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O que pode vir antes da internação compulsória?

Linha fina
Em seminário na Alesp, profissionais criticam superficialidade da ação promovida pelo Estado e cobram melhorias nas áreas de lazer, segurança, cultura e mais reflexão sobre o tema
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São Paulo – Você é contra ou a favor da internação compulsória (à força) para usuários de crack? Essa é uma das perguntas levantadas pela grande mídia, embora questionamentos ao Estado sobre melhorias em diversos setores – esporte, lazer, educação, assistência social, entre outros – não sejam constantes. Foi o que ressaltaram os participantes do seminário Internação Compulsória e Garantia de Direitos.

O debate foi realizado na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) nesta quinta-feira 11, por iniciativa do deputado estadual Luiz Claudio Marcolino (PT) e da Fundação Projeto Travessia, que atua desde 1995 com apoio do Sindicato na proteção e resgate de crianças em situação de rua e vulnerabilidade. "É importante que essa discussão ganhe espaço. O uso de substâncias químicas não é algo novo e nunca foi invisível aos educadores sociais atuantes”, ressaltou o deputado líder da bancada do PT na Alesp (foto à direita, no centro da mesa). Para ele, é necessária uma política estruturada com ações que antecedem a internação compulsória, medida que deve ser tomada somente em situações drásticas.

Antonio Sérgio Gonçalves, do Caps Centro (Centros de Atenção Psicossocial), concorda: “o Estado investe em internação compulsória, mas não investe em construção compulsória de espaços públicos com segurança, lazer, cultura, centros de formação”. Para ele, a pergunta “contra ou a favor a internação” é uma falsa questão e coloca a sociedade contra famílias que estão sofrendo muito com o problema. O promotor de Justiça do Estado de São Paulo Clinton Guimarães afirma que “o tratamento com internação compulsória fere convenções internacionais e viola a lei”. Segundo ele, a internação à força, em determinadas situações, pode ser comparada à tortura.

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Segundo Isabel Bueno, da Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social (SMADS), grande parte dos usuários de drogas da cracolândia, na região central da cidade, são moradores de periferias, onde esse consumo ilícito existe há muito tempo e em número maior, realidade que não ganha destaque em páginas dos jornais como a região central. “Normalmente, são pessoas que tiveram problemas com traficantes de sua região ou população de rua que utiliza a droga como espécie de ‘analgésico’ para ‘fugir’ de outros problemas”.

Isabel ressalta que por não haver local para onde se encaminhe os usuários, a internação compulsória afeta o equipamento social.

Ato pontual x Eficiência - Daniela Skromov (foto à esquerda), defensora pública do Estado, ressaltou que a internação compulsória é um ato pontual que tem ocupado a centralidade de debates, mas que é importante retroceder em algumas questões. “Existem, em média, 210 milhões de usuários de drogas ilícitas no Brasil. Aproximadamente 10 milhões apresentam problemas mais graves no manuseio (abuso). A droga é, muitas vezes, ‘analgésico’ para outra dor. Sabemos dos seus riscos, mas a abordagem eficiente deve ir na causa, não nos efeitos”.

A defensora alertou para a superficialidade do tratamento proposto pelo Estado. “A internação cria um ambiente artificial. Quando a pessoa sai, os problemas continuam lá. É mais eficiente fazer isso (tratamento contra o vício) na rotina, mesmo que seja um desafio”. Para Daniela, a internação forçada pode agravar o caso do paciente. “Com a pretensão de salvar (a vida do usuário) você cria marcas e posterga o momento de resolver as questões. Em 95% dos casos há recaída pós-internação. No caso do tratamento ambulatorial, a recaída é de 30% dos casos. Como estimular a vontade através da força? A força anda de mãos dadas com os maus tratos”.

A defensora pública destacou que entre as gravidades da internação compulsória está o fato de o processo não ter revisão. “Já fui a clínicas que a pessoa estava internada há seis anos e só conseguiu sair depois da tentativa de suicídio”. Daniela citou o artigo 15 do Código Civil (Lei 10406/02), que descreve que “ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica”. Para ela, a lei sobrepõe a Lei Federal de Psiquiatria, uma vez que é mais recente, e que o apelo da internação “é resultado da insuficiência e fragilidade de um serviço social precário”.

  A internação compulsória não precisa de autorização familiar e é definida pela Lei Federal de Psiquiatria (Lei 10.216/01). Mas é necessária a determinação de um juiz competente, depois de pedido formal, feito por um médico, atestando que a pessoa não tem domínio sobre a sua condição psicológica e física. A lei é antiga, mas o assunto veio à tona após a parceria entre Estado, Judiciário e o Executivo, médicos, juízes e advogados, com o objetivo de tornar a tramitação do processo de internação compulsória mais célere. Mesmo com a intensificação da prática, atualmente a Secretaria de Estadual de Saúde mantém apenas 691 leitos públicos para dependentes químicos.

Intolerância - Durante o seminário o padre Julio Lancellotti repudiou a ação do capitão Aldrin Córpas, da Polícia Militar, sobre a declaração “tolerância zero” a crimes, lixo e moradores de rua nas ruas da Mooca e Brás, bairros da zona leste da cidade. O policial chegou a publicar a informação em sua página pessoal do Facebook, mas deletou a postagem. “Eles são rejeitados pela sociedade e punidos pelo Estado”, comentou Lancellotti sobre os moradores de rua e também sobre os usuários de drogas.

Também participaram do seminário a coordenadora-geral da Fundação Projeto Travessia Cleuza Rosa da Silva (foto à direita), Ariel de Castro Alves da Comissão de Direitos da Criança e Adolescente (OAB/São Bernardo do Campo), a psicóloga do Projeto Quixote Cecília Motta, entre outros. A discussão foi intermediada por um dos coordenadores do Travessia, Marcelo Caran.




Gisele Coutinho – 11/4/2013

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