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O descanso de uma guerreira

Linha fina
Morre, aos 90 anos, a primeira mulher bancária que fez parte da diretoria do Sindicato: Consuelo de Toledo Silva, militante e defensora da democracia
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São Paulo – Se 2015 foi um ano de protagonismo das mulheres, que foram para as ruas lutar por seus direitos, fizeram suas vozes ecoar mais forte na internet e contribuíram para o debate em torno de feminismo, igualdade de direitos e salários, combate ao preconceito, tudo isso foi reflexo da história construída por mulheres guerreiras como Consuelo de Toledo Silva, que morreu no dia 27 de dezembro.

Nascida em Campinas, em 1925, foi criada pela mãe costureira que, abandonada pelo marido, liderou sozinha a família. Jovem, revolucionária, rebelde com causa, a bancária foi a primeira mulher a integrar a direção do Sindicato, em 1957, aos 32 anos. O primeiro registro em sua carteira de trabalho foi do Banco Comércio e Indústria de São Paulo, como datilógrafa e copista.

Entre os colegas dirigentes sindicais, ela fazia parte da turma amante da poesia. Mas, a vida de militante foi dura. Em 1964, período da ditadura, foi presa pelo Deops (Departamento de Ordem Política e Social), braço repressor do regime militar, quando fazia parte do Conselho Intersindical da Mulher Trabalhadora. Consuelo não se intimidou e seguiu lutando em defesa da democracia e participando das manifestações do Sindicato. “A greve é uma pequena revolução”, afirmava.

Na mesma época, casou-se com Sílvio de Souza Monteiro. Em 1972, desquitada, voltou às suas atividades profissionais e trabalhou na Univest, como vendedora de títulos. Em 1974, foi admitida pelo Banco do Estado de São Paulo e entre 1979 e 1980 foi secretária do Esporte Clube Banespa. Em 1994 entrou para a Associação dos Bancários Aposentados do Estado de São Paulo e era militante do Partido dos Trabalhadores.

Alegria – Consuelo viveu desde 1999 em um apartamento no Edifício Copan – obra de Oscar Niemeyer e cartão postal da cidade de São Paulo.

Aos 88 anos concedeu entrevista à edição especial da Folha Bancária em comemoração aos 90 anos do Sindicato. Independente e cheia de alegria, transformou o encontro com a reportagem em um delicioso bate-papo, mostrou cartas antigas e fotografias que registravam sua história.

> Quem veste saia não foge à luta

A presidenta do Sindicato, Juvandia Moreira, primeira mulher eleita para comandar a entidade, homenageia a militante: “Consuelo é um exemplo, mulher de convicções, princípios, com grande amor pela vida, desejo de ver e fazer transformação e melhoria social. Que o mundo tenha muitas Consuelos”, afirma, lembrando entrevista concedido ao MB em Debate com a Presidenta, em razão do Dia Internacional da Mulher e da comemoração dos 90 anos do Sindicato, em março de 2013.

> Vídeo: assista à entrevista de Consuelo para ao MB com a Presidenta

Despedida – Consuelo foi internada no início de dezembro com uma crise de asma. Depois, no dia 14 de dezembro, voltou a ser internada na Santa Casa de São Roque, para tratar de uma infecção e de problemas respiratórios. No último ano, ela vivia em uma casa de repouso. Em 2008, demostrando mais um gesto nobre e de preocupação com a humanidade, doou seu corpo para o Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), para a Disciplina de Topografia Estrutural Humana, para servir aos estudos da Ciência.

Bom descanso, Consuelo! – Em entrevista ao Museu da Pessoa, Consuelo encerra a conversa citando uma poesia que adorava, “A morte da águia”, de Luís Guimarães Júnior: “Morrer livre, cercada de vitórias, com suas asas, pavilhão de glórias, inundadas da luz que o sol espalha: ter o fundo do mar por catacumba, as orações do vento que retumba, e as cambraias da espuma por mortalha”.

O Sindicato rende suas homenagens à guerreira bancária, mulher de fé pela luta em defesa da democracia. Bom descanso, guerreira!


Gisele Coutinho – 4/1/2016
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