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Chapéu
Pelo mínimo de dignidade

Trabalhadores em plataformas de entrega farão paralisação nacional em 1° de julho

Linha fina
Segundo pesquisa, no contexto da pandemia, apesar do aumento da demanda por entrega, o rendimento dos trabalhadores despencou; levantamento ainda constatou que as empresas, além de diminuir bônus e tarifas dinâmicas no período, não ofereceram medidas de proteção e segurança
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Foto: Roberto Parizotti/Fotos Públicas

Entregadores de aplicativos de todo o Brasil farão uma paralisação nacional em 1° de julho por melhores condições de trabalho, saúde e segurança. O protesto, que pretende contar com a colaboração e a compreensão dos consumidores, também é um alerta contra o projeto neoliberal, que se alimenta de crises para beneficiar grandes empresas, precarizar as relações de trabalho e retirar direitos históricos conquistados pela classe trabalhadora.

Apesar do aumento da demanda para as plataformas de entrega durante a pandemia do novo coronavírus (Covid-19), por conta do número maior de pessoas em casa, o rendimento médio dos trabalhadores dessas empresas; como Rappi, Ifood e Uber Eats; diminuiu. De acordo com Ana Claudia Moreira Cardoso, pesquisadora e professora do programa de pós-graduação da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), essa queda se deve a alguns fatores combinados: redução dos bônus e dos períodos de tarifas dinâmicas (remuneração que varia de acordo com a demanda e o número de entregadores numa determinada região), aumento do número de entregadores e crescimento do número de bloqueios realizados arbitrariamente pelas plataformas de entrega.

Segundo a pesquisa Condições de Trabalho de Entregadores via Plataforma Digital Durante a Covid-19 (a qual 252 entregadores de 26 diferentes cidades brasileiras responderam um questionário online), 52% dos entregadores entrevistados afirmaram que, durante a pandemia, estão trabalhando os sete dias da semana; e 56,4% que têm uma jornada de 9 ou mais horas por dia. Entretanto, apesar da extensa jornada de trabalho, cerca de 60% relataram uma queda em sua remuneração no contexto da pandemia.  

O levantamento, realizado entre os dias 17 e 27 de abril, foi feito pelo Grupo de Trabalho Digital, da Rede de Estudos e Monitoramento da Reforma Trabalhista (REMIR), que inclui pesquisadores da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), além de procuradores do Ministério Público do Trabalho (MPT).

"Algumas das péssimas condições de trabalho desses entregadores acabaram mais explícitas neste período de pandemia. Os trabalhadores disseram que estão sendo muito demandados desde o início, e as próprias empresas já informaram um aumento de 30% nos pedidos de entrega em toda a América Latina. Entretanto, a remuneração diminuiu, em média, 60% na pandemia, com queda nos valores dos bônus (sendo relatada por 49,2% dos entrevistados), e dos períodos com tarifas dinâmicas. Além disso, antes, como atrativo, as empresas falavam em flexibilidade no horário de trabalho. Mas como pensar em flexibilidade com quase 60% dos entregadores trabalhando 9 horas ou mais por dia? É uma jornada muito longa, isso sem contar o tempo para percorrer a distância entre a casa até o local de trabalho”, explica Ana Claudia.

Além de mais trabalho e da queda na remuneração média, o bloqueio por parte das empresas (que levam em consideração as avaliações de usuários que não podem ser contestadas por entregadores) e o temor em relação ao contágio pela Covid-19, pela falta de medidas de proteção por parte das plataformas de entrega, são outros fatores que preocupam a categoria. Por isso, estas questões estão entre as reivindicações da paralisação nacional.

A pesquisa mostra que 62,3% dos entrevistados afirmaram não ter recebido nenhum apoio da empresa para diminuir os riscos de contaminação existente durante a realização do seu trabalho. Dos 37,3% restantes, a maioria relatou ter recebido apenas orientações de como realizar o trabalho de forma a reduzir o contato com os consumidores de serviços, e a minoria (19,4%) disse ter recebido álcool em gel.  O levantamento mostra, ainda, que 84,5% dos entregadores relataram que têm medo de serem contaminados nessas condições precárias. 

 "É necessário que, além de uma renda mínima, esses trabalhadores tenham um seguro contra acidentes, e ainda transparências por parte das empresas. Muitos entregadores sequer entendem a lógica dos aplicativos e o contexto o qual estão inseridos. As empresas são, sim, responsáveis por esses trabalhadores. Devem garantir a saúde e a segurança, com medidas e equipamentos de proteção, locais para que eles possam lavar as mãos, limpar suas bolsas. Os entregadores não podem trabalhar temendo o risco de acidentes e de ficarem sem remuneração, não podem ser excluídos por um bloqueio sumário. Tudo isso também adoece", enfatiza a professora e pesquisadora.

“Por isso, a importância que a sociedade conheça a realidade e o trabalho precário a que estão submetidos esses trabalhadores”, acrescenta.

Para a secretária-geral do Sindicato, Neiva Ribeiro, a luta contra a precarização e por melhores condições de saúde e segurança dos trabalhadores em plataforma é de todos. “Somos totalmente solidários com esta luta. Muitos de nós bancários, que têm um sindicato forte que negociou as condições e as garantias mínimas para 300 mil trabalhadores do setor estarem em home office durante a pandemia, além de outros setores da classe média, utilizam muito desses serviços. E isto nos permite trabalhar em casa com segurança e receber todo dia de serviço no conforto do lar”, salienta a dirigente.

“A contradição é que os trabalhadores em plataformas, que tanto facilitam e trazem segurança à vida de muitos, estão totalmente precarizados. Muitos entregam comida o dia todo enquanto estão com fome ou não conseguem dinheiro suficiente para levar alimento para casa. Essas empresas lucram muito, podem e devem remunerar melhor seus entregadores e dar segurança mínima para que eles exerçam sua função, essencial para tempos como estes de pandemia”, acrescenta.

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