
O “emprego CLT” está sendo usado com conotação ofensiva entre crianças e adolescentes. Para muitos deles, trabalhar com a carteira assinada é sinônimo de fracasso, ou “coisa de pobre”.
É o que relatam mães e educadoras nas redes sociais. Elas contam já terem visto crianças se referindo à sigla CLT no intuito de insultar.
“Eu já tinha percebido aqui em casa, quando a gente fala alguma coisa, a Valentina fala 'ai, aí vira um CLT'. Eu perguntei o que é ser CLT, que vocês tem tanto medo?”, relata uma mãe, em um vídeo no TikTok. Nisso, a menina responde, no mesmo vídeo: “é ter de andar de ônibus (...) muita gente, chefe, pessoa mandando.” A mãe, então, complementa: “eles acham que CLT é coisa de pobre.”
O caso não é isolado. Nas redes sociais, há outros relatos de pessoas que já ouviram crianças usando a sigla CLT para ofender.
“Minha filha de 10 anos e suas amiguinhas chamam uma a outra de CLT em tom de deboche”, contou uma pessoa no X.
“Meu filho de 14 anos e os amigos estão nessa. Querem trabalhar por conta própria, empreender e investir”, relatou outra mãe.
“Só o empreendedorismo para nos salvar da CLT. Viva o liberalismo e abaixo a CLT fascista, logo, esquerdista”, cravou outro, ignorando que o fascismo é uma ideologia de extrema-direita.
“Mas as crianças fazem piada com CLT mesmo. Eu já vi. Infelizmente essa onda de piadas pode resultar em perdas de direitos essenciais”, avalia outra.
“Essa visão negativa do contrato CLT – que prevê uma série de direitos e garantias – é um reflexo da perspectiva neoliberal que está baseando a reforma educacional do novo ensino médio. Um projeto que visa formar, desde a infância, trabalhadores precarizados com a embalagem de 'empreendedores', e incentiva-los a se virar por conta própria, sem direitos e sem organização coletiva. Um projeto que está forçando a próxima geração a aceitar o contrato PJ, um regime de trabalho que não garante nenhum direito e que, por meio da precarização e da individualização do trabalho, resultará na fragmentação e no enfraquecimento cada vez maiores da classe trabalhadora.”
Neiva Ribeiro, presidenta do Sindicato dos Bancários de São Paulo
O que é CLT?
CLT significa Consolidação das Leis do Trabalho. É a principal legislação trabalhista do Brasil, criada em 1943, que regula as relações de trabalho entre empregadores e empregados sob o regime formal.
Um contrato de trabalho regido pela CLT oferece diversas vantagens, tanto para o empregado quanto para o empregador. Algumas das principais incluem:
- Proteção Legal: A CLT estabelece direitos e deveres claros para ambas as partes, garantindo proteção ao trabalhador em questões como salário, jornada de trabalho e condições de trabalho;
- Estabilidade: Os trabalhadores têm direito a certas garantias, como aviso prévio, férias remuneradas e 13º salário, que proporcionam maior segurança financeira;
- Benefícios: Os empregados têm acesso a benefícios como vale-transporte, vale-alimentação e assistência médica, conforme acordos e convenções coletivas;
- Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS): O empregador é obrigado a depositar mensalmente um percentual do salário do empregado em uma conta do FGTS, que pode ser usado em situações específicas, como demissão sem justa causa ou aquisição de imóvel;
- Jornada de Trabalho Regulamentada: A CLT define a carga horária máxima de trabalho e regulamenta horas extras, assegurando que os empregados não sejam sobrecarregados;
- Direitos Trabalhistas: Os trabalhadores têm garantidos direitos como licença-maternidade e licença-paternidade, além de proteção contra demissões arbitrárias;
- Acesso à Justiça: A CLT prevê mecanismos para que os trabalhadores possam reivindicar seus direitos em tribunais trabalhistas, tornando o processo de resolução de conflitos mais acessível
- Segurança Social: Os trabalhadores com contrato CLT têm direito a benefícios da Previdência Social, como aposentadoria, pensão por morte e auxílio-doença.
O que é contrato PJ?
Um contrato PJ (Pessoa Jurídica) é um tipo de contrato de prestação de serviços onde uma empresa ou profissional registrado como empresa (geralmente um MEI, EIRELI, ou LTDA) é contratado para prestar serviços a outra empresa, sem vínculo empregatício direto, como ocorre na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho).
Características do regime PJ
- Sem 13º salário, FGTS, licença-maternidade, seguro-desemprego, férias remuneradas e outros direitos trabalhistas;
- Sem proteção em caso de demissão – não há multa rescisória em caso de demissão – o que significa mais instabilidade no emprego e menos segurança financeira se o trabalhador for dispensado;
- O empregado paga seus próprios impostos (como MEI, Simples Nacional etc.);
- Precisa emitir nota fiscal;
- Pode ganhar mais do que ganharia como CLT (em teoria);
- Muitas empresas exigem subordinação, cumprimento de horário fixo e exclusividade, o que pode ser caracterizado como vínculo empregatício disfarçado.
“O regime CLT é mais seguro, estável e garante mais direitos. A luta principal do Sindicato é o aumento salarial por meio das negociações coletivas. Já obtivemos 22,3% de aumento real para a categoria bancária desde 2004, além da conquista de uma série de outros direitos históricos, que nos levaram à condição de ‘CLT premium’. Resultado de uma luta que só é possível porque somos uma categoria organizada de trabalhadores sob o regime CLT. Uma realidade que estará ameaçada se de fato prevalecer a visão que exalta a precarização do trabalho disfarçada de ‘empreendedorismo’, e demoniza o emprego com carteira assinada”, afirma Neiva.
