Jair Bolsonaro anunciou que vai reduzir em 90% as Normas Regulamentadoras, as (NRs) de segurança e saúde no trabalho, usando o argumento de que “há altos custos do emprego no Brasil em função de uma normatização absolutamente bizantina, anacrônica e hostil”.
O anúncio foi feito na segunda-feira 13, nas redes sociais. Ainda segundo Bolsonaro, o pacote de revisão que deve ser entregue em junho, vai modernizar as normas, simplificar e desburocratizar as regras atuais, agilizando a geração de empregos.
“O fim das NRs é dar fim a todas as garantias da saúde do trabalhador. As NRs têm como objetivo o equilíbrio e a defesa dos mais fracos na relação de trabalho. A ideia do governo é de proteger as empresas legalizando os acidentes de trabalho e, de forma descartável, o ser humano. Uma verdadeira atrocidade para os trabalhadores. É um governo insano, com gente despreparada e desqualificada. Isso atinge todos os trabalhadores até mesmo aqueles que os elegeram”, critica Carlos Damarindo, secretário de Saúde do Sindicato.
Essa é a segunda ofensiva governista para atender ao lobby de um setor atrasado do empresariado. Na Medida Provisória 871 – chamada de "MP do pente-fino" do INSS, que está em discussão no Congresso – havia um dispositivo que previa descaracterização dos acidentes ocorridos no trajeto casa-trabalho como acidentes de trabalho. Após pressões, o item foi retirado.
> Governo tenta, mas não consegue descaracterizar acidente de trajeto
Regulamentação de maquinário
A primeira norma a ser revista, segundo o secretário-especial de Trabalho e Previdência do Ministério da Economia, Rogério Marinho, será a NR-12 - que trata da regulamentação de maquinário, abrangendo desde padarias até fornos siderúrgicos.
O anúncio acendeu uma luz e preocupa o Ministério do Público do Trabalho (MPT), médicos que atuam na área e o ex-ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho que sabem da importância da maioria dessas normas para a saúde e a segurança do trabalhador que, mesmo com as normas, continuam sofrendo acidentes graves, fatais e incapacitantes nos ambientes de trabalho.
Marinho também vê a medida com preocupação, especialmente porque Bolsonaro não demonstra qualquer interesse em atuar para melhorar as condições de vida da classe trabalhadora. “Muito pelo contrário, tudo ele fez até agora foi contra os trabalhadores”, diz o ex-ministro ao Portal CUT.
O médico do Trabalho, Paulo Kaufmann, disse a repórter Cláudia Motta, da RBA, que é incrível a capacidade desse governo de buscar medidas que seriam polêmicas, se não fossem trágicas e lembrou que o Brasil segue campeão de acidentes de trabalhos.
“Os acidentes com máquinas continuam amputando mãos, dedos, ceifando vidas. Se diminuir ainda mais a abrangência e exigência será um desastre, é estímulo ao crime, a garantir mais produtividade, mais lucro a custa, literalmente, do sangue, da carne dos trabalhadores.”
Acidentes mais comuns
O médico explica que as NRs são regulamentadas por decreto e nem precisam passar pelo Congresso Nacional. São normas que regulamentam artigos da CLT, criadas pela portaria 3.214 de 1978.
Kaufmann comenta a menção de Bolsonaro à NR 12, como a primeira a ser revista. “Essa NR, por exemplo, sempre sofreu críticas de setores empresarias, desde seu nascedouro. Como ela é bastante exigente, algumas das regras seriam, segundo eles, custosas e inviabilizariam a produção em algumas indústrias”, explica. “Mas o fato é que, com a quantidade de acidentes, amputações, esmagamentos, mortes eram necessárias regras mais rígidas. Se a NR12 poderia merecer alguma flexibilização, não parece ser o sentido geral de mais essa ameaça do presidente.”
O médico prevê que o governo comprará uma briga com setores técnicos, auditores, com o movimento sindical. E lembra que, por trás dessa fala de Bolsonaro, há todo o desmanche, a falta de recursos nas estruturas do governo e a crítica expressa à própria fiscalização da segurança do trabalho. “Há uma série de ações que começaram no governo anterior, como a reforma trabalhista”, critica.
Para lidar com esse quadro, Kaufmann sugere estudar item por item e fazer diferente do que foi feito nos últimos anos. “Temos de sair das mesas de negociação e voltar finalmente para os locais de trabalho, conversar com a base de trabalhadores”, afirma. “Revalorizar as Cipas (Comissões Internas de Prevenção a Acidentes) e mobilizar de baixo para cima. Um novo sindicalismo que reaja a essas ações e reverta o máximo possível para que possamos voltar a representar mais os direitos e interesses e necessidades dos trabalhadores.”