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Alerta para desmonte do Estado com PEC 241

Linha fina
Em debate na Câmara, ex-ministro Patrus Ananias afirma que proposta de teto para gastos públicos representa duas décadas de arrocho fiscal; para procuradora, matéria é inconstitucional
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Brasília – Duas iniciativas, na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, chamaram a atenção, outra vez, dos parlamentares para a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241, que limita o aumento dos gastos públicos à taxa de inflação do ano anterior por um período de 20 anos. Na Câmara, a PEC foi avaliada na segunda 15 e considerada um “desmonte do Estado” pelo ex-ministro de Desenvolvimento Social e ex-ministro de Desenvolvimento Agrário, o deputado Patrus Ananias (PT-MG), que integra a comissão especial criada recentemente para apreciar a matéria. No Senado, o tema foi alvo de audiência pública durante a manhã do mesmo dia. E o entendimento principal dos debatedores foi de que vários itens da matéria são inconstitucionais.

A audiência no Senado foi promovida pela comissão de Direitos Humanos e Participação Legislativa e o que mais se discutiu foram os impactos da redução orçamentária que a medida implicará nas áreas de saúde e educação. Isto porque a PEC muda os critérios para que os valores mínimos aplicados nas duas áreas sejam corrigidos pela inflação. E caso seja aprovada pelo Congresso da forma como se encontra, segundo especialistas diversos que participaram do debate, a recomposição orçamentária passará a ser feita com base apenas na variação da inflação – e não mais atrelada à arrecadação, como acontece hoje.

Para a procuradora federal dos Direitos do Cidadão, Débora Duprat, o texto altera o núcleo do próprio direito à saúde e à educação e é considerado por ela “inconstitucional”, porque, a seu ver, “viola o princípio do não-retrocesso”. “A Constituição de 1988 instituiu um modelo revolucionário de financiamento para transformar educação e saúde em serviços efetivamente públicos e para que as formas como são distribuídos os recursos para esses dois setores se constituam no próprio direito à saúde e à educação, o que será afetado com a aprovação da proposta”, disse Débora.

De acordo ainda com a procuradora, a Emenda Constitucional 86, que cria subtetos de financiamento para a saúde,  já é ruim e fere a Lei Complementar 141/2012, que garante investimento na área em valor igual ou superior ao ano anterior, mesmo com Produto Interno Bruto (PIB) negativo. Débora considerou complicado o fato de que, enquanto se contesta na Justiça o teor da Emenda 86, o Congresso já se prepara para analisar uma proposta que, segundo ela, apresenta o mesmo vício, que é o retrocesso no financiamento.

Estado mínimo - Outro a reclamar da proposta, o representante da Confederação Nacional dos Trabalhadores no Comércio e Serviços (Contracs), Francisco Saraiva, chamou a PEC de de "proposta de Estado mínimo". Segundo ele, a matéria se insere nessa proposta de reduzir o poder do Estado que está em curso no país por parte dos que apoiam o governo interino de Michel Temer. E, a seu ver, "afeta de maneira absurda a classe trabalhadora, enquanto mantém a burguesia e o empresariado com direitos resguardados".

Já Patrus Ananias, divulgou nota hoje afirmando que o texto representa duas décadas de arrocho fiscal e evidencia, no seu entendimento, o objetivo do governo provisório de “destruir todo o título da Constituição que institui a ordem social e reúne nada menos do que sete capítulos: Seguridade Social (Saúde, Previdência e Assistência Social); Educação, Cultura e Desporto; Ciência e Tecnologia; Comunicação Social; Meio Ambiente; Família, Criança; Adolescente e Idoso; e Índios”.

“Se essa marcha para o atraso do Brasil não for detida, a Emenda 241 arrasará a Constituição suprimindo direitos, destruirá conquistas sociais já alcançadas, inviabilizará novas conquistas sociais e estrangulará o Brasil pela falta de investimentos públicos. É um desmonte completo, na veia”, acrescentou.

Para o deputado, a proposta “abre caminho para toda a ordem social” e ameaça os direitos dos cidadãos. Ananias já afirmou que votará contra a admissibilidade da PEC porque a considera o que chamou de “desmonte do Estado”, sobretudo das políticas de assistência social, como o Bolsa Família e o Benefício de Prestação Continuada (BPC).

Também a representante do Conselho Nacional de Saúde, Juliana Santorum, disse que vê um fato perigoso nesta mudança, uma vez que a saúde atualmente é vista como um setor de mercado no Brasil, e não como um direito, motivo pelo qual considera que a população é deixada de lado em favor dos empresários.

Juliana afirmou que somente nas eleições de 2014, empresas como Amil, Bradesco, Qualicorp e Grupo Unimed doaram, no total, R$ 52 milhões para as campanhas eleitorais de 131 parlamentares. O que mostra, conforme denunciou, o pouco empenho de muitos deputados e senadores em conseguir fazer valer direitos do ponto de vista do atendimento à população.

Início pela Câmara - A PEC 241 começou a tramitar na Câmara dos Deputados recentemente, com a criação da comissão especial para apreciar a matéria. Mas quase um mês antes, o Palácio do Planalto já procurou os líderes partidários para falar sobre o teor do texto e pedir que conversem com as bancadas no sentido de acelerar os trabalhos de apreciação da matéria.

De caráter polêmico, não apenas os parlamentares que fazem oposição ao governo interino como muitos integrantes de partidos que apoiam este governo, além de peemedebistas (mesmo partido de Temer), confirmam que o tema precisa ser melhor discutido. Eles argumentam que não podem aprovar todas as matérias propostas pelo Executivo que sejam de caráter impopular, sem uma garantia de que os resultados terão efeitos positivos para o país. Em reservado, afirmam que  não querem se submeter ao desgaste da população para tentar salvar a imagem do governo sem qualquer contrapartida.

O senador Paulo Paim (PT-RS), presidente da comissão de Direitos Humanos e responsável pela audiência, disse que “muita coisa ainda será debatida dentro da matéria”. Da Câmara, se aprovada, a PEC seguirá para o Senado.

Na reunião, além de técnicos, servidores públicos dos setores de saúde e educação e representantes de entidades organizadas da sociedade civil, participou apenas um único representante do governo interino: o técnico Carlos Eduardo Sousa, do Ministério da Saúde. Ele lembrou da Emenda Constitucional 86, que está sendo contestada na Justiça, afirmou que a emenda estabeleceu um percentual mínimo em saúde para a União com base na receita corrente líquida e, por isso, acredita que a proposta, ao contrário das críticas que tem recebido, irá "melhorar a situação do setor e não piorar".

O ministério da Educação, apesar de ter um ministro que é parlamentar como titular – o deputado Mendonça Filho (DEM-PE), não enviou representantes.


Hylda Cavalcanti, da Rede Brasil Atual - 16/8/2016
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