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90 anos fortalecendo a democracia

Linha fina
A presidenta do Sindicato inaugura a série de entrevistas da FB Especial, fala da força dessa história de nove décadas e da importância da entidade, onde o dirigente “aprende que tem de desconstruir a ordem vigente e construir uma nova ordem mais justa, fraterna e igualitária”
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São Paulo - Há 22 anos, Juvandia Moreira, baiana de Nova Soure, deixava sua cidade para morar na maior capital do país. Em São Paulo, formou-se em direito, ingressou no Bradesco e passou a militar no movimento sindical bancário.

> Página especial com as entrevistas dos 90 anos

Em 1997, no auge do período neoliberal, tornou-se diretora do Sindicato. Aprendeu e cresceu nessa trajetória de luta que se traduz na importância de estar à frente de um dos maiores e mais importantes sindicatos do mundo como a primeira mulher a presidir a entidade em nove décadas de existência.

Qual a importância desse resgate feito pelo Sindicato para compreender esses 90 anos de história da entidade?
O exercício de reconstituir o passado é uma forma de entender o presente e de nos orientar para a construção do futuro. Tem muita gente nova na categoria que não conhece a história dos bancários e é fundamental conhecer. A importância, por exemplo, de saber que a conquista da participação nos lucros e resultados é fruto de uma campanha salarial e não uma benesse que o banco deu. O bancário chega ao banco e tem plano de saúde, vales refeição e alimentação, mas não sabe de onde veio isso. Se ele não souber que isso foi resultado de luta e organização, não vai se organizar também para lutar por novas conquistas.

E quando vamos conhecer os pormenores da história vemos que ela é muito bonita, fruto de muita luta e conquista não só para os bancários, mas para todos os trabalhadores. São várias as lutas em que o Sindicato foi protagonista, organizando não só os bancários, mas a sociedade também. Muitas das nossas mobilizações acabaram virando gerais, a exemplo da nossa luta por uma nova Constituinte, pelas Diretas Já e pela democratização do nosso país. É fundamental resgatar a história para que seja eternizada em nossas memórias e para que oriente o caminhar das futuras gerações.

Qual a importância do Sindicato para você?
O Sindicato é uma escola de formação, uma escola de vida. A gente aprende a ver a vida de outra maneira, aprendemos a ter responsabilidade, compromisso e organização de classe. Aqui a gente olha para a classe trabalhadora como um todo, assim como olhamos para os problemas do país. No Sindicato você aprende que tem de desconstruir a ordem vigente e construir uma nova ordem mais justa, fraterna e igualitária. Aprendemos a construir uma nova compreensão de mundo.

Foi no Sindicato que aprendi a ter uma nova relação com a rua. É como se você se sentisse em casa estando na rua. A gente vai fazer protesto, sardinhada, manifestação e tem muita gente que não olha isso de uma maneira natural. E a rua tem de ser do povo. As pessoas precisam olhar e entender que são outras pessoas lutando para mudar as coisas. Pessoas que não estão se calando diante das injustiças.

Você entrou para o Sindicato no período em que a política neoliberal estava no auge e os trabalhadores protagonizavam a resistência para que direitos não fossem retirados. Qual é a diferença de fazer sindicalismo naquele período em comparação à última década?
Quando entrei para o Sindicato, em 1997, enfrentávamos um desemprego altíssimo, com o país afogado em uma dívida pública grande, atrelado ao FMI e com uma política recessiva. Isso se dava com as privatizações, flexibilização de direitos, aumentava a desigualdade. E a gente travava uma luta de resistência. Mesmo nessa conjuntura desfavorável, tentava ampliar direitos. Quando eu entrei, por exemplo, os bancos públicos tinham reajuste zero. Era bem o auge dessa política no Banco do Brasil e na Caixa, sem contar o risco da privatização desses bancos.

Era um período bem difícil. De vez em quando batia um desânimo, pois íamos ao local de trabalho, fazíamos um esforço grande e a assembleia ficava esvaziada, porque os bancários tinham medo de participar. Mas não desistíamos, pensávamos: é isso aí, é a luta. Por isso muitas vezes íamos ao local de trabalho fazer as assembleias.

