São Paulo - Durante os debates do Encontro do Macrossetor – Comércio, Serviços e Logística, realizado pela CUT (Central Única dos Trabalhadores) nos dias 12 e 13 de março, o doutor em Economia e professor da PUC-SP Antonio Corrêa de Lacerda apresentou dados que desmentem suposto cenário de estagnação da economia brasileira.
Antonio Corrêa de Lacerda foi presidente do Conselho Regional de Economia (Corecon-SP) e do Conselho Federal de Economia (Cofecon). É autor de vários livros, como Economia Brasileira (Saraiva), e foi um dos ganhadores do Premio Jabuti, na área de economia, com o livro Desnacionalização (Contexto), em 2001. Ele também escreve artigos para jornais, revistas e sites especializados.
Ele defendeu a política de queda da taxa básica de juros, promovida pelo Banco Central, e a desvalorização cambial como importantes aliados no desenvolvimento da indústria nacional, que ainda não cresce como deveria. Nesta entrevista ao Sindicato, o economista aponta os acertos da política econômica do governo e os principais desafios do país. Confira.
A partir de 2007/2008, anos da crise, os principais países do mundo diminuíram suas taxas básicas de juros a quase 0% ao ano. No mesmo período, o Brasil tinha uma das taxas mais altas do mundo, chegando a 13,8% a.a, em 2008. Assim, o país atraiu capital especulativo e a entrada de dólar valorizou o Real. Mas o governo reagiu e iniciou ciclo de redução da Selic. Qual a importância desse ciclo e seu impacto na taxa de câmbio, principalmente em cenário no qual os outros países têm taxas tão baixas?
A crise internacional a partir de 2008 levou os bancos centrais dos EUA, Zona do Euro, Reino Unido e Japão, a movimento sincronizado de redução a praticamente zero as suas taxas de juros nominais, quadro que deverá perdurar enquanto a crise não for superada. Foi nesse cenário que o BC brasileiro, em meados de 2011, iniciou gradual e bem sucedida redução das taxas de juros básicas, e empurrando os juros reais a atingissem o nível vigente inferior a de 2% ao ano, inédito na nossa história. O segundo fator importante foi a correção na taxa de câmbio, que deslocou-se de uma faixa de R$ 1,60/1,70, para uma próxima de R$ 2,00, o que representa ganho de competitividade para os produtores brasileiros.
Qual a importância da redução das taxas de juros para a maior capacidade de investimento do governo?
O longo período de inflação crônica, seguido de taxas de juros reais excessivamente elevadas, inibiu o risco e premiou as aplicações financeiras de curto prazo. O mercado brasileiro foi, durante anos a fio, um dos poucos no mundo, para não dizer o único, que propiciava o trinômio: liquidez, segurança e rentabilidade.
Tratava-se de anomalia. Geralmente, quem quer liquidez nas suas aplicações abre mão da rentabilidade, que costuma ser inversamente proporcional ao risco da operação. Os títulos públicos brasileiros propiciaram longos anos de vida fácil aos seus credores. Nesse interregno, os fundamentos macroeconômicos da nossa economia mudaram substancialmente para melhor, a ponto de o país ter sido promovido a “grau de investimento” por importantes empresas classificadoras de risco, já a partir de 2008. Não obstante essas mudanças, o custo de financiamento da dívida pública brasileira absorvia 5 a 6% do PIB ao ano. Com a queda dos juros, gradualmente haverá redução desse custo, liberando recursos advindos da menor necessidade de superávit fiscal primário excessivamente elevado.
Qual a importância da redução dos juros bancários para o crescimento da economia?
A queda dos juros fará despertar, como já vem ocorrendo, o interesse dos gestores de fundos de investimentos para projetos, devendo consolidar-se como a formação de mercado privado de financiamento de longo prazo. Trata-se de mudança estrutural importante para a criação de alternativas de financiamento da infraestrutura, ampliação da capacidade produtiva e mercado imobiliário, assim como para fortalecer o mercado de capitais. A criação de instrumentos como os FIPs (Fundos de Investimento em Participações), as debêntures dedicadas e os benefícios tributários para os Fundos de Investimentos de Direito Creditório (FIDCs) também representam passo importante na consolidação desse mercado.
