São Paulo – O professor do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho (Cesit), José Dari Krein, explica como a sonegação de empresas afeta a receita da Previdência e o financiamento a benefícios. Ele afirma que entre os maiores fatores de sonegação estão o trabalho assalariado sem carteira assinada, os chamados pagamentos "por fora" e os acidentes de trabalho cadastrados como doença comum.
Em entrevista à Rádio Brasil Atual, na quinta 16, o professor conta que os dados apontam que a discussão da reforma da Previdência "é muito maior que um problema técnico", mas envolve uma "discussão ideológica".
Segundo Dari Krein, se houvesse mais penas duras aos sonegadores e maior fiscalização o superávit da Previdência seria maior. "Há outras formas de financiar a Previdência sem precisar dessa reforma que retira direitos", diz.
Leia um trecho da entrevista:
A sonegação não é combatida no Brasil?
Os dados mostram que a discussão da reforma da Previdência é muito mais do que um problema técnico. (A reforma) é uma discussão ideológica de querer abrir espaço para o setor privado.
Os números mostram que se o governo colocar o dinheiro previsto para a Previdência e considerar que a Constituição assegura a seguridade social como política pública, vamos perceber que não há déficit, pelo contrário, há um superávit. Esses valores poderiam aumentar mais se os débitos das empresas fossem cobrados, pois já passam de bilhões de reais não pagos ao fundo público.
Se houvesse penas mais duras e maior fiscalização às empresas, significaria um volume de R$ 60 bilhões por ano. Portanto, há outras formas de financiar a Previdência sem precisar dessa reforma que retira direitos.
No seu artigo, você cita cinco situações em que a Previdência Social é sonegada. Uma delas é o trabalho assalariado sem carteira assinada. Quais são as outras?
As situações mais determinantes são as dívidas das empresas, questão do trabalhador sem ter a carteira assinada e o controle da acidentalidade no ambiente de trabalho, ou seja, se você tivesse mecanismos que combatessem os acidentes e doenças nos ambientes de trabalho nas empresas, evitaria que pessoas ficassem afastadas, recebendo um seguro saúde para continuar vivendo.
Esse terceiro tópico é uma situação que precisa avançar muito, com mais fiscalização, combatendo as formas predatórias de trabalho na sociedade. Nós somos o maior país do mundo que provoca acidentes de trabalho.
A questão demográfica é a justificativa para os ataques à Previdência.
É verdade que temos uma mudança no perfil demográfico e a população está envelhecendo, mesmo assim nós temos a chamada janela demográfica. Então até 2030, se continuarmos incorporando as pessoas no mercado de trabalho, nós temos a possibilidade de resolver a questão de forma tranquila, pois daria a possibilidade do país desenvolver outro patamar de riqueza nacional.
Tem uma outra questão que é mais importante. Se nós olharmos, hoje, você tem avanços na produtividade com inovações tecnológicas que substituem os trabalhadores por máquinas. Por que essa substituição e esses ganhos não são revertidos a favor da sociedade, permitindo que as pessoas trabalhem menos na vida.
Sobre a sonegação e os débitos previdenciários. A PEC da reforma é extensa, mas mira na restrição do acesso à aposentadoria, e não toca nesses pontos. Quais mecanismos poderíamos aprimorar para combater a sonegação?
Na minha opinião é fundamental ter regras claras e uma ação decisiva do Estado para que a lei seja cumprida. Ou seja, é preciso ter fiscal e penalização financeira aos agentes econômicos que não cumprem a lei. Por exemplo, não sonegar a carteira de trabalho é sonegar um direito da pessoa, ou não recolher o dinheiro da Previdência é sonegar o direito da sociedade de estruturar uma Previdência pública.
Em outros países há legislações mais duras para os sonegadores. Aqui há um certo estímulo de continuar sonegando, porque as possibilidades de ser pego são pequenas, e quando é pego as multas não são expressivas. A única forma é combater é ter mais fiscalização, portanto, ter mais Estado. Entretanto, nós vemos atualmente um desmonte do Estado, o que estimula a fraude.