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População quer ser ouvida e participar

Linha fina
Decreto de participação popular, derrubado pela Câmara, busca regulamentar maior atuação da sociedade civil nas decisões governamentais. Cidade de São Paulo conta com conselho para discutir políticas públicas
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São Paulo – A Câmara dos Deputados derrubou o decreto presidencial que criou a Política Nacional de Participação Social (PNPS). Motivo de muita polêmica, a PNPS estabelece que os órgãos da administração pública federal devem ouvir instâncias organizadas da sociedade civil, como sindicatos, associações de bairro, movimentos estudantis, de mulheres, na hora de formular, avaliar e monitorar suas políticas.

Agora o Senado deverá apreciar a questão, mas o presidente da casa, Renan Calheiros, já sinalizou que o decreto terá o mesmo destino traçado pela Câmara.

Para derrubar a política de participação social, na terça 28 (foto), parlamentares da oposição e alguns integrantes da base governista alegaram que o ato fere prerrogativas do Legislativo. Justificaram também que a intenção do governo seria aparelhar os processos de decisão, como ocorre atualmente na Venezuela.

A argumentação, no entanto, não procede, já que os conselhos não teriam poder de decisão, ou seja, não causariam nenhum dano à autonomia dos poderes republicanos. A única mudança seria que, antes de criar leis, os parlamentares deveriam ouvir a população.

A pesquisadora do WZB Berlin Social Science Center e professora do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da UERJ (IESP-UERJ), Thamy Pogrebinschi, sustenta que mecanismos de participação social abarcados pela PNPS, como as conferências nacionais, existem desde os anos 1940.

Segundo ela, 42 conferências nacionais foram realizadas no Brasil entre 1941 e 2002, antes da chegada do PT ao governo federal. Cerca de metade dessas, 20 conferências, foi realizada pelo governo de Fernando Henrique Cardoso.

“Vê-se que o PSDB agora busca invalidar o decreto presidencial que busca regulamentar um mecanismo participativo que ele próprio resgatou da Era Vargas e ajudou a impulsionar. O PT simplesmente deu continuidade e se preocupou em regulamentar e institucionalizar o mecanismo.”

Em nota, a Central Única dos Trabalhadores (CUT) também criticou a derrubada do PNPS. “A reação raivosa dos setores reacionários diante do decreto demonstra o temor à luta dos movimentos sociais. Quanto mais formas de brecar a organização, melhor para quem deseja manter tudo exatamente como está e não quer abrir caminhos para a atuação de conselhos eleitos democraticamente”, declarou a central sindical.

A presidenta do Sindicato, Juvandia Moreira, reforça a importância do PNPS. “A criação dos conselhos populares é uma eficaz forma de diálogo com a sociedade, antes de decisões do governo sobre temas de interesse público. A participação de todos fortalece a democracia no processo de estruturação das políticas no país.”

Crise hídrica – Um exemplo claro que demonstra a importância da participação da sociedade organizada nas decisões governamentais é a atual crise hídrica que afeta o estado de São Paulo. Nos anos 1990 foram criados por força de lei os Comitês de Bacias Hidrográficas, órgãos tripartites entre estado, municípios e sociedade civil para discutir politicas de gestão dos recursos hídricos. No entanto, segundo o geólogo e especialista no assunto Delmar Mattes, os comitês foram sendo paulatinamente esvaziados pelo governo estadual.

“Isso contribuiu para a situação atual de escassez hídrica, pois se houvesse uma participação popular, como deve ser, o estado seria cobrado com mais intensidade e teria estabelecido políticas mais eficientes de gestão dos recursos hídricos”, avalia.  

Conselho Participativo – A cidade de São Paulo atualmente conta com a participação da população organizada na implantação de politicas públicas, por meio dos conselheiros populares. Eles são cidadãos comuns eleitos pela população para integrar o Conselho Participativo Municipal, organismo autônomo nas mãos da sociedade civil.

Sua criação busca ampliar a participação popular na gestão pública e a transparência nas 32 subprefeituras da capital. O papel dos conselheiros é exercer o controle social no planejamento, fiscalizar as ações e gastos públicos nas regiões e sugerir ações e políticas públicas. Eles são eleitos para um mandato de dois anos.

O diretor executivo do Sindicato e empregado da Caixa, Dionísio Reis, integra o conselho participativo na Lapa, bairro onde reside.  O dirigente enumera como exemplo das políticas abarcadas pelo conselho os debates em torno do zoneamento da cidade e a eleição de representantes para integrar as discussões do orçamento participativo, por meio do qual a população debate o destino das verbas públicas.

Para Dionísio, medidas como os conselhos participativos e a Política Nacional de Participação Social têm a finalidade de aproximar as pessoas das decisões governamentais. “A participação e o controle social das decisões de governo são exigências da população, da sociedade civil organizada, para não ficarmos só na mão dos políticos eleitos, que raramente têm a iniciativa de aproximar a população daquilo que estão fazendo.”


Rodolfo Wrolli - 3/11/2014

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