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Migração e refúgio em debate

Linha fina
Em seminário realizado no Sindicato, especialistas discutiram novos fluxos migratórios e os desafios do Brasil para acolher adequadamente imigrantes e refugiados
Imagem Destaque

São Paulo – Um encontro entre o Brasil e seus imigrantes e refugiados. Foi o que aconteceu na quarta-feira 27, na sede do Sindicato, durante o seminário O Brasil diante dos desafios de um novo ciclo de imigração, parte da série de debates Conversas Sobre África, promovida pelo Instituto Lula com a mediação do seu diretor, Celso Marcondes. A plateia lotada acomodava pessoas de várias nacionalidades: síria, haitiana, angolana, congolesa, peruana, burquinabês, nigeriana, cabo-verdenses, argentina, entre tantas outras.

Também estavam presentes, naturalmente, brasileiros interessados na questão da imigração e refúgio com olhar voltado aos direitos humanos, como representantes de entidades civis e uma turma de alunos de uma escola estadual de Taboão da Serra, que vieram para o debate por iniciativa pessoal de sua professora.

Na mesa, especialistas abordaram os desafios para acolher, integrar e propiciar a inserção social e econômica dos estrangeiros que chegam ao país.  

Na sua fala, Andrés Ramirez, representante da Agência da ONU para Refugiados (Acnur) no Brasil, traçou um panorama da situação no mundo, enfatizando que dos dez países  de onde mais saíram refugiados, seis estão na África. Ramirez destacou ainda que nos últimos anos aconteceram duas novidades que afetaram o fluxo migratório mundial: a tragédia humanitária na Síria e a primeira guerra na Europa desde os anos 1990, no leste da Ucrânia, que fez com que a Rússia se tornasse o país que mais recebeu solicitações de refúgio em 2014.

Além disso, desfez alguns mitos: entre eles, a percepção de que refugiados buscam nações mais desenvolvidas para se fixarem. “No caso da África, a imensa maioria dos refugiados fica no continente. No geral, em 2014, 86% dos refugiados do mundo foram acolhidos por países em desenvolvimento e, dentro disso, 25% estão nos países mais pobres”, explicou o representante da Acnur.

Por sua vez, Beto Vasconcelos, secretário Nacional de Justiça e presidente do Conselho Nacional para Refugiados (Conare), abordou a questão da legislação brasileira para imigração e refúgio, ainda uma herança da ditadura militar, que está defasada, e encara a questão pela perspectiva da ameaça à segurança nacional.

“Nosso desafio é criar uma legislação que preveja direitos e garantias aos imigrantes. Uma lei aberta e transparente que permita mecanismos de regularização e documentação, e aborde princípios de políticas públicas para acolhimento, assistência e inserção social e econômica. Flexível ao ponto de que a migração de estudantes e pesquisadores seja feita de forma mais fácil. Que estabeleça uma política de vistos e residências mais ampla e, principalmente, que determine mecanismos de acolhimento humanitário”, enfatizou.

Porteira fechada – Já Juana Kweitel, diretora de Programas da Conectas (organização não governamental internacional de direitos humanos), narrou sua experiência pessoal como imigrante e a demora de onze anos para regularizar sua residência permanente. “O Brasil é um país de coração aberto e uma portaria muito fechada”, resumiu a argentina. E surpreendeu ao afirmar, ao contrário do senso comum, que o Brasil possui um número relativamente pequeno de imigrantes. “Existem muito descendentes. Porém, os imigrantes de fato correspondem a apenas 1% da população. Na Argentina, o percentual é de 5%.” Atualmente, a diretora da Conectas trabalha na defesa de um projeto de lei que descriminaliza a imigração e no combate à xenofobia. “Não quero ter de discutir estes assuntos após acontecer uma morte”, finalizou.

Por fim, Paulo Illes, coordenador de Políticas para Migrantes da Secretaria de Direitos Humanos e Cidadania da Prefeitura de São Paulo, abordou as políticas públicas que a capital paulista mantém para os imigrantes e cobrou que outras cidades façam o mesmo. “São Paulo, pela sensibilidade do prefeito Haddad, foi o primeiro munícipio a criar uma política de imigração. Isso no âmbito da Secretaria de Direitos Humanos, o que rompe com a lógica de ver o imigrante como ameaça, uma questão de segurança.”

Encerradas as falas dos integrantes da mesa, o embaixador do Haiti no Brasil, Madsen Chérubin, que assistiu ao debate da plateia, solicitou a palavra para agradecer a acolhida dos brasileiros após o terremoto que devastou o país em 2010. O secretário de Direito Humanos e Cidadania de São Paulo, Eduardo Suplicy, também participou do seminário e condenou o atentado contra seis haitianos no centro da capital paulista.


Felipe Rousselet – 27/8/2015
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