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Centros de internação de menores estão insalubres

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Locais para cumprimento de medidas em meio fechado ainda são precários e não oferecem condições para superação de vulnerabilidade social e um processo pleno de ressocialização, segundo o CNMP
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São Paulo – Relatório divulgado pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) na terça 23 revela que a situação dos centros de internação para adolescentes que cumprem medidas socioeducativas está “muito longe” da preconizada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Superlotação, poucas oportunidades de formação educacional e profissional e espaços insalubres, foram alguns dos problemas constatados nas inspeções. Foram visitados 317 dos 369 estabelecimentos de internação existentes no país, entre os anos de 2013 e 2014.

O ECA define que os adolescentes podem ficar em medidas socioeducativas de restrição de liberdade por até três anos consecutivos, além de poder passar outros três em situação de semiliberdade, tendo de comparecer todos os dias a um centro de internação. A Lei nº 12.594/2012, que instituiu o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), determina que os jovens tenham atividades educacionais, profissionais, culturais e de lazer, como parte do processo de ressocialização.

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A primeira barreira ao cumprimento adequado das medidas é a superlotação. O Brasil tem 18.072 vagas para internação de adolescentes em conflito com a lei, mas abriga 21.823 internos, segundo o estudo do Conselho. No estado do Maranhão, a superlotação supera os 800%. São 461 jovens para 52 vagas.

Somente os estados de Alagoas, Piauí, Rio Grande do Norte, Amazonas, Rondônia, Roraima, Tocantins, Rio de janeiro e Paraná não superam os 100% de ocupação de suas unidades de internação.

Problemas graves de higiene, conservação, iluminação e ventilação afetam 39,1% dos centros de internação do país, considerados insalubres pelo CNMP. As piores condições foram verificadas nos estados do Amapá, Mato Grosso, Pará e Roraima, onde todas as unidades foram consideradas nocivas à saúde dos adolescentes.

Porém, a situação não é muito melhor nas demais unidades da federação. Outros 15 estados tiveram mais da metade dos centros de internação reprovados por não ter condições mínimas de preservação da saúde dos jovens. Destacaram-se, negativamente, Goiás (86%), Tocantins (75%), Sergipe (67%) Rio de Janeiro (64%), Pernambuco (58%), Rio Grande do Sul (55%) e Bahia (50%).

Outro quesito definido no ECA para o melhor desenvolvimento das atividades socioeducativas é a separação dos adolescentes quanto à idade, constituição física e gravidade da infração. Somente 16,1% das unidades de internação brasileiras separam os adolescentes por tipo de infração cometida. O conselho do MP avalia como “crítico” esse resultado, pois considera esse um “critério relevante, na medida em que visa, além da proteção, a evitar a troca de informações e experiências entre adolescentes com histórico infracional bastante diverso”.

Mas os dados não melhoram em relação à idade nem à compleição física. Os adolescentes são separados por idade em 23,7% dos centros de internação e por condição física, em 31,9%.

No caso da formação profissional, 38,5% das unidades de internação não possuem espaços adequados para atividades profissionalizantes. O Sudeste tem a melhor condição, com 80,4% dos centros realizando as ações de profissionalização em espaços apropriados. As demais regiões têm mais de 50% das unidades em más condições para essa atividade.

A situação também está longe do ideal na educação. Segundo o CNMP, 28,7% das unidades, em todo o país, não possuem salas de aula adequadas, com boa iluminação e acesso a materiais pedagógicos. A pior situação encontra-se no Centro-Oeste, com 48% das unidades sem espaços adequados para atividades de escolarização. No Norte (46,3%) e Nordeste (45,8%), brasileiros também deixam muito a desejar nesse quesito.

Dados de um levantamento realizado pelo Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea) indicam que a situação constatada pelo conselho do MP reforça um problema anterior ao ato infracional e que se perpetua após o cumprimento da medida socioeducativa: cerca de um terço dos adolescentes com idade de 15 a 17 anos cumprindo medidas no país, em 2013, ainda não havia concluído o ensino fundamental. E somente 1,32% havia concluído o ensino médio. Na faixa etária de 12 a 14 anos, 93,3% não haviam completado o ensino fundamental.

Ainda segundo os dados do Ipea, 60% dos adolescentes privados de liberdade eram negros e 66% viviam em famílias consideradas extremamente pobres. Além da alta defasagem escolar, 51% desses adolescentes não frequentavam a escola quando foram apreendidos e outros 49% estavam desempregados.

E se depender das ações de apoio ao egresso, que deviam acompanhar adolescentes e suas famílias para superação da situação de vulnerabilidade social, com ações de cunho educacional, profissionalizante, psicológico, entre outros, muitos jovens vão permanecer nas condições mencionadas anteriormente. “A situação é crítica”, define o conselho do MP.

Segundo o levantamento, em 82% das unidades de internação no país não há atendimento multidisciplinar aos egressos e a suas famílias. Na semiliberdade, a situação é um pouco menos ruim: 74,4% não realizam acompanhamento dos adolescentes.

Mesmo em ações específicas, o atendimento ao egresso deixa a desejar. A atuação para que os adolescentes que deixam a internação ou a semiliberdade voltem a estudar é realizada por apenas 40% das unidades do Centro-Oeste, do Nordeste e do Norte. No Sudeste, o percentual é de 57,6%, e no Sul sobe para 64,4%. No geral, menos da metade das unidades do Brasil realizam essa atuação.

No caso da formação profissional, 36,3% das unidades apoiam os egressos nesta demanda. No Centro-Oeste, o percentual é de apenas 20%. A melhor situação é no Sul do país, onde 55,6% das unidades têm programas de apoio ao egresso para o trabalho.

O estudo está sendo divulgado uma semana antes da data prevista para votação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 171, de 1993, que reduz a maioridade penal de 16 para 18 anos, na Câmara dos Deputados. Se a proposta for aprovada, adolescentes a partir de 16 anos, que cometerem crimes considerados graves, como homicídio, estupro ou latrocínio, serão detidos em cadeias comuns.

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Rodrigo Gomes, da Rede Brasil Atual - 24/6/2015

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