Brasília - Três meses após a revogação da lista suja pelo ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), o governo federal anunciou, nesta terça-feira 31, a edição de uma nova portaria interministerial que recria o cadastro de empregadores flagrados com mão de obra análoga à de escravo. Para isso, usou a Lei de Acesso à Informação como amparo legal.
A nova portaria, redigida pelo Ministério do Trabalho e pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH) com auxílio da Advocacia Geral da União (AGU), busca esclarecer um dos principais argumentos utilizados por Lewandowski para embasar sua decisão: a de que a portaria anterior, agora revogada, não explicitava procedimentos e instâncias a serem acionados pelos advogados de um empregador acusado por trabalho escravo, o que violaria seu direito à ampla defesa.
“A nova portaria moderniza e agiliza a tramitação do processo sobre trabalho escravo. Não alteramos o conteúdo, mas facilitamos para que não haja dúvida quanto à validade e à legalidade dos processos”, explicou Dias. A ministra Ideli também enfatizou que não foi modificado, em essência, o que já vinha sendo feito. “Trata-se de uma portaria de aperfeiçoamento”, disse.
Para se antecipar eventuais críticas sobre o relançamento da lista suja, o texto cita a Lei de Acesso a Informação (LAI) como amparo legal para que a sociedade saiba os nomes dos empregadores cujos processos sobre trabalho escravo tenham transitado administrativamente em primeira e segunda instâncias.
Foi com base na LAI que a Repórter Brasil em conjunto com o Blog do Sakamoto tiveram acesso aos nomes dos empregadores que foram flagrados com trabalho escravo pelo MTE e divulgou, há cerca de um mês, uma lista similar àquela vetada por Lewandowski. A ministra reconheceu publicamente em seu discurso a iniciativa.
O retorno da lista suja foi celebrado por quem acompanhou a cerimônia de lançamento da nova portaria, realizada na sede da SDH, em Brasília. O especialista em saúde do trabalhador Sílvio Brasil, que está assumindo a secretaria executiva da Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae), aponta que o novo texto oferece menos brechas a empresas que buscam liminares na Justiça contra sua inclusão na lista.
Luiz Machado, coordenador do programa de combate ao trabalho escravo da Organização Internacional do Trabalho (OIT) no Brasil, destacou que a relação de empregadores é um dos mais importantes instrumentos existentes no país para combater o problema, inclusive com reconhecimento internacional das Nações Unidas.
“A assinatura da nova portaria reforça o compromisso do governo brasileiro na erradicação do trabalho escravo no Brasil, um país que já é referência internacional no assunto. Trata-se de um mecanismo que publiciza o ato administrativo e ajuda a promover ações de responsabilidade social empresarial, garantindo sustentabilidade em cadeias globais de fornecimento e produção”, disse Machado.
Após a cerimônia de assinatura, a nova portaria foi encaminhada para publicação no Diário Oficial da União, o que deve ocorrer nesta quarta-feira 1. A partir de então, o MTE elaborará a nova lista que será divulgada.
Estima-se que ela conterá pouco mais de 400 nomes de empregadores flagrados por trabalho escravo e que tiveram suas autuações confirmadas após defesa administrativa em primeira e segunda instâncias entre dezembro de 2012 e dezembro de 2014. Deve haver pouca ou nenhuma diferença com relação à lista obtida pela Repórter Brasil junto ao MTE através da LAI e já divulgada.
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Marcel Gomes, com colaboração de Leonardo Sakamoto, e edição da Redação - 31/3/2015
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Usando Lei de Acesso à Informação como amparo legal, portaria recria o cadastro de empregadores flagrados mantendo trabalhadores em condições precárias
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