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Bancária doente de tanto trabalhar é demitida

Linha fina
“Não vale a pena fazer isso por nenhuma empresa, a saúde vem sempre em primeiro lugar”, aconselha ex-funcionária da Ourinvest, que a demitiu em período de estabilidade; Sindicato vai denunciar o banco
Imagem Destaque
São Paulo – O Sindicato recebeu mais um caso de bancário demitido após ficar doente de tanto trabalhar para o banco. Desta vez a empresa envolvida é a Ourinvest. A instituição financeira mandou embora uma funcionária que estava voltando de afastamento médico e ainda se encontrava em período de estabilidade. Essa condição impede o desligamento do empregado.

O trabalho de Alice [nome fictício] consistia em visitar diversas prefeituras do estado do Rio de Janeiro para vender regimes próprios de previdência aos municípios. Era comum passar mais de 11 horas na estrada, percorrendo 800 quilômetros em um único dia e visitando cerca de 70 cidades por semana.  Embora Alice fosse lotada no Rio, ela pertence à base do Sindicato, pois a Ourinvest não possui sede naquele estado.

Essa rotina massacrante levou-a a desenvolver graves lesões, mas ela continuou trabalhando até que o problema se agravou de vez. No dia 28 de dezembro, em uma das crises que a levou ao hospital, o médico entregou atestado recomendando afastamento por duas semanas.

“Eu sabia que tinha de parar, mas os resultados tinham que ser entregues, a pressão era muito grande.”

No dia 4 de janeiro, outra crise. Tão forte que a dose de remédio à base de morfina aplicada para esconder a dor quase provocou uma parada cardíaca. “Minha pressão chegou a 4 por 2. Entrei de cadeira de rodas no hospital.” O ortopedista mandou-a fazer perícia no INSS e deu atestado de 90 dias, informações enviadas no mesmo dia à chefia, com a solicitação do documento chamado DUT (data do último dia trabalhado), exigido pelo INSS. Foi quando ela viu que seu e-mail corporativo já havia sido cancelado. Procurou o banco e foi informada que os funcionários da sua área estavam proibidos de contatá-la e que tudo seria tratado via RH.  

“Me senti discriminada, marginalizada como se ficar doente fosse um crime hediondo. Pedi a CAT [Comunicação de Acidente de Trabalho que reconhece o acidente ou doença ocupacional e deve ser emitida pela empresa] e eles obviamente se negaram a dar.”

Em fevereiro, a perícia do INSS comprovou a doença da bancária e concedeu 90 dias de afastamento pagando seu salário. Nesse período, a Ourinvest não depositou o fundo de garantia. Ela cobrou do banco e não obteve resposta, mas recebeu e-mail solicitando exames e o laudo pericial do INSS. Agendou para 12 de maio – três dias antes do período de afastamento terminar – exame com um médico contratado pelo banco. Foi considerada apta para o trabalho, com ressalvas, mas o banco não a chamou de volta. Por e-mail, sua chefe pediu para que ficasse em casa estudando para o exame da certificação Anbima, que estava para vencer.

Em 9 de junho essa gestora telefonou pedindo para lhe fazer uma visita. “Foi a primeira vez nesse tempo todo. Nunca me telefonou para perguntar se estava bem, se estava viva. Desenvolvi uma depressão por conta desse tratamento que recebi do banco”, conta Alice.

No dia seguinte, a chefe bate à porta junto com uma funcionária do RH e a demite alegando redução de custos e falta de resultados. “Foi tudo premeditado, uma total falta de respeito. Eles não podiam me desligar porque eu estava em estabilidade. Não assinei nada e disse ‘agora sim vou procurar o sindicato para fazer valer meus direitos’. A lei garante que eu seja reintegrada e não há nenhum juiz que não vá decidir isso”, afirma.

O Sindicato tentou uma reconciliação com o banco, que se mostrou irredutível. “Esse caso é um fato raro. Em todos esses anos o Sindicato desconhece uma postura tão arbitrária e desrespeitosa como essa”, ressalta a secretária-geral do Sindicato Ivone Silva. “Vamos denunciar essa postura.”

Para Alice, agora restam problemas de saúde e mágoa, mas também o sentimento de justiça. “Não foi só minha saúde física que foi embora, foi a emocional. Hoje vivo à base de remédios, não posso mais dirigir. Eu amava aquele banco e não tive reconhecimento. Serviu de lição. Não vale a pena fazer isso com sua saúde por nenhuma empresa. A saúde vem sempre em primeiro lugar. Agora vou lutar pelos meus direitos. E não quero nada além daquilo que a lei diz que tenho direito.”


Rodolfo Wrolli – 24/6/2015
 
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