São Paulo – O direito de brincar e de aprender está entre os mais importantes previstos pela Declaração Universal dos Direitos da Criança. Cerca de 800 da escola municipal de ensino fundamental Profa. Geny Maria M. A. K. Pussinelli, localizada na periferia da zona sul de São Paulo, agora têm esse direito garantido. Foi inaugurada na sexta 22 a Brinquedoteca do Betinho.
> Fotos: conheça a brinquedoteca
“Esse espaço não é apenas para brincar. Ele entra na formação das crianças. De elas aprenderem a respeitar o tempo que o colega está com o brinquedo, pedir por favor, compartilhar a diversão. Isso extrapola o que é passado na sala da aula”, afirma Fernanda Barros Müller, coordenadora pedagógica da escola, uma das responsáveis pela iniciativa do corpo docente – que residem em região carente de estrutura de lazer e com baixo poder aquisitivo – concluída por meio da parceria do Comitê Betinho pela Ação da Cidadania e do Sindicato.
Segundo a diretora da escola, Maria Conceição dos Santos, a Lia, a brinquedoteca é fruto do envolvimento de várias pessoas. “Todos contribuíram um pouco. A sala foi pintada por voluntários do 8º ano com orientação de um professor. Os alunos fizeram vários cartazes com a Zeropéia (mascote da sala) para enfeitar. Muitos doaram brinquedos. Houve empenho de professores que procuraram ajuda externa. Daí veio também a colaboração do Comitê e do Sindicato. A todos agradeço por tudo isso.”
Durante a inauguração, que contou com apresentação de coral das crianças da escola, a presidenta do Sindicato, Juvandia Moreira, destacou o papel da entidade na busca da melhoria da sociedade. “O principal objetivo do Sindicato Cidadão é interferir nas questões que afetam o empregado fora de seu ambiente de trabalho. Muitos têm filhos e esses espaços que ajudamos a criar em escolas, em hospitais são importantes para que possam aprender e a superar momentos difíceis.”
O integrante do Comitê Betinho José Osmar Boldo ressaltou a necessidade de todos estarem envolvidos na manutenção do espaço. “O comitê completa 20 anos de atuação em dezembro. Nesse tempo inauguramos mais de 50 brinquedotecas e percebemos que todos abraçam esse espaço. Tanto as crianças quanto os adultos. Os livros infantis que repassamos foram doados pela escritora Patrícia Secco outra grande parceira nossa.”
Zeropeia – A “mascote” da brinquedoteca é a Zeropeia, personagem de um dos livros infantis de Herbet de Souza, o Betinho, idealizador da ação da cidadania, falecido nos anos 1990 vítima de Aids. Na história – lida por uma professora aos alunos – Betinho utiliza o personagem para mostrar como é importante que as pessoas respeitem as diferenças entre si. Leia abaixo a história, retirada do Portal do Professor, do Ministério da Educação e Cultura.
A ZEROPÉIA
(Herbert de Souza – Betinho)
Ia uma centopéia com suas cem patinhas pelo caminho quando topou com uma barata. Vendo tantas patinhas num bicho só, a barata ficou boquiaberta:
-Mas Dona Centopéia pra que tantas patinhas? A senhora precisa mesmo delas? Olha, eu tenho só seis e são mais do que suficientes! Posso fazer tudo, correr, trepar nas paredes, me esconder nos buracos. Ninguém consegue me acertar na primeira, nem na segunda chinelada!
- É – respondeu a centopéia -, eu não havia pensado nisso! E olha que tenho essas cem patinhas desde que nasci cinqüenta de um lado e cinqüenta do outro...
- Como a senhora faz quando tem uma coceira? – perguntou a barata - Já imaginou o trabalhão, coçando daqui e dali sem parar? Deve ser um inferno ter tantas patinhas! Por que a senhora não amarra noventa e quatro e fica com seis como eu? Vai ficar muito mais fácil e a senhora vai poder inclusive correr muito mais, como eu.