Os bancos públicos – BNDES, Caixa Federal e Banco do Brasil - têm papel relevante para o financiamento do desenvolvimento brasileiro. No entanto, apesar dos esforços, os recursos disponíveis são insuficientes para fazer frente às crescentes demandas. Daí o papel complementar dos instrumentos privados de financiamento.
O senhor falou que a queda do desemprego foi importante na história recente do país, mas que o grande desafio seria melhorar a qualidade do trabalho e evitar sua precarização. Isso pode se traduzir em evitar a terceirização?
O desemprego, que se tornou um drama para a imensa maioria dos países do G-20, nos últimos anos pós-crise, reduziu-se no Brasil a 4,6% da População Econômica Ativa brasileira, conforme o IBGE. Em 2012, o saldo líquido de empregos formais gerados atingiu mais de um milhão de postos de trabalho, considerando os dados do Caged. A massa salarial real deve crescer pelo nono ano consecutivo a uma média anual superior a 4%. No último decênio, cerca de 40 milhões de pessoas ascenderam à classe C, a população de classe média brasileira, que já representa mais da metade do total, segundo estudos divulgados pelo Ipea.
No entanto, grande parte dos empregos gerados ainda são de baixa renda. Temos de evitar a precarização do mercado de trabalho. É claro que, para consolidar e ampliar o movimento em curso, o crescimento econômico é condição necessária, embora não suficiente. É, pois, muito importante restabelecer as condições para crescimento mais robusto e sustentado da economia, assim como é imprescindível aprimorar as políticas sociais para universalizar os progressos em curso. O principal é que, levando-se em conta o quadro apresentado, o baixo crescimento do PIB em 2012 está longe de poder ser considerado uma derrota.
O senhor também falou que o Brasil tem grande potencial de crescimento. Que fatores o levam a afirmar isso? Por fim, quais as perspectivas da economia para 2013?
A divulgação do crescimento de apenas 0,9% do PIB brasileiro de 2012 embora já esperado, tem suscitado dúvidas quanto a um melhor desempenho este ano. O fato é que uma série de fatores adversos afetaram negativamente o resultado do ano passado e não deverá se repetir em 2013.
Houve confluência de desempenhos negativos na indústria (-0,8% e na agricultura, -2,3% e queda de 4% nos investimentos) que afetaram o desempenho total, que, só não foi pior, devido ao crescimento observado de 1,7% nos serviços, 3,2% no consumo do governo e 3,1% no consumo das famílias.
É natural que haja certa insegurança ao desempenho futuro da economia, a partir do quadro passado. Mas há aspectos que nos permitem prognosticar desempenho melhor em 2013.
Dentre as principais modificações do cenário macroeconômico, temos a expressiva queda na taxa de juros e a correção na taxa de cambio.
Tem sido muito positiva a atuação das áreas econômicas do governo federal (Ministérios da Fazenda, Indústria e Comércio e Banco Central) para quebrar o paradigma que nos impôs uma taxa de juros real excessivamente elevada nas últimas duas décadas, e longo período de valorização cambial. Mais do que os níveis em si, de recorde de baixa nos juros reais e a desvalorização da taxa de cambio, há que se ressaltar a mudança de postura, a partir do reconhecimento de que representam um problema e que estão predispostos a corrigi-lo.
Outro ponto significativo está no esforço de redução do “custo Brasil”, especialmente pelas ações em curso na diminuição dos custos de energia, na desoneração tributária, onde há espaço para ações para fazê-la nos investimentos.
Todos os fatores macro e micro econômicos em tela, juntamente com um maior ativismo nas políticas industrial, comercial, ciência e tecnologia caminham no sentido de ampliar a competitividade da produção brasileira, seja na concorrência com os importados, ou ainda para ganhar espaços nas exportações.
Linha fina
Para economista, houve uma mudança de rota na política econômica, com a queda da Selic e a desvalorização cambial. Além disso, Antonio Lacerda ressalta “mudanças expressivas” nas condições de competitividade que já começam a fazer efeito
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