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Alesp: oposição quer investigação real dos pedágios

Linha fina
Objetivo é superar a maioria do governo em CPI recém criada e apurar mecanismos e supostas irregularidades nos contratos e nos modelos das concessões das rodovias paulistas
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São Paulo – Após conseguir criar a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Pedágios, a oposição a Geraldo Alckmin na Assembleia Legislativa de São Paulo tem agora um novo desafio: superar a maioria do governo e fazer as apurações do colegiado chegarem a resultados concretos.

Uma vez criada, a CPI precisa ser instalada. Essa é a primeira que, em tese, se poderá investigar alegadas irregularidades do governo tucano. No atual mandato, o governador mantém a praxe de mobilizar a base de apoio para evitar a instalação de apurações que lhe possam ser incômodas. Os nove membros da comissão, escolhidos segundo o critério da proporcionalidade, devem ser indicados pelos líderes dos partidos, o que deve ser feito nos próximos 15 dias. A maioria do Palácio dos Bandeirantes, de 68 deputados sobre um total de 94, assim, será refletida na comissão.

Segundo o deputado Antonio Mentor (PT), autor da proposta de criação da comissão, um dos principais focos de investigação será esmiuçar o modelo de concessão pelo qual o governo estadual deu às empresas o direito de explorar estradas e pedágios, um sistema do qual decorrem os altos preços das tarifas das praças paulistas. “Apenas a título de comparação entre duas viagens com mais ou menos a mesma distância: o usuário paga R$ 9 de pedágio para ir de São Paulo a Curitiba, por rodovia federal, e R$ 70 até São José do Rio Preto pelas estaduais”, exemplifica.

O líder do governo Alckmin na Assembleia Legislativa, deputado Barros Munhoz (PSDB), garante que a bancada do governador não teme as apurações e não pretende usar estratégias para evitar o funcionamento da CPI do Pedágio. “Vai funcionar e vai apurar que está tudo em ordem, tudo perfeito, como apurou a CPI da CDHU.”

Munhoz se refere à CPI instalada em 2009 para investigar supostas fraudes em licitações para a construção de casas pela Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU). O relatório final da comissão, a primeira instalada entre as requeridas pela oposição em 10 anos, não teve resultados satisfatórios.

“O que se pode concluir é que a CDHU, assim como outros entes do governo estadual, representa uma verdadeira caixa preta de onde pouco ou quase nada se consegue extrair. A CPI da CDHU, infelizmente, mimetizou o processo investigativo. Em outras palavras, fez de conta que investigou para tentar, assim, atestar a idoneidade de irresponsáveis gestores públicos em detrimento da defesa do erário”, dizia o relatório do deputado Roberto Morais (PPS) em 2009.

Barros Munhoz não esconde que a diferença de tratamento, dado pelo partido à CPI recém-aprovada na Assembleia e à pretendida no Congresso Nacional para apurar irregularidades na Petrobras, é política. “Aqui, eu não apoio [a CPI dos Pedágios]. Brasília é Brasília. Agora, eles, da oposição, apoiam CPI aqui e não apoiam lá", diz. "Nenhum governo gosta de CPI. Nem o nosso, nem o deles. Mas investigar é obrigação do parlamento."

O deputado Olímpio Gomes, o Major Olímpio (PDT), que assinou o requerimento de criação da CPI, demonstra ceticismo quando à efetividade das investigações parlamentares de modo geral. “Com a constituição dos membros da CPI, o governo terá uma maioria folgada. Deixei de acreditar em CPI. Elas não funcionam nem no Congresso nacional, nem aqui. Faz sete anos que sou deputado e não vi nenhuma que apurasse qualquer coisa de concreta sobre temas de responsabilidade do governo estadual.”

Para Olímpio, nem o fato de a CPI dos Pedágios mexer mais diretamente no bolso dos usuários, será motivo para o resultado da investigação ser o que se espera. “O governador não quer nem saber de efeito público. Ele tem 68 deputados na casa pra dizer amém para o que ele quer. Vai enterrar qualquer CPI exatamente porque tem coisas pelas quais o governo pode ser responsabilizado em todos os níveis, improbidade, corrupção, tudo o que você puder imaginar”, afirma o pedetista.

Para ser criada, a CPI contou com as assinaturas de 24 deputados da bancada do PT, dois do PCdoB, do próprio Olímpio, Carlos Giannazi (PSOL), além dos deputados da base governista Afonso Lobato (PV), Rafael Silva (PDT), Rogério Nogueira (DEM) e José Bittencourt (PSD).

Modelo de concessão - Os oposicionistas na Assembleia querem saber por que o modelo que concede a exploração das estradas se dá pelo maior valor da outorga, como da rodovia Bandeirantes e do sistema Anchieta-Imigrantes, e quais os mecanismos. Segundo Mentor, o fator determinante que diferencia o preço dos pedágios de rodovias estaduais e federais é que, nessas últimas, o modelo prevê a concessão a quem oferecer a menor tarifa dos pedágios.

“O modelo do estado é oneroso, errado, obriga as empresas que concorreram na licitação a oferecer valores vultosos e esse valor se reflete no preço do pedágio”, diz Mentor. “Tanto o modelo deles está errado que, nas últimas concessões, estão mudando para um modelo híbrido”. Em 2007, o então governador José Serra adotou, para a licitação do trecho Oeste do Rodoanel, um modelo misto, utilizando valor de outorga combinado com um teto do valor do pedágio. A licitação da Nova Tamoios, em andamento, também adota esse procedimento.

O deputado Isac Reis (PT) menciona um efeito perverso do alto preço dos pedágios. "As cidades na região Oeste, Carapicuíba principalmente, sofrem com os motoristas que fogem do pedágio e vêm por dentro da cidade. Nós não ganhamos nada com isso."

Um ponto específico que, de acordo com Mentor, os oposicionistas querem investigar é a prorrogação em contratos assinada em dezembro de 2006. “Essa prorrogação foi feita no apagar das luzes do governo, assinada pelo vice-governador em exercício, Cláudio Lembo. Ampliou os prazos de concessões em até oito anos”, lembra o petista.

Posteriormente, uma auditoria contratada pela Agência de Transporte do Estado de São Paulo (Artesp) chegou à conclusão de que as concessionárias teriam obtido ganhos indevidos que chegariam a R$ 2 bilhões até 2012 com contratos celebrados para corrigir os chamados desequilíbrios.

Por meio da  assessoria de comunicação, a Artesp informa que não comenta CPIs, mas não vê problemas em colaborar com a comissão da Assembleia Legislativa. Diz, também, que as investigações sobre os supostos ganhos indevidos estão em segredo de justiça a pedido das concessionárias.

Outro problema no modelo tucano, na opinião de Mentor, é a Taxa Interna de Retorno (TIR), índice que, em outras palavras, implica no cálculo do lucro das concessionárias. Para o deputado, é preciso saber por que a TIR adotada nas estradas federais gira em torno de 8%, enquanto o das estaduais alcança 20%. Projeções superestimadas de gastos com impostos e cálculos de perda do valor do pedágio para inflação são itens associados à TIR.

A RBA ouviu, nos bastidores, que alguns parlamentares da oposição, diante das dificuldades de conseguir chegar a investigações de fato contundentes pela CPI dos Pedágios, já trabalham com a possibilidade de apresentar um relatório paralelo e encaminhá-lo ao Ministério Público. Os trabalhos da comissão têm previsão de se encerrar em 120 dias.


Eduardo Maretti, da Rede Brasil Atual - 17/4/2014

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