A centopéia nem pensou e amarrou as noventa e quatro patinhas. Doeu um pouco com todos aqueles nós, mas era necessário, e continuou a andar.
Lá na frente se encontrou com um boi. Quando o boi viu a centopéia andando com seis patas ficou intrigado:
- Dona centopéia por que seis patas? Para que tantas? Olhe, eu só tenho quatro e faço o que quero! Corro, participo de touradas, pulo cerca quando quero, sou forte e todo mundo me admira! Por que a senhora não amarra mais duas patinhas e fica com quatro? Vai ficar mais ágil e vai correr tanto quanto eu...
A centopéia amarrou mais duas patinhas. Doeu um pouco, já estava quase dando cãibra, mas era necessário, e continuou a andar.
Lá mais na frente, já andando com certa dificuldade, a centopéia se encontrou com o macaco. Quando o macaco viu a centopéia andando com quatro patas, ficou curioso. Olhou bem, contou e recontou, e não se conteve:
- Mas... Dona centopéia, por que tanta pata se a senhora pode andar com apenas duas, como eu? Veja como eu faço: pulo de galho em galho, corro, ninguém me pega nesta floresta. Por que a senhora não amarra mais duas patinhas e fica assim, como eu?
A centopéia nem pensou e amarrou mais duas patinhas. Agora só tinha duas patinhas livres, poderia viver em paz, como a maioria dos bichos da floresta, e se parecia até com as pessoas, podia até pensar em ter nome de gente, como Maria ou Florinda.
E continuou a andar, com muita dificuldade, mas tranqüila. Havia seguido todos os conselhos que recebera pelo caminho. Velhos tempos aqueles em que tinha cem patinhas livres! Quanto trabalho à toa! E continuou a andar.
Mas lá na volta do caminho, de repente, viu a dona cobra! A centopéia sentiu um friozinho na barriga.
- I! – pensou ela – a dona cobra nem patas têm!
Não deu outra. Quando a cobra viu a centopéia com suas duas patinhas, foi logo parando e dizendo:
- Por que andar com essas duas patas num corpo tão comprido e desajeitado? Será que você não sente que está sendo ridícula andando só com duas patas? E, afinal de contas, pra que patas pra andar? Não vê como eu corro, escapo, ataco, meto medo, serpenteio, subo em árvores e até nado sem patas? Por que não completa a obra e amarra tudo de uma vez?
A centopéia então, amarrou as suas últimas patinhas, pensando que podia ser que nem a cobra. E não podia. Ali mesmo ficou pedindo socorro e gritando por todos os bichos da floresta:- Ei, dona barata, seu boi, seu macaco, dona cobra! Venham me ajudar! Não consigo mais andar! Eu, que tinha cem patinhas, deixei de ser uma centopéia e acabei virando uma zeropéia!A turma da floresta, pra concertar a situação, teve então uma idéia, a de fazer um carrinho bem comprido para a centopéia poder se locomover. A centopéia ia virar a primeira zeropéia motorizada da floresta!
- Mas como é que eu vou dirigir esse carro se não tenho mais patinhas?
Foi um drama! Os bichos foram logo discutindo:
- A barata dirige, pois foi ela quem mandou amarrar noventa e quatro patinhas de uma só vez!
- Não, não, não! Dirige o boi, que mandou amarrar mais duas patas!
- Melhor o macaco, que mandou amarrar mais duas.
- Negativo! Dirige a cobra, que mandou amarrar tudo. Até que a centopéia se deu conta, pensou bem pensado e disse para todo mundo:
- É, gente, a culpa é minha! Eu não devia ter escutado essa conversa fiada de amarrar patinhas! Eu não sou barata, não sou boi, não sou macaco e nem cobra; eu sou é eu mesma, uma centopéia que quase virou uma zeropéia.
A centopéia agradeceu o carrinho, mas, mandou a bicharada desamarrar todas as suas patinhas. E decidiu que o mais importante era ser ela mesma e ter as suas próprias idéias na cabeça...
Jair Rosa - 25/11/2013