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Preocupação com desmonte une diferentes credos

Linha fina
Representantes de diferentes tradições religiosas condenaram pauta legislativa em análise no Congresso que, segundo entendem, podem desmontar conquistas sociais consolidadas nas últimas décadas
Imagem Destaque
Agência Senado
8/12/2016


Brasília - Representantes de diferentes credos e tradições religiosas se uniram para condenar, nesta quarta-feira 7, a pauta legislativa em análise no Congresso que, segundo entendem, podem desmontar conquistas sociais consolidadas nas últimas décadas. A PEC 55/2016, a PEC do Teto de Gastos, que estabelece a variação da inflação como teto para os gastos públicos, e propostas que modificam a legislação trabalhista estiveram no centro das críticas.

Realizada pela Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH), com base no tema “As religiões contra as injustiças sociais”, a audiência pública serviu também para novas manifestações de repúdio à continuidade de atos de intolerância religiosa no país. O presidente da CDH, senador Paulo Paim (PT-RS), dirigiu os trabalhos.

Rerum Novarum - O médico Geniberto Paiva Campos, que representou a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), salientou que os direitos sociais são conquistas relativamente recentes. Observou que os compromissos da Igreja Católica com esses direitos tiveram como marco divisor a encíclica papal Rerum Novarum, do Papa Leão XIII, de 1891. Depois, mencionou a PEC 55/2016 como um retrocesso.

"Ficamos espantados com toda essa operação de desmonte, a maneira como esse grupo, que chegou ao poder sem nenhum voto, faz uma proposta que está tentando destruir o futuro para  implantar aqui as coisas do passado", disse.

Para o bispo Dom Mauricio Andrade, da Igreja Episcopal Anglicana de Brasília, não pode ser "normal e razoável" usar uma emenda constitucional para impor mudanças de natureza orçamentária. Depois, conclamou líderes e seguidores de diferentes crenças e credos para que se mantenham unidos por tudo o que o povo deseja, lutando por transformações, e não em defesa de um “evangelho de exclusividade”.

Monge Sato, do Templo Budista de Brasília, disse que o debate ocorria dentro da “forma e do espírito ecumênico”. Lamentou a informação de que, além dos projetos de terceirização e da criação do trabalho intermitente (sem jornada regular), há na agenda do Senado proposta que flexibiliza norma que impõe dispositivos de proteção em máquinas nas fábricas, para evitar acidentes. A seu ver, é um “absurdo” que, entre outros, obrigam reformar o capitalismo.

"Não podemos derrubar esse capitalismo do jeito que queríamos tempos atrás, mas temos que mudar o espírito do capital e, para isso, o Estado deve servir aos direitos humanos e sociais", afirmou.

Intolerância - Adna Santos de Araújo, a Mãe Baiana, do terreiro Ilê Oya Bagan, hoje também atuando na Fundação Cultural Palmares, falou sobre a intolerância. Ela mencionou recentes ataques a terreiros no Distrito Federal e falou da intolerância de inspiração homofóbica, inclusive da situação de um padre da Igreja Católica, de São Paulo, que segundo ela foi atacado em razão de condenar perseguições a homossexuais. Tatiane Duarte, da Rede Ecumênica da Juventude, tratou da mesma questão, dizendo que a agenda de retrocessos ameaça o Estado laico, com projetos que manietam currículos escolares.

"Isso é uma ameaça a nosso direito de existir de modo plural, é uma ameaça à laicidade do Estado e uma ameaça à própria democracia", comentou.

Participaram ainda da audiência pública o pastor Wilson Barbosa da Silva, da Assembleia de Deus de Liberdade e Vida (também membro do Conselho de Defesa dos Direitos do Negro do DF) , e Losangelis Gregório, como representante da Federação Espírita do DF.

Único palestrante sem vínculos religiosos, o presidente do Conselho Nacional de Saúde, Ronald Ferreira, apontou as ameaças que recairiam sobre o Sistema Único de Saúde a partir da aprovação da PEC do Teto de Gastos.

Erosão - Caso a PEC do Teto de Gastos seja aprovada, afirmou Paim, haverá uma “erosão” dos direitos sociais. Segundo ele, estudos apontam que esse será o resultado da redução das despesas em termos reais, em contraste com o aumento da demanda por serviços. Disse, ainda, que a PEC altera expressamente dispositivos constitucionais que hoje garantem percentuais mínimos para saúde e educação.

"De fato, o está sendo projetado é um duto que vai tirar dinheiro de setores importantes, para canalizar recursos que vão irrigar os jardins dos privilegiados, principalmente o sistema financeiro, prejudicando investimentos ao longo de período que vai além do mandato de quem o propõe", afirmou Paim.
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