Esse quadro se reverte somente quando o primeiro presidente oriundo da classe trabalhadora assume o país. Acho que os problemas hoje são outros, o cenário é outro. A quadra fica lotada, bem diferente do que ocorria na década passada. Hoje nós temos o patamar de desemprego mais baixo da história e os trabalhadores conquistam a cada ano aumento real de salário. Esse governo atual é de coalizão, mas nos possibilita fazer a luta, inclusive realizamos greve praticamente todo ano.

Antigamente, a pauta do BB e da Caixa era entregue ao porteiro no estacionamento, pois a direção não recebia e não tinha mesa de negociação. E isso se inverte. Hoje participamos de negociação e tivemos a grande conquista que foi a unificação da campanha da categoria entre bancos públicos e privados, o que nos tornou mais fortes e protegidos.

A pauta é de ampliação de direitos. Ou seja, nem discutimos inflação, e sim aumento real de salário. Antes, os reajustes eram abaixo da inflação e há vários anos estamos tendo aumento real. Por isso, nós temos que fazer a nossa parte sempre: organizar os trabalhadores, prepará-los para a luta e negociar. Mas é importante ter clareza: os trabalhadores não conseguem nada em uma canetada, têm de fazer a luta.

Você tem o desafio de ser a primeira mulher a presidir o Sindicato, além de suceder presidentes que se tornaram lideranças nacionais. Como é para você estar à frente de uma entidade tão respeitada nesses 90 anos?
É muito importante para as mulheres ter uma mulher assumindo a presidência da entidade. Isso é muito significativo, assim como é muito significativo termos uma mulher na Presidência da República pela primeira vez. Nós sempre tivemos mulheres competentes e capazes de assumir esses postos, mas há discriminação.

Nós mulheres tivemos que lutar muito para entrar no mercado de trabalho, para ocupar postos importantes. E continua a luta para a construção de uma sociedade em que a mulher não esteja relegada à vida privada, para ter igualdade salarial. Então, é muito importante ter uma mulher na presidência do Sindicato e com grande responsabilidade para suceder pessoas tão importantes, que tiveram um grande comprometimento com os bancários.

Como você enxerga os desafios a serem enfrentados pela categoria?
Não dá para pensar a categoria bancária hoje sem dialogar com os comerciários. Esse é um grande desafio para nós daqui para frente. Por conta da figura do correspondente bancário, nós temos que fazer a nossa organização ajudando a fortalecer os comerciários. É uma forma de evitar com que os bancos precarizem a organização dos trabalhadores e terceirizem através do correspondente no setor de comércio, como eles têm feito.

Outro grande desafio é manter nossa política de aumento real e de ampliação na participação nos lucros e resultados. Há muitos anos os bancos ganham muito e isso tem de ser mais bem distribuído. A gente avançou muito na PLR, mas ainda acho que temos de avançar mais.

Além disso, precisamos nos enxergar como classe. A luta de uma categoria hoje pode ser a luta de todos os trabalhadores amanhã. Por exemplo, por que é tão importante reduzir a jornada de 44 horas semanais para 40 horas, conforme reivindicação da CUT? Porque a categoria bancária conquistou a jornada de 30 horas e os outros ainda trabalham 44, e se não ajudarmos a reduzir, nós vamos sofrer ataques à nossa jornada, como temos sofrido.

É a busca pela qualidade de vida, papel do Sindicato Cidadão?
Sim. As pessoas não podem só viver em função do trabalho. É preciso que tenham tempo para a família, lazer, estudo. Se não distribuirmos a riqueza que produzimos para proporcionar qualidade de vida para todos e não apenas meia dúzia de pessoas, vamos precarizar o todo. O que ganhamos com a tecnologia tem de servir também para proporcionar qualidade de vida às pessoas e não servir apenas para enriquecer os patrões.

Por fim, o Sindicato não pode achar que vai resolver a vida dos bancários somente na mesa de negociação. É preciso interferir na cidade, no estado e no país onde moramos, pois essas questões interferem na vida dos trabalhadores. Para além da luta por melhores condições de trabalho e salário, é preciso interferir no país onde vivemos. E o Sindicato faz isso historicamente.


Cláudia Motta e Tatiana Melim - 1º/4/2013

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