São Paulo – Depois de duras críticas e acusações ao sindicato da categoria, motoristas e cobradores em greve se reconciliaram e irão juntos tentar pedir que o prefeito Fernando Haddad (PT) ajude a pressionar as empresas de ônibus da cidade a concederem aumento maior aos trabalhadores do setor. A reunião, no entanto, ainda não está combinada com o prefeito e não é confirmada pela assessoria de Comunicação.
Essa foi uma das decisões tomadas durante cerca de três horas de reunião de reconciliação na Superintendência Regional do Trabalho, no centro de São Paulo. Apesar de não avançar na obtenção de um acordo definitivo com as empresas, a reunião terminou com promessa de que a prestação do serviço será normalizada a partir da meia-noite desta quarta-feira 21. Estiveram presentes representantes dos trabalhadores das empresas Sambaíba, Gato Preto e Santa Brígida.
A medida seria uma sinalização de boa-fé do movimento que, inicialmente, não tinha apoio do sindicato. Os trabalhadores se diziam traídos. Na última segunda-feira (19), cerca de 4 mil trabalhadores teriam aprovado o reajuste de 10% em assembleia oficial convocada pelo sindicato. Os motoristas e cobradores que participam da paralisação desde terça-feira, no entanto, dizem que a a decisão não representava os anseios da categoria, que inicialmente dizia querer 30%, além de outros benefícios. Porém, hoje, durante entrevista coletiva após a reunião, representantes dos grupos insatisfeitos disseram que a reivindicação é por um aumento de 13%.
A reconciliação entre insatisfeitos e dirigentes do Sindicato dos Motoristas e Trabalhadores em Transporte Rodoviário Urbano de São Paulo foi uma das muitas reviravoltas no caso. Mais cedo, o presidente do Sindmotoristas, José Valdevan Noventa, chegou a afirmar que os dissidentes "querem manchar a imagem da entidade" e acusou haver um componente político que visa a enfraquecer a gestão do sindicato.
A paralisação teve início na tarde de ontem e surpreendeu prefeitura, empresários e sindicato. Motoristas ouvidos pela RBA ao longo do dia relataram insatisfação com o acordo fechado pelos líderes sindicais e indicaram esta como a principal motivação para a mobilização, que começou pela viação Santa Brígida, na zona norte.
Durante entrevista na sede da prefeitura, o secretário de Transportes, Jilmar Tatto, reiterou o entendimento de que a gestão municipal não pode interferir na relação entre trabalhadores e empresários. “A questão da negociação é uma relação privada, entre sindicato patronal e de empregados. É uma concessão, não compete à prefeitura. Estamos fazendo a nossa parte.”
Já o setor privado alega que não é possível voltar a tratar de uma lista de questões que havia sido aceita pelo sindicato e aprovada em assembleia. Para os empresários, além disso, há insegurança jurídica em dialogar com um grupo que não tem representação legal.
Para os interlocutores do Sindicato das Empresas de Transporte Coletivo Urbano de Passageiros de São Paulo (SPUrbanuss), a reabertura de negociação, como querem os grevistas, quebra a segurança jurídica. “Se eles não concordam com o que foi acertado pelo sindicato, é problema deles, não nosso. Eles que peçam a anulação da assembleia”, afirmou o advogado Antônio Roberto Pavani Júnior.
Para o superintendente regional do Trabalho, Luiz Antonio Medeiros, os empresários foram “intransigentes” durante a tentativa de negociação mediada por ele. Medeiros, que foi fundador da Força Sindical, chegou a dizer que nem no tempo da ditadura viu cenário parecido. Ele garantiu que os patrões pareciam “não pensar nos problemas da cidade” e que queriam ver “sangue”.
Segundo o motorista Luís Pereira Lima, da viação Sambaíba, o movimento vai tentar unir forças com o poder público para avançar nas reivindicações. “O patrão foi intransigente na reabertura ou melhoramento do que foi dado. Então, vamos juntar forças com o poder público e o nosso sindicato. Estamos juntando forças para isso”, destacou.
Os trabalhadores disseram que as reivindicações são direcionadas às empresas de ônibus, mas, agora, pretendem pressionar também a prefeitura. “Se ela (prefeitura) não abrir as negociações, os trabalhadores que estão lá fora voltam a parar. Porque nós estamos sem pudor mesmo”, enfatizou o motorista Paulo Martins Souza, o Maloca, da empresa Gato Preto.
A decisão de retomada dos trabalhos também foi influenciada pelo julgamento em relação à legalidade da greve, no Tribunal Regional do Trabalho, marcado para às 13h45 desta quinta-feira. Uma liminar obtida hoje pelo sindicato patronal obriga que pelo menos 75% dos ônibus de cada linha voltem a circular assim que as empresas forem comunicadas.
Na véspera, o prefeito Fernando Haddad tachou como “guerrilha inadmissível” a estratégia adotada pelos insatisfeitos e disse que o Ministério Público seria acionado para tratar do caso. “Mandaram as pessoas e os motoristas descerem dos ônibus, atravessaram os veículos nas ruas e jogaram fora as chaves. Isso, depois de uma assembleia que aprovou o acordo de reajuste. Nunca vi isso em nenhuma parte do mundo", ressaltou.
Hoje, Jilmar Tatto se reuniu com o secretário estadual de Segurança Pública, Fernando Grella, e acertou que um funcionário da SPTrans integrará o Centro de Operações da Polícia Militar (Copom) para relatar em tempo real casos de violência e vandalismo nos ônibus da cidade. Além disso, a PM instalará um inquérito para apurar os reais motivos da greve promovida por grupos de motoristas e cobradores de ônibus.
“Nós aperfeiçoamos o sistema para comunicar com rapidez. Abrimos um espaço no Copom para termos um funcionário da SPTrans para receber imediatamente as notícias de qualquer irregularidade e repassar para a polícia”, disse Grella. “Com isso. eliminamos qualquer possibilidade de haver uma interrupção ou alguma dificuldade de comunicação.”
Gisele Brito, da Rede Brasil Atual - 22/5/2014
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Empresas rejeitam rediscussão de reajuste. Comissão formada por trabalhadores e representante do Ministério do Trabalho tenta reunião com prefeito para pedir que pressione concessionárias
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