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Elas atuam contra o machismo, racismo e homofobia

Linha fina
A semente do Movi Femi-HR surgiu há três anos e se tornou uma referência de exercício da cidadania em uma escola municipal da zona leste paulistana
Imagem Destaque
Paula Dias, Rede Brasil Atual
9/1/2017


São Paulo – Brenda, Marcella, Larissa, Júlia, Isabela, Renata, Gabrielly, Caroline, Luana, Nathaly, Beatriz, Tainá, Laryssa, Bruna, Andrezza, 14 anos em média, decidiram dar um basta ao tratamento desrespeitoso que recebiam de alguns meninos, na escola de Ensino Fundamental, no Jardim Brasília, em São Paulo. A semente do Movi Femi-HR (movimento feminista – contra homofobia e racismo), nasceu há três anos da análise de textos nas aulas de Literatura. Machado de Assis, Clarice Lispector, Chico Buarque e Hua Mulan – personagem da cultura milenar chinesa, que inspirou o filme Mulan, da Disney – despertaram percepção e compreensão das desigualdades e preconceitos raciais, sociais e sexuais, que também se refletiam no dia a dia da escola.

"O Edu, professor de Literatura, falou sobre a luta das mulheres e a origem do 8 de Março, Dia Internacional da Mulher. Aí começamos a entender o feminismo. Isso ocorreu no 6º ano", lembra Brenda, animada a criar o grupo para defender os direitos das meninas. Mais meninas se juntaram e foi ficando claro: se fossem praticar algo, deveria ser de forma coletiva.

Dois anos depois, passaram a compartilhar ideias com o restante da escola. Fizeram cartazes explicando o que era o feminismo e o Movi Femi-HR. Na ocasião, tiveram cartazes rasgados. O grupo passou a entrar nas salas de aula e as campanhas contra o machismo, o racismo e a homofobia, passaram a ocorrer abertamente na escola.

Eram comuns os casos de meninos tocarem as meninas e tratá-las de forma desrespeitosa. O Movi Femi-HR conseguiu interferir. "A gente conseguiu conscientizar quase a escola inteira, eu acho! Agora as meninas sabem que se elas não quiserem uma coisa é só elas falarem ‘não’ e acabou, ninguém pode fazer nada sem o consentimento. Elas perceberam que podem decidir sobre o corpo delas e sobre tudo... a gente conseguiu empoderar as meninas", acredita Marcella.

Hoje, meninas que sofrem assédio procuram a intermediação do grupo para conversar com os meninos e tentar resolver a situação. Se for necessário, o caso é encaminhado para a direção da escola. "O assédio é a questão que tem o combate mais difícil e necessário", observa Brenda. As meninas são vigilantes para que os meninos sejam reeducados, interferindo no vocabulário e até mesmo na mudança de atitudes. Dois deles aderiram ao grupo e ajudam na propagação das práticas de respeito.

Uma atividade didática que chamou a atenção foi a análise de algumas letras de música funk. Elas constataram que quase todas depreciam a mulher e que muita gente adere à onda sem prestar atenção à mensagem por trás do ritmo.

Sexualidade e identidade – Nas conversas sobre sexualidade, orientação sexual e comunidade LGBT¬I – Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexuais – elas compartilham dificuldades vividas por quem destoa "dos padrões socialmente aceitos". As famílias, em sua maioria, são conservadoras. O grupo prega o respeito. "A partir do momento em que uma mulher quer ser chamada e tratada como mulher, mesmo tendo nascido homem, ela será respeitada, uma mulher trans é mulher assim como as outras", defende Bruna.

"Quem se manifesta contra a liberdade de orientação sexual quer retirar o direito de amar, e todos têm esse direito", acrescenta Renata. "O amor move as pessoas, então move a luta também. A partir daí começa uma nova luta: contra o preconceito, inclusive para adotar uma criança e compor família", completa Isabela.

A conversa inclui a importância do uso de preservativos na prevenção a Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST) e a gravidez precoce, e do papel da participação da mulher nessa decisão. "Ele tem que saber que não tem só ele ali, são dois e é uma troca", diz Renata.

As experiências de enfrentamento ao preconceito racial também fazem parte do dia a dia do grupo. "A primeira vez que aconteceu comigo, não tive reação, só sabia chorar. Depois que o Movi Femi-HR começou tive mais atitude e passei a denunciar", relata Andrezza, destacando quanto a atitude fez bem a autoestima. "Por conta da escravidão, os racistas mandaram muitos negros para a senzala e, ainda hoje, acham que os negros estão a serviço deles", critica Bruna.

"Estudamos juntas, militamos juntas, somos muito amigas, conversamos sobre tudo e aceitamos umas às outras independentemente de qualquer diferença ou opinião", afirma Larissa. E assim atuam as meninas da Escola Municipal de Ensino Fundamental Eduardo Prado, na zona leste da capital paulista. Construindo para além dos muros da escola, em relações baseadas na amizade e no respeito, um caminho para a cidadania.
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