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Procurador vê desinteresse na Operação Zelotes

Linha fina
Em audiência, principal integrante do Ministério Público na operação critica imprensa por só destacar casos de corrupção com interesse político e tratar com discrição caso que envolvem grandes empresas
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São Paulo – O procurador do 6º Ofício de Combate à Corrupção da Procuradoria da República no Distrito Federal, Frederico de Carvalho Paiva, disse na quarta 13 que o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), ligado ao Ministério da Fazenda, é “um órgão ineficiente, pouco transparente, burocrático e que necessita de reforma”.

Membro do Ministério Público Federal, Paiva é o responsável pelas investigações da Operação Zelotes, da Polícia Federal, que investiga fraudes no Sistema Tributário Nacional, ocorridas no Carf entre 2005 e 2013. Segundo ele, a partir de abril do ano passado, por meio de quebras de sigilo bancário, telefônico e de dados, ficou comprovada a existência de manipulação de julgamentos no Carf com o objetivo de reduzir ou anular a cobrança de tributos federais devidos por empresas. “Em muitos casos, por meio de acesso privilegiado, via conselheiro ou operador externo, os débitos acabaram reduzidos”, disse o procurador.

O volume de processos em análise no Carf envolve atualmente algo em torno de R$ 500 bilhões. De acordo com Paiva, em pelo menos 74 desses processos, que somam R$ 19 bilhões em débitos tributários, há suspeita de manipulação ou favorecimento. “Em média, um processo leva até oito anos para ser julgado pelo Carf. E, enquanto o Carf não julga esses processos, a Receita Federal não pode cobrar os tributos”, acrescentou. O procurador foi convidado, por indicação dos deputados do PT Paulo Pimenta (RS) e Leo de Brito (AC), para uma audiência pública na Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara.

Entenda - A operação Zelotes investiga empresas, escritórios de advocacia e contabilidade, servidores públicos e conselheiros do Carf suspeitos de manipular julgamentos para reduzir ou anular a cobrança de tributos devidos por empresas. O nome Zelotes vem do adjetivo zelote, referente àquele que finge ter zelo. A ideia da Polícia Federal é destacar a contradição da postura dos integrantes do Carf, que favoreciam a sonegação fiscal ao invés de zelar pela inviolabilidade dos cofres públicos.

O Carf é uma espécie de tribunal administrativo formado por 216 conselheiros indicados pelo Ministério da Fazenda e por contribuintes (empresas). O conselho julga, por exemplo, o método adotado pelas empresas para efetuar o pagamento de tributos. As denúncias sob investigação mostram que empresas, escritórios de advocacia e de contabilidade, servidores públicos e conselheiros Carf participavam de um esquema de manipulação de julgamentos anular para débitos tributários junto à Receita Federal. Segundo a PF, os integrantes do Carf aceitavam suborno de operadores externos para que algumas empresas tivessem os débitos reduzidos ou extintos.

Paiva estima que a União vença 95% do processos analisados pelo Carf. O problema, diz ele, é que os 5% restantes representam 80% do valor dos débitos em julgamento no órgão. “No caso de pessoas físicas e de pequenas e médias empresas o índice de sucesso da União é quase zero. Por outro lado, em causas envolvendo débitos de grande empresas, a coisa muda de figura.” Cerca de R$ 5 bilhões – dos R$ 19 bilhões que são alvo de investigação na Operação Zelotes – dizem respeito a débitos tributários de apenas cinco ou dez empresas. Paiva, no entanto, destacou o fato de a legislação tributária brasileira ser complexa e tornar difícil distinguir o que é brecha e o que é corrupção. “Essa complexidade certamente interessa a algumas pessoas”, disse.“Mas não estou dizendo que todos os processos envolvendo grandes empresas sejam fruto de manipulação”, ressaltou.

O procurador critica também, o modelo de composição paritária do Carf – com metade dos conselheiros escolhidos entre representantes da Fazenda e a outra metade entre contribuintes (empresários). “Da maneira que está hoje, (o Carf) só atende ao interesse de pequenos grupos de pessoas que não estão preocupadas com o interesse público”, completou. Segundo Paiva, o modelo atual de escolha dos conselheiros é falho e permite favorecimentos. “Temos o caso de uma pessoa envolvida em irregularidade que indicou a filha como conselheira. Isso denota que, mesmo não estando lá, ela tem o poder de indicar e sugerir nomes para o Carf.”

