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Atual nacionalismo é pregado por quem veste Prada

Linha fina
Para Ana Maria Dietrich, professora da Federal do ABC, grupos que levantam bandeiras do ódio e do preconceito não possuem fundamento e são regidos pela elite brasileira
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São Bernardo do Campo – Professora de Ciências e Humanidades da Universidade Federal do ABC, Ana Maria Dietrich, nesta entrevista exclusiva, analisa as recentes manifestações de ódio e preconceito na sociedade brasileira e aponta que os grupos que levantam essas bandeiras não possuem fundamento e são regidos pela elite. "Essas pessoas tendem a defender formas reacionárias de poder como a intervenção das Forças Armadas e intervenção militar."

Ana Maria se coloca contra a intolerância praticada nos últimos tempos e aponta o surgimento da pobrefobia, termo que usa para identificar “aquele que é diferente e que ameaça a realidade cômoda de quem detém a hegemonia política e econômica”.

Doutora em História pela USP com a tese "Nazismo Tropical? O Partido Nazista no Brasil", foi pesquisadora do Centro de Estudos de Anti-Semitismo (Universidade Técnica de Berlim), Ana Maria diz que é difícil falar que manifestações raivosas como se tem visto no Brasil se caracterizem como nazismo ou fascismo: "Mas podemos falar, à luz das novas interpretações históricas sobre o nazismo, que nossa democracia possui áreas de sombra, ou seja, os chamados elementos fascistizantes, como por exemplo, a pressão pelo voto (antigo voto de cabresto), as milícias nas favelas, o monopólio da Rede Globo.

Nos últimos meses, vemos mobilizações de caráter radical e raivoso de grupos que pedem a volta da ditadura e utilizam até mesmo da simbologia nazista. Como a sra. vê essas manifestações?
Vejo como discurso do ódio, algo voltado aos extremismos, próprio de pessoas pouco politizadas e despreparadas para o diálogo público que faz parte do Estado de Direito democrático. Quem vai contra a presidente Dilma tem alguns argumentos, alguns até cabíveis dada as suspeitas de corrupção, porém, vejo que o grande motivo é se sentir ameaçado pelas políticas de inclusão (como o Bolsa Família) que podem mexer no status quo dos grupos de elite dominante, ameaçando-os de perder os privilégios que foram mantidos durante séculos pela lógica de uma sociedade baseada na desigualdade social e econômica. Os grupos de extrema direita, mais precisamente os nazistas, valiam-se sim da massa de indivíduos atomizados para usar como manobra e cooptar para suas ideologias. Pedir o fim da democracia também mostra a falta de memória política, sendo que apenas em 1985 acabou a ditadura militar no Brasil e os direitos e garantias individuais foram conquistados debaixo de muito sangue da resistência política. É um fruto da desinformação histórica.

Há uma radicalização política no Brasil?
Sim, fomentados por segmentos da mídia reacionária que protegem os direitos dos grupos de elite. Essas pessoas tendem a defender formas reacionárias de poder como a intervenção das forças armadas e intervenção militar. Volto a falar que falta informação sob a recente história brasileira.

É possível surgir um partido de extrema direita no Brasil agora?
Sim, é possível.

Como vê o uso de símbolos como a bandeira brasileira e o patriotismo defendido por esses grupos?
Considero que seja um nacionalismo exacerbado e sem fundamento, pois quem defende veste Prada e usa iPhone e não defende o Brasil gigantesco, dono de todo o tipo de heterogeneidades e diferenças, regionais e étnicas.

Há um viés de xenofobia (raiva a culturas de outros países) nessas manifestações? Os ataques contra os médicos cubanos seria xenofobismo? E o preconceito contra os haitianos?
Acredito que sim, mas é mais uma espécie de pobrefobia, mais do que contra estrangeiros, mas contra aquele que é diferente e que ameaça a realidade cômoda de quem está na hegemonia. Alguns haitianos sofrem preconceitos pois há racismo no Brasil, não pelo fato de serem estrangeiros. Aqui, o preconceito passa mais pela cor da pele do que pela nacionalidade.

A intolerância contra os homossexuais é uma manifestação de caráter fascista?
Com certeza. Pode ser caracterizada como um elemento fascistizante e que faz parte do discurso do ódio que está se disseminando muito no Brasil. As políticas inclusivas de Dilma e Lula estão começando a ser sentidas pelos grupos majoritários, que se sentem desconfortáveis com esse novo panorama.

Na internet e também em cartazes a imagem da presidenta foi manipulada para se parecer com a figura de Adolf Hitler. É possível avaliar se os grupos que usam dessa comparação possuem consciência e conhecimento da personalidade tanto de Hitler como de Dilma?
Acredito que não, o conhecimento do nazismo no Brasil assim como outros regimes autoritários é muito superficial. Seria interessante pensar em disciplinas dentro do currículo escolar tendo como foco os autoritarismos para que as novas gerações tenham maior contato com essa memória e conteúdo.

Até quando é válido usar símbolos e argumentos do nazismo para explicar ou criticar fatos atuais no Brasil?
É difícil se falar que isso se caracteriza como nazismo ou fascismo, mas podemos falar, à luz das novas interpretações históricas sobre o nazismo, que nossa democracia possui áreas de sombra, ou seja, os chamados elementos fascistizantes, como por exemplo, a pressão pelo voto (antigo voto de cabresto), as milícias nas favelas, o monopólio da Rede Globo...

O nazismo tinha alguma tolerância ao homossexualismo?
Não era tolerante à homoafetividade, principalmente como preceito para a população em geral. Entre a cúpula dos líderes nazistas, a história era outra. Porém, os homossexuais comuns eram muito maltratados, foram confinados nos campos de concentração e tinham que usar o triângulo rosa.

Em seus trabalhos sobre a atuação do Partido Nazista no Brasil, é possível mensurar como era a aceitação do povo brasileiro com relação aos adeptos do nazismo?
Acredito que na década de 1930, mais precisamente até a proibição do partido e dos decretos de nacionalização em 1938, eles se movimentavam política, social e culturalmente normalmente entre os brasileiros. Porém, entre seus quadros partidários, os brasileiros não eram aceitos pela questão racial. No entanto, muitos brasileiros se viam simpáticos ao nazismo.

Adolf Hitler usou de alguma maneira preceitos religiosos para corroborar seus pensamentos xenofóbicos?
O que Hitler fazia em seus comícios era uma espécie de missa política, a política vista como religião. Mas não acredito que ele tenha sido influenciado por valores religiosos.


Renan Fonseca, do ABCD Maior - 6/7/2015
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