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Campanha 2018

Mulheres na liderança: 'Isso vai deixar de ser ponto fora da curva'

Linha fina
Bancários entregam reivindicações por empregos e direitos. Defesa da democracia e da soberania também marcam campanha que envolve meio milhão de trabalhadores. Liderança do comando nacional é feminina
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Foto: Seeb-ABC

O Comando Nacional dos Bancários entregou nesta quarta-feira 13 à Federação Nacional dos Bancos (Fenaban) documentos com as demandas da categoria para renovação da convenção coletiva nacional de trabalho, válida para os 485 mil profissionais do setor em todo o país. As reivindicações foram objeto de consulta com participação de mais de 35 mil pessoas nos locais de trabalho e ratificadas em conferências estaduais e nacional.

Faça a sua sindicalização e fortaleça a luta em defesa dos direitos dos bancários

A valorização salarial e da participação nos lucros ou resultados, a garantia contra demissões em massa e política de expansão dos atendimentos e criação de novos empregos, compartilhamento dos ganhos com investimentos em tecnologia na forma de melhores condições de trabalho e de atendimento, manutenção das cláusulas da atual convenção coletiva enquanto se desenrolarem as negociações e universalização de tudo que for negociado entre todos os bancários – sem fragmentação da categoria para negociação em separado – estão entre as prioridades da campanha nacional.

> Pauta de reivindicações dos bancários já está com os bancos

Também na consulta, segundo a Confederação Nacional dos Trabalhadores no Ramo Financeiro (Contraf-CUT), 60% dos bancários afirmaram defender uma possível greve caso os bancos dificultem as negociações. O cenário político também foi tema da consulta, que revelou que 79% não pretendem votar em candidatos que aprovaram a reforma trabalhista, que revelou-se um fracasso na criação de empregos e ainda proporcionou a expansão do trabalho precário e com menor remuneração.

Pela primeira vez desde 1992, ano da primeira convenção coletiva nacional, o comando é coordenado por duas mulheres: Ivone Silva, presidenta do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região, e Juvandia Moreira, presidenta da Contraf-CUT. Em entrevista à RBA, elas afirmam que o “fenômeno” é de certa forma observado com atenção porque ainda se vive numa sociedade muito influenciada por cultura machista.

Mas asseguram que há muito tempo o movimento sindical bancário tem em sua agenda a questão da igualdade de oportunidades e do empoderamento feminino. Com isso, a mesa de negociação já trata as representantes com respeito e uma naturalidade acima da média. “Sempre fomos respeitadas como dirigentes de uma categoria importante, que por sua vez sempre se destacou pela presença de mulheres em cargos de poder”, diz Ivone.

O comando nacional é integrado por presidentes de 10 federações, 24 sindicatos, Contraf-CUT, mais os representantes dos trabalhadores de quatro bancos federais. Nove desses 33 integrantes são mulheres, todas presidentas em suas entidades. O próprio presidente da Fenaban, Murilo Portugal, admite que a negociação flui melhor sob o protagonismo das mulheres: elas são mais decididas. A primeira rodada de negociação está marcada para 28 de junho.

O fato de pela primeira vez duas mulheres coordenarem negociações que têm forte repercussão no mundo do trabalho e na sociedade causa alguma expressão de preconceito na mesa?

Ivone Silva – Nunca senti demonstração de preconceito. Sempre fomos respeitadas como dirigentes de uma categoria importante, que por sua vez sempre se destacou pela presença de mulheres em cargos executivos, seja na presidência ou em outras posições importantes, como secretaria-geral, de finanças, entre outras.

Juvandia Moreira – Quando assumi a presidência do Sindicato dos Bancários de São Paulo (em 2010), foi a primeira vez que uma mulher esteve também na coordenação do comando nacional. Na ocasião, também os bancos estavam ampliando a presença de mulheres na mesa de negociação.

Essa mudança do nosso lado também foi acompanhada do lado de lá. Santander tem uma mulher presente, o Bradesco também nomeou uma diretora executiva. Isso foi evidenciado como uma preocupação. Quando não tinham mulheres no primeiro escalão, ia alguém do segundo. Acho que agora, mais do que nunca, essa preocupação está presente.

Adriana (Rio), Aline (SP), Eliana e Magaly (MG), Suzineide (PE), Ana Stela (Campinas): empoderadas

 

A presença feminina vem crescendo?

Ivone – Sim. Nosso sindicato já vinha trilhando esse caminho.

Juvandia – As federações estaduais de São Paulo (Aline Molina) e de Minas Gerais (Magaly Fagundes) também são presididas por mulheres. As presidentas dos sindicatos do Rio de Janeiro (Adriana Nalesso), Belo Horizonte (Eliana Brasil), Pernambuco (Suzineide Rodrigues), Campinas (Ana Stela Alves de Lima) também estão nesta mesa. Até mesmo dentro do movimento essa condição já é respeitada há muito tempo.

