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Redução da maioridade penal não é eficaz

Linha fina
Dados do Unicef e números do sistema prisional brasileiro indicam que encarcerar jovens a partir dos 16 anos não produz bons resultados contra a violência
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São Paulo – No dia 31 de março, o Congresso Nacional, apontado como o mais conservador desde a redemocratização do país, deu mais uma mostra dessa postura. A Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados aprovou a constitucionalidade da PEC 171/93 que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos. Assim, a proposta de mais de 20 anos agora volta a tramitar no Legislativo.

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Os defensores da PEC dizem que a redução da idade penal levará à diminuição da violência, mas dados apontam o contrário. Números do próprio sistema prisional brasileiro mostram que a taxa de reincidência criminal nas penitenciárias é de 70%, enquanto que no sistema socioeducativo estão abaixo de 20%.

“A redução da maioridade penal em um sistema carcerário falido só iria colaborar com o aumento da violência”, afirma o educador social Clovis Tadeu Dias, coordenador de projetos da Fundação Travessia, instituição que atua com crianças e adolescentes em risco social e que tem o Sindicato como principal parceiro. “Que adolescente sairia dos presídios brasileiros reinserido na sociedade?”, questiona.

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O educador destaca que o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), apontado como exemplo por outros países, já cumpre o papel de lidar com jovens infratores – a partir de 12 anos, qualquer adolescente é responsabilizado pelo ato cometido contra a lei –, mas não no intuito de punir e sim de educar. Para isso, o ECA prevê seis medidas: advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, semiliberdade e internação. E recomenda que a medida seja aplicada de acordo com a capacidade de cumpri-la, as circunstâncias do fato e a gravidade da infração.

“Crianças e adolescentes em franco desenvolvimento psicossocial não podem responder como se fossem adultos. Além disso, o índice de crimes contra pessoa praticados por crianças e adolescentes é de menos de 1%”, destaca Clovis.

De fato, segundo dados do Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância), dos 21 milhões de adolescentes brasileiros (de 12 a 18 anos), apenas 0,013% cometeu atos contra a vida.

A baixíssima incidência é confirmada pelo Cadastro Nacional de Adolescentes em Conflito com a Lei (CNACL), do Conselho Nacional de Justiça. Até junho de 2011, o CNACL registrou ocorrências de mais de 90 mil adolescentes, número que corresponde a menos de 0,4% da população jovem do Brasil. Portanto, o Congresso quer aprovar uma lei pautada pela exceção e não pela regra.

Vítimas – Por outro lado, o percentual de adolescentes vítimas de homicídio no país são assustadores. Segundo a Organização Mundial de Saúde, o Brasil ocupa a quarta posição em assassinatos de crianças e adolescentes dentre 92 países. E em termos absolutos, ocupa a segunda posição, atrás apenas da Nigéria.

Os homicídios já representam 36,5% das causas de mortes por fatores externos de adolescentes no país, enquanto para a população total esse percentual é de 4,8%. De 1981 a 2010, mais de 176 mil jovens entre 12 e 18 anos foram mortos. Só em 2010 foram 8.686 crianças e adolescentes assassinadas, ou seja, 24 por dia. Os dados são do Mapa da Violência de 2012 e mostram ainda que em 30 anos, a taxa de assassinatos de jovens brasileiros cresceu 346,4%. E, segundo o Mapa da Violência de 2014 – que usa dados de 2012 do Sistema de Informações de Mortalidade do Ministério da Saúde – 77% das vítimas de homicídio são negros.

Para o educador social do Travessia, a redução da idade penal é um erro e uma injustiça. “Esses jovens não podem ser culpabilizados por uma sociedade que os exclui. Não é esse o caminho. O Congresso está mais preocupado em punir do que em construir escolas.”


Andréa Ponte Souza – 2/4/2015
 

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