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Chapéu
#CHEGADEAGROTÓXICOS

Saiba por que o Pacote do Veneno é ruim para o Brasil

Linha fina
Desprezando os danos ambientais e à saúde, os ruralistas repetem que o Brasil precisa de mais agrotóxicos para alimentar o mundo. Se o mundo está banindo esses produtos, quem vai comprar a produção?
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A comissão especial da Câmara que analisa mudanças propostas para afrouxar as regras para toda a cadeia dos agrotóxicos, aumentando assim sua produção e consumo, realiza nesta segunda-feira 25, a partir das 12 horas, reunião extraordinária. O objetivo da presidenta, deputada Tereza Cristina (DEM-MS), do relator Luiz Nishimori (PR-PR) e dos demais ruralistas, que são a maioria na comissão, é finalmente conseguir colocar em votação o polêmico Pacote do Veneno. A reportagem é da RBA.

A tramitação da proposta, que começou sem estardalhaço, sendo discutida a princípio apenas entre especialistas e ativistas de saúde e meio ambiente, vem ganhando cada vez mais repercussão. Intelectuais, artistas, chefs de cozinha, cozinheiros famosos e celebridades até internacionais, como Gisele Bündchen, aderiram à campanha #ChegaDeAgrotóxicos e participam de manifestações pelas redes sociais às vésperas de cada reunião da comissão. Outras, como Paola Carosella, Bela Gil e Bel Coelho, entre outros, comparecem à sala de reuniões na Câmara, em Brasília.

> ONU envia carta ao governo brasileiro alertando contra o Pacote do Veneno

Ansiosos pela aprovação, os ruralistas e seu trator, representado pela presidenta, que preside também a Frente Parlamentar Agropecuária (FPA), estão sendo brecados pela minoria. Deputados do PT, PCdoB, Psol, PSB, PDT e Solidariedade têm conseguido ganhar tempo ao forçar o debate com obstruções e requerimentos – o que nas palavras dos defensores do Pacote significa "atrasar o Brasil".

O que tem pesado contra a poderosa bancada, alinhada com os interesses não só do agronegócio como das indústrias de agrotóxicos é justamente a falta de argumentos – o que os deputados opositores têm de sobra.

Convicção

"Com toda a convicção (do voto por um requerimento apresentado na reunião da comissão), porque nós sabemos que o nosso Brasil fornece alimento para o mundo inteiro. Agora, quem 'tá' com dúvida (de que o alimento é envenenado ou não) não come", disse na terça-feira 19 o deputado Professor Victório Galli (PSL-MT), defensor da aprovação do Pacote.

Primeiro vice-presidente da comissão especial, o ruralista Valdir Colatto (MDB-SC) é autor do polêmico Projeto de Lei 6268/16, que propõe a liberação da caça e venda de animais silvestres. Agrônomo, como faz questão de sublinhar em todas as suas intervenções, para dar credibilidade ao que pensa, se limita a citar uma nota da Embrapa, que defende alguns pontos do Pacote, como a necessidade de aprovar produtos mais modernos. E a mencionar dados da edição de 2016 do Programa de Análises de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (PARA), da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

"Em 2016, a Anvisa fez uma análise, um relatório do seu programa de análise de resíduos de agrotóxicos em alimentos, que analisou mais de 12 mil amostras. Mais de 99% eram seguras. O que quer dizer? Nós estamos levando, sim, alimento seguro para a mesa dos brasileiros. Eu acho que a Embrapa tinha de estar aqui mostrando as pesquisas que faz, e mostrando para os brasileiros que é preciso, sim, usar defensivos agrícolas para podermos produzir e para alimentar os brasileiros e 7 bilhões de pessoas no mundo. E quem quiser ficar sem defensivos, com os orgânicos, é muito simples: procura o restaurante ou casa de produtos orgânicos e vai almoçar lá", disse, sem completar a frase por causa do microfone cortado pelo tempo excedido.

Divulgado em novembro de 2016, o relatório do PARA foi contestado por entidades e órgãos públicos de todo o país, que acusaram a Anvisa de manipular e negligenciar dados de interferência direta na saúde da população brasileira, além de desconsiderar o efeito crônico da contaminação por agrotóxicos, potencialmente relacionados a agravos como câncer, desregulação hormonal, efeitos sobre o sistema imunológico, entre outras doenças degenerativas.

Dúvidas

“Permanecem  dúvidas na sociedade a respeito do entendimento da comunidade científica, que não teve audiência devida nesse embate entre representantes que querem de toda maneira empurrar os seus produtos altamente nocivos à saúde e impedindo inclusive que agricultores possam ter alternativas de combate a pragas. Nesse sentido, nós achamos importante que tenhamos um debate mais apurado, mais aprofundado", defendeu o deputado Augusto Carvalho (SD-DF). 

