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As cinco maiores injustiças do sistema tributário brasileiro

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A população brasileira está submetida a um sórdido conjunto de impostos, que cobra mais dos mais pobres e trabalhadores, enquanto sonegadores e grandes empresários são poupados; veja as maiores injustiças
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São Paulo – O sistema tributário brasileiro é injusto porque obriga os trabalhadores e os mais pobres a pagarem proporcionalmente mais impostos do que os ricos. Isso em um dos países socialmente mais desiguais do mundo.

As bases de tributação clássicas são três, explica Paulo Gil, auditor da Receita Federal e  integrante do Instituto Justiça Fiscal. “Ou você tributa renda, ou consumo ou patrimônio. No Brasil os impostos são sustentados basicamente pelas duas primeiras, o que acaba sobrecarregando os mais pobres e os trabalhadores assalariados. Já os ricos são poupados.”

A seguir, as cinco principais injustiças do sistema tributário que, se corrigidas, renderiam bilhões de reais aos cofres públicos e aliviariam o custo dos impostos que você paga.

1. Isenção de cobrança sobre o lucro que o empresário recebe da empresa
Enquanto o trabalhador recebe seu salário já com os impostos descontados, o lucro que sai da empresa e vai para o bolso do empresário está isento. Quem paga imposto é a pessoa jurídica (empresa), mas o lucro que sai da empresa diretamente para a mão do empresário, não. Essa injustiça tem respaldo na lei 9.249, sancionada pelo presidente Fernando Henrique Cardoso em 1995.

“Simplificando, o trabalhador assalariado tem de declarar seus salários na ficha de rendimentos tributáveis [da declaração de imposto de renda], e o acionista declara na ficha de rendimentos isentos, então não paga nada”, resume Paulo Gil.

Ele acrescenta que o primeiro passo para mudar essa realidade seria a revogação dos artigos 9º e 10º da lei 9.249. O primeiro institucionaliza a injustiça descrita acima e o segundo cria a dedução de juros de capital próprio (JCP), outra modalidade de distribuição de lucros com tratamento favorecido.  “Com a tributação desses lucros, teriam sido arrecadados cerca de R$ 85 bilhões só no ano passado”, afirma Gil.

2. Os detentores de posses pagam tributação muito baixa sobre seus patrimônios
Contrariando o artigo 153 da Constituição Federal, no Brasil, simplesmente não existe um imposto sobre grandes fortunas, enquanto países como França e até mesmo os vizinhos Uruguai e Argentina cobram. O que há é um imposto estadual sobre herança, por exemplo, que não pode exceder 8%. Já no Japão ou no Reino Unido, as alíquotas chegam a cobrar respectivamente 55% e 36%.

“Mas é claro que a gente está falando de grandes heranças. Os impostos desses países são progressivos [quem tem mais paga mais]. Não incidem sobre aquele cara que recebe uma casinha", esclarece Paulo Gil. "Nem mesmo os antigos liberais admitiam que alguém acumulasse patrimônio por meio da herança, sem qualquer esforço do trabalho”, ironiza o auditor da Receita Federal.  

Para agravar a injustiça, veículos caros como aviões particulares, lanchas e helicópteros não pagam o famigerado Imposto sobre Propriedade Veicular Automotiva (IPVA). Já o proprietário de um Palio 1.0 ano 1998 ou o microempresário que tem uma Fiorino para fazer suas entregas têm de pagar essa taxa, que é cobrada apenas sobre veículos que rodam em ruas e rodovias.

3. Excesso de tributação sobre o consumo
Grande parte dos impostos e contribuições são arrecadados por meio do consumo de produtos e alimentos, como por exemplo ICMS ,PIS e Cofins. Essa é uma grande injustiça, afirma a também auditoria fiscal da Receita Federal Clair Hickmann, pois quem ganha menos acaba sentindo mais o peso desses impostos.

“Se eu compro um pacote de macarrão, vou pagar o mesmo imposto do que a minha diarista sobre o mesmo pacote, só que proporcionalmente a minha renda é maior do que a dela. E o [megaempresário falecido em 2014] Antônio Ermírio de Morais também vai pagar o mesmo imposto pelo pacote de macarrão", exemplifica.

4. Impunidade para a sonegação de impostos
Os grandes tubarões sonegam impostos e não vão para a cadeia, pois existe um arcabouço legal que os protege. Se houver desvio no recolhimento de tributos, um processo administrativo será aberto no Conselho Administrativo de Recursos Federais (Carf).

O Ministério Público nada pode fazer contra o sonegador enquanto esse processo não tiver esgotado todas as instâncias. A Lei 8.137, de 1990, estabelece hipóteses que configuram crimes contra a ordem tributária, inclusive com previsão de reclusão do infrator. Porém, mais para frente, uma outra lei, promulgada em 1996, estabeleceu que o sonegador sairá impune se pagar o tributo devido. E ainda por cima sem multa, sem juros e com a opção de parcelar aquilo que deve para a sociedade.

5. Isenção para remessa de divisas de empresas multinacionais
Se multinacionais como o Santander ou o HSBC resolvem retirar os lucros de suas filiais no Brasil e envia-los para suas matrizes, na Espanha ou no Reino Unido, nada pagam em impostos nessas transações. Em 2013, foram enviados ao exterior US$ 26 bilhões. “Essa isenção estimula as multinacionais a não reinvestir seus lucros no Brasil”, afirma o auditor fiscal Paulo Gil.

Rodolfo Wrolli - 17/8/2015

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