Pular para o conteúdo principal

FHC fica sem argumentos sobre impeachment

Linha fina
No espaço de apenas dez minutos em entrevista à Al Jazeera, ex-presidente se embaraça repetidas vezes, chegando a contradizer a narrativa que seus aliados vêm insistindo ao falar do golpe que afastou Dilma
Imagem Destaque
São Paulo – Não há jornalismo na grande mídia brasileira. Nas redações, temos colunistas que, em sua maior parte, confundem "análise" com "lamber saco dos patrões"; nos grandes portais, as matérias são destacadas ou escondidas de acordo com os interesses corporativos em vez de critérios jornalísticos; na TV, os âncoras nada mais são do que leitores de teleprompter que fotografam bem e querem apenas garantir seus milionários salários pagos pelas cinco famílias que dominam todos os veículos do país.

É por isso que O Globo noticia que "Dilma tem 62% de reprovação", mas, quando se trata de Temer, a manchete se transforma em "Temer tem aprovação de 13% dos brasileiros". É por isso que nenhuma denúncia envolvendo tucanos ganha destaque por mais de alguns minutos – e, se ganha, são diluídas pela linguagem: Alckmin vira "governador" (sem nome ou partido), Aécio entra no meio de "senadores" e assim por diante – ao passo que, lembrem-se, o UOL chegou a falar, certa vez, sobre um crime cometido "por médico que atendeu Lula no passado".

O que nos traz às entrevistas, que, quando feitas com tucanos, nada mais são do que recitações de perguntas pré-aprovadas - e quando alguém sai da zona de conforto, o resultado é um piti adolescente.

Foi exatamente isso que aconteceu agora com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Habituado a entrevistas com jornalistas brasileiros, que se limitam a levantar a bola para que ele corte em movimentos ensaiados, FHC teve suas posições confrontadas por um âncora da Al Jazeera e, como resultado, deu um vexame internacional

Desde que FHC se transformou num dos mais dedicados defensores do golpe, ele deu algumas entrevistas em que passeou com tranquilidade ao acaso. Uma delas, especialmente marcante pelos personagens e pelas circunstâncias, foi para Mario Sergio Conti, apresentador de um programa na GloboNews e ex-diretor da Veja.

Mario o chamou o elder statesman, algo como "sábio estadista", e simplesmente não tocou num escândalo que havia estourado uma semana antes: a jornalista Mirian Dutra resolvera contar tudo sobre a história do relacionamento amoroso entre os dois e sobre o filho que tiveram.

Parêntese: Mario Sergio foi o executor de uma nota plantada na Veja pelo então ministro Fernando Henrique dizendo que o pai do filho de Mirian era um “biólogo”. O ano era 1991 e Mario era o diretor da revista. Fecha parêntese.

FHC está mal acostumado com a imprensa brasileira e quando sai dessa zona de conforto toma um susto.

Ele foi o convidado do Up Front, atração da Al Jazeera comandada por Mehdi Hasan, premiado jornalista britânico, radialista, escritor e comentarista político, autor de dois livros. Hasan foi ouvir FHC como ex-presidente do país, portanto com autoridade para falar, e também como um dos “apoiadores do impeachment”.

O que se seguiu foi um embate em que um dos lados saiu irremediavelmente exposto em sua fragilidade de argumentos – nu com sua farsa. E não foi Mehdi.

No espaço de apenas dez minutos. o ex-presidente se embaraça repetidas vezes, chegando a contradizer a narrativa que seus comparsas golpistas vêm insistindo ao falar do "impeachment".

Aliás, FHC já abre a entrevista admitindo que Dilma não cometeu crime “no sentido penal”. E completou “ela cometeu um crime político”. O que não deixa de ser interessante, já que não há nada na Constituição que defina "crime político" ou o impeachment como pena.

Aí o entrevistador aponta que FHC pedalava R$ 300 milhões por ano, inspirando a seguinte e inacreditável resposta: “No meu caso, foi diferente. Estávamos nos ajustando”.

"Ela manipulou o orçamento fiscal, finaliza Fernando Henrique." "Mas você também…", retorque Hasan.

Em seguida, o âncora aponta como Cunha, Temer e demais cúmplices são acusados de corrupção e pergunta se FHC não vê ironia no fato destes liderarem o “impeachment”. O ex-presidente começa a gaguejar, murmura algo sobre “foi o ‘povo’ que liderou” e diz que talvez Temer/Cunha sejam oportunistas. É então que o entrevistador o interrompe e diz: “Ok, então você aceita oportunismo” e muda de assunto.

Hasan retoma e lembra que o “impeachment está repleto de hipocrisia”. Cita as denúncias contra Michel Temer, Eduardo Cunha, Renan Calheiros. “Alguma dessas pessoas tem credibilidade para impedir Dilma?”. "Eles têm outra razão, diferente da minha, para apoiar o impeachment", devolve FHC. "Você não vê ironia no fato de eles lideraram o impeachment?"; "O povo que liderou…"; "Você apoia o impeachment de Temer pelas mesmas razões? 68% querem Temer impedido, segundo uma pesquisa. Se você ouve o povo, tem de apoiar"; "Isso é uma informação errada. Não é de meu conhecimento."; "Sim, é do Datafolha, responde Hasan. Você apoia o impeachment de Temer?"

Ao final do "embromation" de Fernando Henrique, Hasan ainda toca no tema do relacionamento extra-conjugal que manteve com a jornalista Mirian Dutra.

Mais
Vídeo: assista a entrevista completa


Rede Brasil Atual, com DCM e Brasil247 - 5/7/2016
seja socio