Único deputado do Distrito Federal a votar a favor do impeachment, sem crime de responsabilidade, da presidenta Dilma Rousseff, Augusto Carvalho é a prova de que a defesa de um debate mais amplo sobre um tema de interesse social tão grande, como o Pacote do Veneno, está longe de ser questão meramente ideológica. A questão chegou a ser explorada pela campanha dos ruralistas intensificada a partir desta semana nas redes sociais. Coincidência ou não, os defensores do pacote tornaram-se mais ativos também em grupos de WhatsApp desde que Nizan Guanaes assumiu o comando da publicidade pró-Pacote do Veneno, no meio da semana.

Agricultor do sudoeste do Paraná, o deputado Assis do Couto (PDT-PR), já mexeu muito com agrotóxicos. Ou "pesticidas", como o relator Luiz Nishimori  passou a chamar em seu novo substitutivo o até então "defensivo fitossanitário" do Pacote do Veneno original. "Já tenho situações familiares gravíssimas", disse, referindo-se a pessoas com câncer na família devido à exposição a esses produtos.

Uma das vozes contrárias ao Pacote dentro de sua legenda, o parlamentar entende que o pretexto usado para a flexibilização das regras da cadeia dos agrotóxicos é o mesmo utilizado na criação da Lei de Biossegurança, que ele votou contra, para legalizar as plantas transgênicas introduzidas no Brasil por meio de contrabando ainda na década de 1990: a redução do uso. "Reduzir o uso dos pesticidas, ou dos venenos, dos agrotóxicos... Mas a realidade mostra que só aumentou, de forma absurda, encarecendo a produção, o que não é bom para os agricultores", disse. 

Nova agenda

Para o parlamentar, em vez do Pacote, os deputados deveriam estar discutindo uma nova agenda agroalimentar, em substituição à atual, sob hegemonia da produção em escala, com distância entre o produtor e o consumidor, com custo de transporte e a péssima qualidade dos alimentos que estão sendo rejeitados no mundo inteiro e no Brasil. 

"Há movimento forte na sociedade por alimentos mais saudáveis, com mais segurança. Só não vê isso quem não quer, quem está fascinado não sei por qual interesse nesta ideia maluca de hegemonia do uso desenfreado de agrotóxicos. E esta nova agenda vai ter de estar pautada neste país que vai ter eleições gerais em outubro. Por isso não entendo essa pressa de votar isso agora. Aqui teríamos de tratar de questões estruturantes, como a inspeção sanitária animal e também vegetal", disse.

Para Assis do Couto, o substitutivo de Luiz Nishimori deveria inserir a questão da inspeção sanitária. E lembrando a utilização de produtos contrabandeados, sem o mínimo controle, em regiões próximas às divisas com outros países, advertiu que os excessos no uso de agrotóxicos deveria ser motivo de preocupação, e também para o fortalecimento da inspeção vegetal no Brasil. 

Em novembro, a União Europeia renovou a licença do glifosato por cinco anos, mas a pressão da sociedade pelo banimento é grande. De todo modo, França vai banir em 2021.

"O país não pode se preocupar apenas com a venda de matéria prima para o mundo, como se isso fosse sustentável. Estamos enfrentando essa situação, com o embargo da Europa ao frango. O nosso sistema de inspeção animal está em xeque. Tanto que um comissário chegou a dizer ao ministro da Agricultura Blairo Maggi sobre a necessidade de uma auditoria externa ao nosso sistema. O ministro chegou a concordar com algumas reformas, mas nada se faz, não queremos mexer na nossa ferida. A inspeção sanitária não é só animal. Também é vegetal. Os defensores aqui do agro vão logo, logo, ver embargos aos grãos do Brasil em alguns mercados do mundo por conta do descuido, da ânsia e da ganância de algumas indústrias de venenos que querem vender mais e mais no Brasil. E logo poderemos ter embargo à soja, ao milho, por mercados importantes. Não vamos brincar com uma coisa tão séria".

Gasolina na fogueira

Assis advertiu ainda: "A aprovação desse projeto vai prejudicar as nossas exportações. Estamos aqui para tratar de interesses de produtores rurais brasileiros, consumidores, e enfrentando lobistas de produtores que querem vender mais veneno e ganhar cada vez mais, lucrar mais. Para onde vamos? É sustentável isso? Acho uma temeridade votar esse projeto; a sociedade vai se revoltar contra isso, que não é um tema de esquerda, de direita, não é ideológico. É de saúde pública, de meio ambiente. Quem conseguir aprovar esse projeto com certeza terá arrependimento, porque está mexendo com a vida de muita gente, com o nosso mercado internacional, que pode agora estar de luz amarela, quase vermelha, alertando para os perigos ao nosso tão rico agronegócio brasileiro. Estamos ateando gasolina para tentar apagar uma fogueira. Ninguém aqui que conseguir aprovar o projeto vai sair ganhando. Vai perder o país, vai perder o agro".

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