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Juristas rechaçam ação da PF contra Lula

Linha fina
Dois ex-integrantes do governo Fernando Henrique Cardoso, titular de Direito da USP e criminalista reforçam tese do ex-presidente de que motivação não foi técnica
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São Paulo – Pelo menos três juristas, incluindo dois ex-integrantes do governo Fernando Henrique Cardoso, criticaram a ação da Polícia Federal que levou o ex-presidente Lula de maneira coercitiva para prestar depoimento. Nenhum deles vê motivos técnicos para a operação policial, a qual qualificaram como “desvio de legalidade”, “preocupante”.

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José Gregori, ministro da Justiça (2000-2001) e secretário de Direitos Humanos (1997-2000) de FHC, explica, segundo a BBC Brasil, que o correto é aplicar essa medida apenas se a pessoa tiver previamente se recusado a atender uma convocação para depor, o que não ocorreu no caso de Lula. “Não conheço na nossa legislação a figura da condução coercitiva sem que tenha havido antes a convocação. A praxe tem sido sempre essa: você convida a pessoa a comparecer e, se ela não comparecer, então na segunda vez vem a advertência de que ela poderá ser conduzida coercitivamente”, afirmou. “Você (fazer) logo a condução coercitiva é um exagero. E na realidade o que parece é que esse juiz (Sergio Moro) queria era prender o Lula. Não teve a ousadia de fazê-lo e saiu pela tangente.”

Já Walter Maierovitch, ex-secretário Nacional Antidrogas de FHC, viu “desvio de legalidade” na decisão de Moro. “Acho que buscas e apreensões são atividades normais em investigação. Agora, o que eu estranho, como jurista, é a condução coercitiva do Lula. É algo surpreendente e preocupante”, notou. “Essa vergonha está acontecendo no país é uma coisa que precisa ser apurada, mas me preocupa quando tem um desvio de legalidade”, reforçou.

“Não tenho informações de que Lula tenha sido intimado, então me parece uma solução equivocada. Em vez de se adotar pelo processo ordinário, optou pela medida extrema”, disse o jurista Alamiro Velludo Salvador Netto, professor livre docente de Direito Penal da USP, em entrevista para o site Nexo.

Também rechaçou as alegadas “condições de segurança” para a coerção. “Isso é estranho. Com todo esse movimento que a condução gerou, não faz sentido. Minha leitura, tecnicamente, é que nada disso era necessário. Ele poderia ter sido intimado. Me parece que, mais uma vez, se usa a opinião pública como a finalidade de reforçar a investigação.”
Sobre as garantias constitucionais, um alerta: “Não se trata de defender a corrupção. Pode parecer tola, para opinião pública, a defesa dessas garantias legais, mas são estruturas fundamentais. Sem isso, se cria um sistema inquisitorial”, ressalta Velludo.

Democracia ou autoritarismo? – Daniel Bialski, criminalista, assinou artigo no UOL sob o título “Direito não pode ser substituído pela força”. Nele, questiona: “seria necessário realmente prender (o que se viu em casos pretéritos) ou conduzir coercitivamente essas pessoas, que independentemente do partido ou ala política também possuem uma série de direitos e prerrogativas que deveriam ser respeitadas?”. E responde: “Tenho convicção e penso que não era necessário”.

“Inegavelmente, desde a condução coercitiva até as prisões são medidas de exceções, e, assim sendo, não podem ser a regra, que midiaticamente transforma uma apuração que deveria ser policial-judicial em debate e fórum público de responsabilidade, fomentando paixões e ódios, os quais não se coadunam com a sobriedade que deveria prosperar na Justiça.”

Bialski convoca, ainda, a Declaração Americana e Universal do Direitos Humanos. “Temos direito inalienável ao exercício dos direitos sociais, individuais, à liberdade, segurança, bem-estar, igualdade e justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos. Além disso, em reforço, inolvidável a soberana proteção à dignidade da pessoa humana, amplitude de defesa e presunção de inocência.”

E completa: “Acaso existam elementos de responsabilidade dos envolvidos, o que se espera é que a condução do inquérito policial e da eventual ação penal seja efetivada com parcimônia e imparcialidade, punindo os culpados e enaltecendo os inocentes, serenamente aguardando que não se formem mártires e que prospere a verdade”.


Redação, com informações da BBC Brasil, do Nexo e UOL - 4/3/2016 
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