Ivone – É claro que existe uma ou outra diferenciação no tratamento, até porque vivemos numa sociedade ainda machista. Por exemplo, as pessoas querem saber com quem você anda. Se uma mulher participa de muito compromisso ao lado de homens, alguns vão inferir que o homem é que manda; se é homem com outro homem, então ninguém manda nele. Então, não dá para dizer que dentro do movimento sindical não existe resquício de machismo.

Mas à medida que fomos introduzindo em nossa cultura, lá atrás, a questão da igualdade de gênero e do empoderamento feminino em cursos, reuniões, debates, negociações, esse preconceito foi ficando mais distante. Ainda tem, mas todos os dias a gente avança um passinho rumo a uma situação de mais respeito, não só entre os homens, mas também entre as mulheres que ainda padecem de uma cultura machista, porque são criadas e vivem numa sociedade machista.

Juvandia – A gente disputa espaço e isso vai se tornando algo natural. Não era, nem aqui nem no mundo desenvolvido, onde quem não pode se superar com as ideias, disputa o controle na base da força bruta. A desconstrução desses valores ultrapassados e a construção de valores de igualdade e respeito, inclusive dentro do movimento sindical, são parte de um mesmo desafio.

No nosso caso, esse machismo está cada vez menos presente, aparece muito delicadamente. Até porque já lideramos inúmeras campanhas com excelentes resultados. O mundo tem de ir se acostumando com isso, e as mulheres, à medida que vão ocupando esses espaços, têm de estimular outras a também ocupar.

É um processo de amadurecimento.

Ivone – Tenho certeza que as novas gerações já estranham menos essa emancipação feminina do que as que vieram antes de nós. Outro dia estava ouvindo uma entrevista em que uma mulher relata que a filha, de 11 anos, vinha de uma aula de judô e comentou que tinha mulheres lá. E a mãe: “Mulheres?” E a filha: “Sim, ué, por quê?” Ou seja o estranhamento da mãe, que é de um tempo em que praticar aquele esporte era algo extremamente masculino, já não está presente na natureza da filha, que nem sequer entendeu a surpresa da mãe.

E caminhamos para esse tempo futuro, em que, por exemplo, nem caiba essa sua pergunta sobre o significado de sermos duas coordenadoras, mulheres, numa mesa de negociação importante como essa, cujos resultados são uma referência não só para mundo do trabalho, mas para a sociedade no geral. E isso já é uma realidade no movimento social, na cidade e no campo. Esperamos que em breve seja algo tão natural que as pessoas vão deixar de enxergar como ponto fora da curva.

O fato de a campanha dos bancários se desenrolar praticamente no mesmo cenário em que o país se prepara para um importante processo de eleições gerais ajuda ou atrapalha?

Juvandia – Acho até que ajuda, porque as campanhas dos bancários sempre foram marcadas por discutir também projetos de país. Em ano de eleição, esse debate aflora. Bancários sempre tiveram característica de fazer uma pauta que não é corporativa, sempre dissemos que não dá para melhorar a vida dos bancários só na mesa de negociação ou no local de trabalho. E neste ano também é eixo da campanha o debate da eleição. Defendemos os bancos públicos, que estão sofrendo ataques, fechando agências, demitindo, prejudicando o atendimento. 

E não vai ser na mesa de negociação que faremos isso. Para defender o papel estratégico dos bancos públicos tem de trocar de governo e de Congresso. Enfim, para defender os bancários temos de defender o Brasil. Daí a importância das eleições, de votar em candidatos comprometidos com os bancos públicos, os direitos dos trabalhadores. Precisamos pensar num governo que viabilize a Petrobras como ferramenta de desenvolvimento, e não drenando dinheiro dela para os mais ricos. A mesma coisa para a Eletrobras, os bancos públicos.

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Ivone – Isso é importante para o país todo. Sistema de captação residencial de energia solar, por exemplo, financiada pelo BNDES. Energia limpa, sustentável e mais barata para o consumidor. São muitas as políticas públicas importantes para o país, e que mexem diretamente com o dia a dia das pessoas, que podem ser impulsionadas por empresas públicas. Queremos gerar empregos para os bancários e desenvolvimento para o Brasil. Com agência bancária a economia cresce e desenvolve o município.

Vão apoiar algum nome?

Juvandia – Nossa conferência nacional apontou para a defesa da liberdade do ex-presidente Lula e de seu direito de disputar, por uma questão de justiça e de democracia. Mas o que nos unifica é a defesa de projetos que ajudem a recuperar a soberania e um Estado comprometido com desenvolvimento e distribuição de renda. Tanto do Executivo quanto no Parlamento. Ou seja, devemos apoiar quem revogue as leis da reforma trabalhista, da terceirização, do congelamento de gastos públicos por 20 anos. Não é votando no Alckmin, no Partido Novo, que são a favor da privatização, que as pessoas vão conseguir isso. Votar no Bolsonaro porque ele promete liberar o uso de armas tem sentido? Um jovem ter uma arma é garantia de que irá se proteger? Vai lhe dar acesso a uma universidade? Um emprego digno? Se eleger candidatos que mantenham essa pauta de votar para os mais ricos, a condição de vida da população vai piorar cada vez mais. Vamos orientar o voto em candidatos progressistas.

 
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