São Paulo - O sindicalista brasileiro Márcio Monzane (foto), ex-diretor do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região, é chefe do escritório mundial da UNI Finanças, na cidade suíça de Nyon. A entidade integra a United Networks International (UNI), rede global de sindicatos do setor de serviços com 900 entidades filiadas em 150 países. Segundo Monzane, a venda responsável de produtos financeiros se tornou uma causa internacional do segmento, uma vez que está associada a dois valores muito caros ao movimento sindical bancário: a responsabilidade social dos bancos e o direito humano a condições adequadas de trabalho. Em visita ao Brasil no final de fevereiro, Monzane comentou o andamento dessa campanha global.
Em que medida as relações entre bancos e clientes refletem nas demandas sindicais dos bancários?
Nós temos uma campanha mundial por vendas responsáveis e assessoramento financeiro, que tem como princípio o estímulo à negociação coletiva – ou seja, as relações com os clientes também têm de ser objeto de negociações entre as instituições financeiras e seus trabalhadores. A campanha defende também a atuação das entidades sindicais e órgãos de defesa do consumidor junto a entes reguladores dos governos, como os bancos centrais e organismos de defesa econômica. A campanha prioriza a busca pelo diálogo entre todos esses atores.
E o diálogo está acontecendo?
Temos uma carta de princípios que define como deve ser isso que chamamos de venda responsável. A lógica não pode ser orientada pela busca do lucro, mas a necessidade dos clientes. Tanto individualmente quanto em nível local – por exemplo, que tipos de produtos bancários são mais necessários a um determinado entorno social. E isso levando em conta que é perfeitamente possível os negócios bancários serem lucrativos, rentáveis, atendendo às necessidades das pessoas e das comunidades. Então, um programa de metas de um banco, em vez de ser orientado a alcançar o objetivo imediato do lucro, deve ser estabelecido com base num assessoramento financeiro voltado para o atendimento dessas necessidades do público.
Por exemplo?
Por exemplo, um banco que convive com uma carteira de crédito afetada por 5% de inadimplência não vai ter prejuízo de direcionar suas ações para o crédito mais consciente. Uma taxa de inadimplência reduzida a 2% não atrapalha sua rentabilidade. O cliente que deve menos, ou poupa mais, o que estimula os investimentos, ou consome mais, o que estimula a economia local. Mas para isso é necessário um bom assessoramento, as pessoas que vão lidar com isso precisam ser bancários, precisam ser profissionais seguros e qualificados, têm que ter uma relação transparente e não via call center, tem de haver um tempo adequado para um bom atendimento.
Já há algum resultado alcançado por essa campanha em algum país?
Na Comunidade Europeia, agora, está em discussão uma regulamentação do sistema financeiro. Em um dos níveis de discussão estão os critérios para elaboração de um produto financeiro. Conseguimos introduzir num texto a ser apresentado à Comissão Europeia alguns desses princípios relacionados a projeções de metas, assessoramento, treinamento, qualificação, oferecendo parâmetros mais civilizados para formulação de uma eventual nova lei que venha a surgir desse processo. Na Austrália, por exemplo, surgiu um acordo avalizado pelo Ministério da Economia pautado por essa proposta. O fenômeno já estimula debate semelhante na vizinha Nova Zelândia. Na Europa, um acordo entre sindicatos e o Santander na Europa também introduz na relação o tema da assessoria financeira, da qualidade dos produtos e do atendimento ao clientes. Então, já começam a surgir avanços, ainda que pontuais.
Onde mais os sindicatos têm conseguido convencer bancos com essa demanda?
Em Cingapura e nas Filipinas, os sindicatos fizeram pesquisas que comprovam que clientes adquirem produtos que desconhecem, e a discussão da assessoria e do treinamento adequados foi criada. Na Dinamarca a discussão foi criada a partir do conflito ético detectado pela apresentação inadequada de produtos a clientes, e isso tem um peso muito importante nos países nórdicos. E a partir do momento em que os sindicatos comprovaram o conflito ético algumas empresas se abriram para negociar para solucioná-los. Isso aconteceu num banco muito grande na Suécia, o Nordea.
Rede Brasil Atual - 15/3/2012
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Em entrevista à Rede Brasil Atual, Marcio Monzane, da UNI Finanças fala da campanha internacional para cobrar responsabilidade social dos bancos
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