Luiz Inácio Lula da Silva, 77 anos, foi eleito pela terceira vez presidente do Brasil, 20 anos e três dias depois de sua primeira vitória. Na disputa mais acirrada da recente histórica republicana brasileira, o petista terminou a apuração com 50,90% dos votos válidos, contra 49,10% de Jair Bolsonaro (PL). Com 99,99% das urnas apuradas, o candidato do PT estava com 60,3 milhões de votos (60.345.737). O atual presidente, 58,2 milhões (58.206.251). Assim, de nove eleições presidenciais no pós-ditadura, Lula venceu três, um feito inédito.
Foi uma votação ainda mais apertada que a de 2014. Naquela eleição, Dilma Rousseff foi eleita com 51,64% (54,5 milhões de votos), ante 48,36% (51 milhões) ao então senador Aécio Neves (PSDB).
Se em 2014 Dilma passou à frente às 20h27, neste ano a “virada” de Lula ocorreu exatamente às 18h44. A esta altura, já estavam apurados quase 68% dos votos. A partir daí, o petista manteve-se à frente, abrindo ligeiramente a vantagem. E contrariando o ministro bolsonarista Ciro Nogueira, que às 18h19 previa vitória do atual presidente com 50,09%.
Sem reeleição
Assim, pela primeira vez desde 1989, quando os brasileiros recuperaram o direito do voto, um presidente da República não consegue a reeleição. Fernando Henrique Cardoso (PSDB) foi eleito em 1994 e reeleito em 1998. Lula, em 2002 e 2006. E Dilma, em 2010 e 2014.
Foi uma campanha mais uma vez, como em 2018, recheada de fake news, que a Justiça Eleitoral mal conseguiu dar conta de rebater. E com a “novidade” do assédio eleitoral, com empresas, em prática criminosa, tentando constranger o direito de voto de seus funcionários. Até hoje, o Ministério Público do Trabalho (MPT) contabiliza quase 2.500 denúncias, 12 vezes mais do que em 2018.
Bloqueio no acesso ao voto
O domingo ainda reservava surpresas. A Polícia Rodoviária Federal (PRF), comandada por um bolsonarista, desencadeou uma operação pelo país, mas principalmente no Nordeste, a pretexto de flagrar transporte ilegal de eleitores, mas na verdade dificultando o acesso às urnas onde Lula era favorito. “Estão golpeando a eleição”, chegou a dizer o professor Lenio Streck. “Nem na ditadura o voto foi tão obstruído. Controlado. Há vários modos de dar golpe de Estado.”
Eleito, Lula sabe que terá dificuldades no Congresso, de maioria conservadora, e também nos estados. Na Câmara, o PL, do atual presidente, fez 99 cadeiras. E na eleição concluída neste domingo, a maioria das unidades da federação deu vitória a candidatos ligados ao bolsonarismo. “No primeiro turno, quando havia onze candidatos na disputa, 92% dos eleitores votaram em Lula ou em Bolsonaro, refletindo a clara polarização da vida política brasileira”, diz o jornal Le Monde.
Acreditas-se, desse modo, que a taxa de abstenção, na casa de 20,5% – quase 32 milhões de votantes não compareceram –, poderia ter sido menor.
Vontade da mudança
O presidente eleito conseguiu, no entanto, construir um acordo de alianças, incluindo o MDB de Simone Tebet, terceira colocada no primeiro turno, e o PDT de Ciro Gomes, quarto colocado. Sem contar a própria formação de sua chapa, que contou com o ex-governador paulista Geraldo Alckmin, agora no PSDB.
Uma manifestação afetuosa – e que de certa forma sintetiza a expectativa mundial – veio da cantora portuguesa Teresa Salgueiro, ex-integrante do grupo Madredeus. “Que vença de forma expressiva a vontade da mudança, por um país que celebre a cada dia a sua imensa diversidade e saiba construir a harmonia entre as suas inúmeras diferenças, que possa premiar a luta incansável do seu povo sofrido e trabalhador, de alma tão criativa e generosa. Que possam celebrar a sua ancestralidade que tanto tem a ensinar a todo o mundo. (…) E em que a palavra liberdade seja usada como respeito ao próximo e não confundida com a possibilidade de agredir seja quem for. A vossa escolha é decisiva para a manutenção da democracia e terá um enorme impacto em todo o planeta.”