Durante a audiência, Paiva detalhou o funcionamento do esquema de corrupção montado no Carf para anular débitos tributários de empresas com a Fazenda Pública. Segundo seu relato, empresas detentoras de débito eram abordadas por escritórios de advocacia, de contabilidade e afins com uma conversa do tipo: “A gente sabe o que senhor tem um processo no Carf e estamos dispostos a oferecer nosso serviço”.

A partir daí, para demonstrar o poder de influência no Carf, as quadrilhas anunciavam que o processo teria um pedido de vista em determinado dia e hora, o que de fato ocorria. “O próximo passo seria a empresa com débito fechar um contrato de consultoria com essas quadrilhas de manipulação de julgamentos no Carf para dar legalidade a transferência de recursos que alimentava o esquema”, explicou Paiva, ressaltando que há tanto servidores do Carf quanto advogados sob investigação”, disse.

O procurador informou que havia pelo menos duas organizações criminosas atuando paralelamente na manipulação de julgamentos no Carf. “Inclusive havia concorrência entre elas para ver quem iria pegar os casos de débitos de grandes empresas.”

O deputado Paulo Pimenta chamou a atenção para uma súmula vinculante do Supremo Tribunal Federal (STF) que impede a Polícia Federal e o Ministério Público Federal de investigar processos que envolvam suspeitas de sonegação fiscal analisadas pelo conselho. “Então o negócio é sonegar sempre, porque se, em até oito anos, o Carf não julgar o processo, você pode então reconhecer que houve sonegação e aí optar por um programa de refinanciamento, como o Refis, e ter assim anulado o crime de sonegação fiscal”, disse o parlamentar.

Indignação seletiva - Diferentemente do que acontece com a Operação Lava Jata, também da Polícia Federal, a Zelotes não empolgou o Judiciário nem a imprensa, como observou o procurador Paiva durante a audiência. De acordo com Paiva, escândalos de corrupção só despertam interesse no Brasil quando há políticos no meio. “Quando atingem o poder econômico, não há a mesma sensibilidade”, avaliou. Entre as principais investigadas pela Zelotes, haveria indícios fortes do MP contra corporações graúdas do setor industrial, financeiro e até das comunicações, como Grupo Gerdau, Rede RBS (principal retransmissora regional da Globo, na região Sul), Santander, Bradesco, Opportunity, Camargo Corrêa, Safra, Gerdau, Ford e Mitsubishi, entre outras.

Quanto a obstáculos no Judiciário, o MP chegou e entrar com representação na Corregedoria do Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região, sediado em Brasília, contra o juiz responsável pela Operação Zelotes, Ricardo Leite, da 10ª Vara Federal de Brasília, por acreditar o magistrado tem histórico de “segurar” processos por muito tempo e sem justificativas razoáveis.

Segundo reportagem de André Barrocal, na revista CartaCapital, procuradores e policiais federais que atuam na Operação Zelotes reclamam que Leite teria tomado muitas decisões que atrapalharam as investigações. Entre outras coisas, negou a prisão temporária de 26 suspeitos de integrar o esquema, rejeitou o pedido de bloqueio de bens de certos investigados e recusa-se a quebrar o sigilo do processo. As prisões solicitadas, segundo os investigadores, eram necessárias para tomar depoimentos sem que houvesse a oportunidade de os suspeitos combinarem suas versões entre si, algo que agora já não se pode mais impedir.

Ricardo Leite deverá ser acionado também no Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O deputado Paulo Pimenta prepara uma representação de teor parecido com a do Ministério Público. Segundo ele, Leite é responsável por processos antigos contra personagens da Zelotes que nem sequer foram chamados a depor. “Esse juiz atrapalha o combate à corrupção e ao crime do colarinho branco no Brasil”, afirmou.


Rede Brasil Atual, com informações da Agência Câmara - 14/5/2015
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