São Paulo – “Sempre me senti discriminada depois que adoeci. Nunca tive uma promoção, nunca ganhei um centavo a mais que não fosse das conquistas da categoria. Mesmo trabalhando, trabalhando e trabalhando, o banco não me avalia com excelência. Já tomei remédio faixa preta, desmaiava, superei isso, mas as dores são constantes até hoje.” O depoimento de uma bancária que atua no setor há 29 anos retrata o desespero de quem enfrenta as lesões por esforço repetitivo. Ela já passou por oito cirurgias.
O Dia Mundial de Combate às LER/Dort (Lesões por Esforços Repetitivos e Distúrbio Osteomuscular Relacionado ao Trabalho) é lembrado anualmente em 28 de fevereiro. Mas o pesadelo de quem tem de enfrentar cirurgias, afastamentos e falta de reabilitação é diário.
A trabalhadora entrevistada, que ouvia da sua gerência que o banco pagava a uma “inútil”, resistiu com força e fé às dores das lesões contraídas no trabalho, ao preconceito e ainda está na ativa. “Já fui afastada muitas vezes. Nem os colegas se solidarizaram. Um deles, que não entendia o que eu passava quando sentia dores, eu encontrei na fila do INSS, também com problemas de saúde. Mas essa pessoa, ao contrário de mim, desistiu e não é mais bancário”, conta.
Números alarmantes – A categoria registra um alto número de adoecidos. Em 2012, foram 21.144 afastamentos e 27% deles em razão de lesões por esforços repetitivos ligados ao ritmo estressante na rotina dos bancos. “Outros 25,7% desses trabalhadores foram afastados por estresse, depressão, síndrome de pânico e transtornos mentais relacionados diretamente ao trabalho, o que também pode ser consequência, em diversos casos, do sofrimento de quem faz uma cirurgia e do que passa quem tem LER/Dort”, destaca a secretária de Saúde do Sindicato, Marta Soares.
A médica e pesquisadora da Fundacentro Maria Maeno alerta: o desgaste decorrente da intensificação do trabalho e da necessidade de atingir metas sob pena de discriminação ou demissão, o medo da dispensa e do isolamento por colegas e familiares e a presença constante de dor geram angústia e doenças psíquicas. “O bancário passa a viver em conflito entre procurar ajuda e o medo das consequências, convive com a incerteza profissional, o que piora o quadro clínico. O trabalhador pode ter crises de ansiedade, depressão e outras manifestações psicológicas. O tratamento e a recuperação dependem da precocidade do diagnóstico e do auxílio por profissionais de saúde”, explica Maeno. “Esta precocidade depende da segurança que o trabalhador tem na empresa em que trabalha. Se existe a prática de discriminar e demitir, o trabalhador costuma continuar a trabalhar com dor até não poder mais. Assim, para que o acesso ao tratamento deixe o plano teórico é preciso oferecer condições e segurança ao trabalhador”, ressalta.
Somente nos primeiros seis meses de 2013, 10.936 bancários já haviam sido afastados por adoecimento, sendo 26,7% por transtornos mentais e 25,1% por LER/Dort. “Os números são assustadores e com muita luta já conquistamos um grupo de trabalho para debater com os banqueiros e entendermos as causas de afastamentos e adoecimentos na categoria bancária. O objetivo é prevenir”, lembra Marta.
O que é? – LER não é doença, e sim uma síndrome constituída por um grupo de várias doenças. Além da tendinite, fazem parte do grupo tenossinovite, bursite, epicondilite, síndrome do túnel do carpo, entre outras. Os principais sintomas de quem possui uma das doenças desse grupo é dor nos membros superiores e nos dedos, formigamento, fadiga muscular, alteração da temperatura e da sensibilidade, redução dos movimentos, inflamação.
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Gisele Coutinho – 27/2/2014
Linha fina
Dia mundial de combate à síndrome que acomete milhares de trabalhadores da categoria é lembrado nesta sexta-feira 28
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