São Paulo – Além da intenção de privatizar Caixa e Banco do Brasil, a equipe econômica do “governo” interino de Temer já desenhou um novo papel para o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). Durante a posse de Maria Silvia Bastos, que substituiu o economista Luciano Coutinho (na presidência do banco desde 1997), o atual ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, disse que o banco deve atuar “de forma decisiva” no processo de concessões e a retomada das privatizações, segundo ele, algo “crucial” para o país.
Esse novo papel, de instrumentalizar as privatizações, já havia sido anunciado na Medida Provisória 727/2016, apresentada pelo “governo” Temer ao Congresso em maio e que ainda aguarda aprovação do Legislativo. Essa MP 727 abre caminho para a venda das estatais e atribui à instituição a função de criar e gerir o Fundo de Apoio à Estruturação de Parcerias (público-privadas).
“Contrariando a ideia de que o BNDES seria mais um banco no alvo da privatização, o núcleo duro do golpe lhe reservou um renovado e estratégico papel: garantir as condições financeiras e técnicas para a estruturação dos projetos de infraestrutura a serem assumidos pela iniciativa privada”, avalia a assessora do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) Alessandra Cardoso.
O economista Antônio Corrêa de Lacerda, professor doutor da PUC-SP, destaca: “É a mesma agenda que foi aplicada nos anos 1990. O que se está fazendo é substituir um banco de desenvolvimento por um banco de investimento. O problema é que não temos linhas de financiamento privadas para infraestrutura e é o BNDES que cumpre esse papel. O sistema privado não investe, ele aplica recursos na dívida pública brasileira, que é mais rentável e sem risco. Portanto, chega-se a um nó. Não está claro o que vai ficar no lugar do BNDES para financiar áreas em que o setor privado não tem interesse em investir”.
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Nos estados – Em entrevista recente, a nova presidenta do BNDES afirmou que a instituição pode ajudar os estados com dificuldades financeiras, colaborando com privatizações de companhias de saneamento, por exemplo. “Tem o refinanciamento da dívida dos estados e o BNDES pode ser um apoio muito importante, eu até falei no meu discurso, sobre o saneamento no estado do Rio. Mas já tem outros governadores me procurando dizendo ‘eu também quero fazer, eu também estou interessado'”, disse Maria Silvia Bastos à Globo News.
Para a professora doutora do Instituo de Economia da Unicamp Simone de Deos, os reflexos desse novo papel para o país e para a população serão ruins. “A experiência de vários países e mesmo de grupos de países com bancos de desenvolvimento muito importantes e operativos mostra que eles não são descartáveis e nem supérfluos em funções centrais do processo de desenvolvimento, que está longe de ser espontâneo e garantido pelas forças de mercado”, diz.
Anticíclico – Simone de Deos também aponta a importância dos bancos públicos em períodos de crise. “O BNDES, assim como Caixa e Banco do Brasil, teve papel chave no enfrentamento do contágio que o Brasil sofreu da crise financeira internacional, a partir do último trimestre de 2008. O banco atuou de forma contracíclica, procurando expandir o crédito quando as outras fontes secavam.”
Atuação, segundo a economista, que não estaria prevista no modelo pensado pela equipe econômica do “governo” interino. “Vejo com muita preocupação essa percepção sobre o novo papel do Estado e dos bancos públicos e esse ensaio de desmonte dessas instituições”, afirma.
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Andréa Ponte Souza – 10/6/2016
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Novo papel da instituição no “governo” interino de Michel Temer é criticado por economistas
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