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Imigrantes lutam por trabalho decente no Brasil

Linha fina
Seminário Nacional busca fortalecer movimento sindical na defesa de trabalhadores imigrantes; Luta inicial é pela substituição do "Estatuto do Estrangeiro", feito na ditadura militar
Imagem Destaque

São Paulo - Fortalecer a ação sindical com migrantes e imigrantes, identificar os fluxos migratórios no Brasil e incluir os trabalhadores imigrantes nas discussões sobre trabalho decente. Com essas pautas, a CUT, em conjunto com o Centro de Direitos Humanos e Cidadania do Imigrante (CDHIC) e um órgão da Confederação Italiana do Trabalho (INCA/CGIL), organizou nestas quarta 5 e quinta-feira 6 o Seminário Nacional "Trabalho Decente e Migrações", em São Paulo.

A intenção do grupo foi trocar informações sólidas para combater a exploração dos trabalhadores imigrantes e levantar a bandeira contra a xenofobia.

"Estatuto do estrangeiro" - Uma grande batalha das organizações que lutam pelo direito do imigrante é o estabelecimento de uma nova política migratória e a revisão do "Estatuto do estrangeiro" (Lei 6815/80), que foi publicada e aprovada ainda na Ditadura Militar e, portanto, reflete o pensamento da época.

Em seu artigo 107, diz que "O estrangeiro não pode exercer atividade de natureza política [...] sendo-lhe especialmente vedado: I - organizar, criar ou manter sociedade ou quaisquer entidades de caráter político [...] II - exercer ação [...] no sentido de obter [...] adesão a idéias, programas ou normas de ação de partidos ou facções políticas de qualquer país; III - organizar desfiles, passeatas, comícios e reuniões de qualquer natureza, ou deles participar, com os fins a que se referem os itens I e II deste artigo".

Segundo a Coordenadora Executiva do Centro de Direitos Humanos e Cidadania do Imigrante (CDHIC), Tânia Bernuy, o documento considera os imigrantes como ameaça aos brasileiros, potenciais elementos subversivos e proíbe manifestações políticas e organizações sindicais. O Artigo 110 do Estatuto afirma até mesmo que "o Ministro da Justiça poderá, sempre que considerar conveniente aos interesses nacionais, impedir a realização, por estrangeiros, de conferências, congressos e exibições artísticas ou folclóricas".

"Não cabe, em uma sociedade democrática, que nós não possamos lutar por nossos direitos", afirma Tânia.

Há, no momento, duas propostas de revisão do Estatuto conhecidas no País. A primeira é o anteprojeto apresentado pelo Ministério da Justiça; a segunda, uma proposta do Conselho Nacional de Imigração (CNIg). Mediante aos pedidos de acesso ao documento do CNIg, o presidente do Conselho, Paulo Sérgio de Almeida, diz que "não há um projeto construído pelo CNIg. Temos uma série de propostas consensuais que estão sendo esquematizadas. Quando ficar pronto, podemos até divulgar - estamos totalmente abertos a discussões - mas o projeto concreto é do Ministério da Justiça".

Debater mais e mais - "Nós queremos construir um debate", afirma o secretário nacional de Políticas Sociais da CUT, Expedito Solaney. "A CUT tem uma posição histórica, que é a da livre circulação. Não há mercado reservado aos brasileiros. Nosso debate é que os trabalhadores do mundo inteiro são cidadãos do mundo e podem ir para onde quiserem. É a ideia de menos mercado e mais integração", destaca.

O diretor da CUT e representante da Central no Conselho Nacional de Imigração (CNIg), Vitor Carvalho, critica a proposta apresentada pelo Ministério da Justiça para a renovação do "Estatuto do Estrangeiro". Para ele, o anteprojeto - elaborado por especialistas - não ouviu democraticamente a sociedade civil e, por isso, dificilmente representará os interesses dos trabalhadores. "Nós [o CNIG] somos um conselho democrático, com resoluções consensuadas e precisamos ser ouvidos na elaboração do projeto".

Algumas propostas apresentadas pelo Conselho, porém, também foram questionadas pelos movimentos presentes.

A delegação da CUT apontou, por exemplo, que a reunião familiar - concessão de visto aos dependentes de cidadão imigrante no Brasil - estaria garantida apenas aos documentados. Também criticou a proposta de estabelecer como vínculo para essa reunião apenas a condição de dependência econômica, não a questão socioafetiva. Outro problema seria a divisão dos imigrantes - na proposta - entre "qualificados e não qualificados", termo que necessitaria de regulamentação e estabeleceria tratamento desigual entre imigrantes.

Com itens polêmicos nas duas propostas, o público presente no seminário encaminhou a construção de um Grupo de Trabalho (GT) para discutir alterações no projeto com participação social.

A primeira reunião será na quarta-feira 12, às 14h, na sede da CUT Nacional, em São Paulo, e será aberta.

Dois Ministérios - Para Vitor Carvalho, há uma discussão envolvendo Ministérios que deve ser anterior à discussão sobre o trabalho do imigrante no Brasil. "Existe uma disputa entre Ministério do Trabalho e Ministério da Justiça sobre quem de fato tomará para si a decisão de pensar o mundo do trabalho, seja nas resoluções que existem para imigração, seja para ter a competência de emitir os vistos para os imigrantes no Brasil".

O CNIg é vinculado ao Ministério do Trabalho; o anteprojeto da Lei de Imigração é do Ministério da Justiça e os recursos financeiros são dispersos. O Anteprojeto prevê a criação de uma autarquia ligada à Presidência na República que concentraria as discussões sobre o tema, mas não é um consenso.

A secretária nacional de Relações do Trabalho da CUT, Maria das Graças Costa, concorda com a necessidade de uma definição sobre as atribuições dos Ministérios. Segundo ela, há pautas travadas pela disputa entre eles. "Mas é importante resgatar as políticas econômicas e sociais mais abrangentes, como a Política de Valorização do Salário Mínimo, o aumento do emprego formal e Conferência do Trabalho Decente", destaca.

Para Graça, é fundamental associar a agenda da migração ao desenvolvimento do trabalho decente e da melhoria de vida da população em geral. A secretária aponta que quanto melhor a qualidade do trabalho, melhor para todos trabalhadores, sem distinção. "A CUT atua fortemente no congresso pelos direitos dos trabalhadores, principalmente contra a terceirização, e aprofundará ainda mais a atuação no próximo período. Isto atinge todos e todas, incluindo os imigrantes e os já terceirizados", destaca. "Entre as pessoas que estão com trabalho precário, estão os imigrantes. E como não temos legislação forte, como ela está ultrapassada, elas ficam mais vulneráveis".

Cartilha - A CUT elaborou a Cartilha Migrantes no Brasil: Proteção Social e trabalho Decente para Todos/as (clique aqui para acessar), na qual apresenta Convenções Internacionais, meios de requerer direitos e orientações para documentação, residência e estabilidade no Brasil.


Henri Chevalier, da CUT, com edição da Redação - 7/11/2014

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