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Neubauer se comprometeu, em nome do secretário, a dar uma resposta até sexta-feira 27. Na segunda 23 será requisitada audiência com Braga.

“A grande imprensa quer vender para a população o discurso do governador de que essas chuvas de fevereiro e março vão dar conta de resolver a falta de água, e não vão” afirma um dos coordenadores do coletivo Edson Aparecido. “A partir do mês que vem as chuvas vão cessar e nós vamos entrar novamente no período de seca, então dificilmente vamos escapar de um rodízio de cinco dias sem água e dois dias com”, acrescenta. 

Demissões – Mesmo diante da crise hídrica, a Sabesp promoveu centenas de demissões apenas em 2015, como denunciou o presidente do Sintaema, René Vicente. “A empresa vem em uma onda de economizar para manter o lucro dos acionistas e agora ela resolveu mandar embora trabalhadores. Nós tivemos em torno de 450 demissões e isso vai afetar diretamente o serviço prestado à população. Ao invés de demitir, a Sabesp deveria contratar para melhor atender a população neste momento de crise”, avaliou.

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Um desses trabalhadores demitidos é Erika Martins, que também esteve presente ao ato. “Essa crise hídrica já era anunciada desde 2004. O governo sabia, mas não fez nada porque posterga investimento para distribuir lucro para os acionistas”, afirmou a ex-funcionária que prestou serviços à Sabesp por 23 anos.

Lucros  Entre 2003 e 2013 (o balanço anual da empresa relativo a 2014 ainda não foi apresentado), dos R$ 13,1 bilhões lucrados pela Sabesp com a cobrança de água e esgoto da população, R$ 4,3 bilhões foram destinados aos acionistas, conforme relatório da diretoria econômico-financeira e de relações com investidores da Sabesp, apresentado em março de 2014.

O estatuto social da Sabesp determina que os acionistas podem embolsar no mínimo 25% do lucro líquido anual da empresa. Em 2003, 60,5% do total foram destinados dos sócios.

Professores – O Ato de Luta pela Água coincidiu em horário e local com a passeata dos professores do estado de São Paulo, que decidiram manter greve nesta sexta-feira 20 após assembleia no vão livre do Masp. Os docentes deram grande manifestação de apoio à causa do coletivo, até porque sofrem diariamente com a gravidade da situação.

O professor de história Ireldo Alves denunciou que na escola onde trabalha, na divisa entre Itaquera e Cidade Tiradentes, falta água sistematicamente. "Não é só água. Falta até papel higiênico. Os alunos têm de trazer de casa. Tanto a falta de água como a situação das escolas são reflexo do mesmo problema: a gestão de sucateamento do estado praticada pelo governador Geraldo Alckmin. Um professor que dá 12 aulas por semana ganha um salário mínimo por mês", desabafa.

Crise prolongada – O geólogo Delmar Mates, um dos maiores estudiosos sobre o tema, esteve presente ao ato e apontou como a principal causa da crise a mercantilização da água por meio da da privatização dos serviços de saneamento básico.

“A Sabesp, que tinha função de servir água acessível e barata para todos, transformou esse objetivo na busca a qualquer custo da lucratividade. Temos de fazer uma reflexão sobre as causas desta crise que nos estamos enfrentando, por que efetivamente ocorre a crise hídrica, quem são os responsáveis e a partir disso nós encontrarmos soluções, porque nós estamos diante de uma luta prolongada, e os efeitos da crise também serão prolongados.”


Rodolfo Wrolli – 20/3/2015

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