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“Manter Sindicato após golpe foi desafio”

Linha fina
Presidente do Sindicato entre 1967 e 1969, depoimento de Frederico Brandão encerra trabalho da Comissão da Verdade da entidade e relembra dificuldades de fazer movimento sindical nos anos da ditadura
Imagem Destaque
São Paulo – Em 1966, a chapa liderada por Frederico Brandão, bancário do Banespa, ganhou a eleição para a diretoria do Sindicato. Era a segunda eleição para a entidade em tempos de ditadura militar e civil. “Criamos novas estruturas, fizemos um controle contábil e financeiro moderno. A sede era no 7º andar do Martinelli, que naquela época era muito precário e sujo. Tínhamos 5 mil sócios e conseguimos reerguer a entidade. De tanta repressão e medo, nossa maior tarefa foi manter o Sindicato aberto, o que foi uma vitória.”

O relato foi feito à Comissão da Verdade e História do Sindicato, que concluiu seus trabalhos após o depoimento de Brandão, na quarta-feira 27. Desde que foi criada, em novembro de 2013, a comissão ouviu 15 personalidades da vida do Sindicato nos anos de regime militar. As narrativas foram gravadas em vídeo e serão disponibilizadas em material impresso e digital.

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Brandão (na foto, de camisa escura, ao centro) está com 79 anos e voltou a morar em sua cidade natal, São Luiz (MA). Foi na capital maranhense que iniciou sua militância política, entrou para o PCB (Partido Comunista Brasileiro) e fez parte do movimento estudantil, quando cursava Direito. Depois, mudou-se para o Rio de Janeiro onde, ainda como estudante de Direito, foi eleito vice-presidente da UNE na gestão Aldo Arantes.

Com lágrimas nos olhos, Brandão fala do incêndio criminoso da recém-inaugurada sede da UNE, atentado de grupos de direita que apoiavam o golpe militar. “Estava namorando em São Paulo e passei no concurso do Banespa de 1965. Fui admitido em 5 de julho, há exatos 50 anos. Fui trabalhar na Torre [como era chamado o prédio da Rua João Brícola, no centro da capital] e logo me engajei nas lutas do Sindicato.”

A emoção continua com as lembranças dos desaparecidos e os esforços para libertar presos do DOI-Codi, órgão de repressão do Exército. Ele lembra ainda de sua participação na organização do 1º de maio de 1970, para o qual foi destacado como orador oficial. O evento, na Praça da Sé, terminou em pancadaria, com o governador dos militares, Abreu Sodré, tendo de se refugiar de pedradas no interior da igreja.

O Sindicato era aliado da Federação dos Bancários de São Paulo, mas Brandão disputou uma vaga e conseguiu ser eleito secretário-geral em 1969. Indicou para a presidência da entidade Salvador Tolezano. “Não quis acumular os dois cargos”, justifica. Um ano depois, Tolezano seria assassinado em Sorocaba, num controverso episódio que divide opiniões entre ter sido um crime comum – os policiais que o assassinaram queriam assaltar uma empresa em Votorantim – ou ter sido repressão política da ditadura. “Até hoje não assimilei esse episódio”, diz Brandão. Após a morte de Tolezano, assume o vice, Eros de Almeida, num clima de enorme comoção social e política na entidade.

Um ano depois, Brandão foi cassado pela ditadura por ter liderado uma luta de readmissão de colegas do Banco do Brasil, demitidos pelo regime. “Fui o único a ser cassado dentro da Federação.” Perdeu seus direitos de exercer a militância sindical, o que não o impediu de se eleger deputado federal em 1974 pelo antigo MDB, hoje PMDB, sigla onde se aglutinaram as principais lideranças opositoras. Essa eleição passou para a história com a maciça votação recebida pelo MDB, a oposição consentida, como a primeira grande manifestação eleitoral contra a ditadura civil militar.

Comissão – O trabalho de resgate da Comissão da Verdade e História do Sindicato nasceu de uma constatação: quase não haviam documentos sobre esse período. “Ao buscar a história do impacto do golpe e da ditadura no Sindicato, logo percebemos que não havia memória e documentos”, diz o diretor da entidade e jornalista, Paulo Salvador, que coordenou as entrevistas. “Agora a história está contada por aqueles que a fizeram debaixo das baionetas”, conclui.


Redação – 1º/6/2015
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