São Paulo – “Imagina você ser orientada por um superintendente, olhando no seu olho, assim: hoje você não tá aqui pra resolver problemas (de cliente), está aqui pra vender. Imagina se você é minha cliente e, sei lá, sofreu um assalto e quer bloquear o cartão. Aí eu tenho que inventar uma desculpa e dizer pra você ligar mais tarde?! Ou depois de tudo, te oferecer um consórcio?!”
O relato, de uma funcionária do Itaú, ilustra muito bem a questão ética vivida pela maioria dos bancários, pressionados pelas instituições financeiras a vender a qualquer custo e, assim, bater as metas diárias, “relâmpago” ou mensais, que tanto atormentam a categoria. “Me sinto frustrada. Isso é desrespeito com as pessoas”, diz.
“Meu sonho era ser bancária, mas quando entrei aqui vi que era um pesadelo. Não vim pra ser vendedora, mas é isso o que a gente tem que fazer, porque a meta é vender produto e você sempre tem que bater mais de 100% da meta”, conta outra bancária que aos 26 anos, devido à pressão, ficou dois anos em tratamento psiquiátrico.
A greve nacional da categoria, que chegou nesta quarta-feira ao sétimo dia, não é só por salário, mas por condições dignas de trabalho. “Somos uma das categorias que mais adoece. Tem bancário jovem infartando por causa da pressão no ambiente de trabalho. E tudo isso porque são obrigados a vender cada vez mais”, disse a presidenta do Sindicato, Juvandia Moreira, durante a paralisação.
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“A função dos bancos não é vender. Eles são concessões públicas que têm como papel financiar o desenvolvimento do país, fornecendo crédito mais barato e ganhando em escala. Mas ao invés disso, sobrecarregam os trabalhadores e empurram produtos aos clientes. Não é a toa que os bancos são sempre campeões nos rankings de reclamação dos órgãos de defesa do consumidor”, acrescentou a dirigente.
Adoecimento – Os depoimentos dos bancários, colhidos durante a greve, comprovam: “A meta é muito agressiva e em alguns aspectos desumana mesmo. Já tive gestor que pediu pra eu ligar na frente dele, pra ver porque eu não estava conseguindo vender. Eu ia no banheiro e ele ia atrás de mim. A gente surta”, conta outra bancária do Itaú.
“É o dia todo, é só o que faço: ligações para clientes para vender e tentar bater metas. Consegui alcançar a meta por dois meses e agora não estou conseguindo. A maioria não consegue. Meus colegas estão faltando bastante por conta de ficar deprimido por causa da pressão. Fiquei de atestado sem voz por falar muito no telefone. Em média, ligo para cem clientes por dia para vender”, diz uma funcionária do HSBC.
“As metas a gente consegue cumprir de vez em quando, são muito altas. Meus colegas que ficaram doentes desistiram e já saíram do banco. Penso nas metas aqui e fora do banco, penso o tempo inteiro no que tenho que fazer”, conta outro funcionário do HSBC.
Andréa Ponte Souza - 25/9/2013
Linha fina
Forçados a vender produtos para clientes, trabalhadores sofrem por pressão e por questões éticas
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