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Chapéu
Seminário

‘Junho de 2013 precisa ser ouvido para avançarmos’

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Imagem mostraTathiana Chicarino, Pedro Brandão, Marcos Nobre e Marta Bergamim, durante Revisitando as Jornadas de Junho

“Junho de 2013 é um momento de formação política selvagem das pessoas, que pode se tornar produtiva. Mas, para isso, a esquerda brasileira e o seu principal partido precisam olhar para isso e dizer: eu preciso dar uma reposta para isso. Não posso dizer ‘isso é contra o PT’. Foram revoltas contra qualquer partido […]. O PT construiu essa posição de maneira equivocada. Principalmente em um momento em que mais precisava de um apoio popular, encarou como uma revolta popular. Foi a primeira vez que o principal partido de esquerda demonizou uma revolta popular. Isso nunca aconteceu na história brasileira.”

A afirmação foi feita por Marcos Nobre, professor de filosofia política da Unicamp e autor do livro Limites da democracia: De junho de 2013 ao governo Bolsonaro, durante o seminário Revisitando as Jornadas de Junho.

O evento foi realizado nesta quinta-feira 15, em parceria do Sindicato com a Faculdade 28 de Agosto e com a Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP), e teve a participação de Marcos Nobre e do ex-integrante do Movimento Passe Livre (MPL) Pedro Brandão. Os debates tiveram a mediação das professoras Tathiana Chicarino e Marta Bergamim, e foram transmitidos pelo canal do YouTube do Sindicato (assista na íntegra, no final do texto).

Marcos Nobre avalia que a partir dos anos 2000, o processo de formação política do PT não foi mais feito fora do governo. “Você tem uma lógica governamental, pensando em uma votação daqui duas semanas no Congresso. Você perde a capacidade de imaginar os possíveis e fica reduzido a essa política do dia a dia, realista. Quando isso acontece nos anos 2000, começam a ter novas formas de organizações políticas tanto à esquerda quanto à direita. Porque a direita também não estava contente com o PSDB [...] Quando tem uma crise de formação política, você olha para o sistema político e não vê diferenciação [entre esquerda e direita].”

Ovo da serpente

Uma expressão repetida no seminário foi que junho de 2013 chocou o ovo da serpente – uma alusão ao filme homônimo de Ingmar Bergman, que retrata a situação social da Alemanha nos anos anteriores à ascensão do nazismo.

“Você pode falar que a gente chocou o ovo da serpente, mas você não pode tirar a nossa expertise gigantesca, que é a nossa capacidade de mobilização, que foi provada lá. O objetivo concreto foi por causa de R$ 0,20. Não foi nada além, mas o que fica de legado, talvez não para a História, é como se faz mobilização. E isso nós conseguimos”, disse Pedro Brandão, que avaliou que a extrema direita direita já estava sendo gestada desde 2011.

“Eu acho que a narrativa que junho de 2013 chocou o ovo da serpente do Bolsonaro, passando pelo golpe de 2016, passando pela prisão do Lula, até a eleição do Bolsonaro. […] Junho de 2013 não teve nada de positivo? Eu acho uma barbaridade. O Passe Livre vai dar nas ocupações dos secundaristas [nas escolas estaduais, contra a reorganização escolar promovida pelo governo de São Paulo, em 2015]. Todas as lutas feministas, antirracistas. Não tem como acontecer tudo isso sem junho de 2013. Como você explica que 72 cidades no Brasil têm tarifa zero? Teria isso se não tivesse junho? Só teve coisa ruim depois de junho?”, questiona Nobre.

O professor da Unicamp e pesquisador do Cebrap avalia que os protestos de junho de 2013 não foram majoritariamente da direita.

“Não teve uma organização de direita de verdade capaz de canalizar aquela energia social em junho de 2013. As novas direitas não tinham capacidade de influenciar. Junho é um problema para a esquerda, porque há uma crise de direção que mostra uma limitação organizacional do maior partido de esquerda. E a gente precisa refletir sobre isso. Porque se não for assim, nós não vamos conseguir olhar para a frente”, afirmou Nobre.

“Meu sonho de vida é fazer uma pergunta para o Haddad: por que você não sentou com a gente publicamente? […] A gente queria uma conversa aberta com ele. E se ele tivesse revogado o aumento no dia 14 de junho, eu acho que 2018 teria sido diferente. Por parte da direita não houve plano. Houve uma oportunidade”, disse Pedro Brandão.

O ex-integrante do MPL reconheceu que o objetivo do Passe Livre, naquele momento, era perder o controle das manifestações, e ponderou: “Se você cria um processo e não tem uma organização para fazer a gestão deste processo [...], embora a gente tivesse um monte de estudante de Ciências Sociais e de História, a gente não fazia boas análises de conjuntura, e a gente conhecia mal a História do país […].”

“Seja o que for que cada pessoa tenha experimentado em junho, junho tem coisas a nos dizer. E nós precisamos ouvir o junho para a gente poder ir para a frente. Porque o tal do presidencialismo de coalizão acabou. Não tem como voltar para trás”, avaliou Nobre.

“Grandes veículos de comunicação estão debatendo o tema, a esquerda, os jornalões, a mídia toda. E a gente não é uma ilha. A gente é um sindicato que até hoje faz este debate. [Por isto] Estamos fazendo este seminário em parceria com a FESPSP. O que foram as jornadas de junho? O que significaram na nossa vida? Hoje debatamos aqui se, 10 anos depois, conseguimos analisar esses fenômenos com a devida frieza necessária, ou se a gente não tem que ser frio para avaliar”, disse Erica de Oliveira, secretária de formação do Sindicato, na mesa de abertura do seminário.

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