São Paulo - O procurador Valério Heringer, do Ministério Público do Trabalho, e o presidente do Tribunal Regional do Trabalho do Espírito Santo (TRT-ES), desembargador Mário Ribeiro Cantarino Neto, apontaram que a proposta de reforma trabalhista apresentada pelo governo Temer (PL 6787/16) traz riscos de redução de direitos.
Ambos participaram de seminário promovido pela Comissão Especial da Reforma Trabalhista da Câmara, na Assembleia Legislativa do Espírito Santo, em Vitória (ES).
Para Heringer, a proposta visa ao alinhamento da legislação aos interesses empresariais. Segundo ele, não se trata de fato de uma reforma, já que uma reforma pressupõe um debate o mais amplo e aprofundado possível e deve ser feita em tempo muito mais longo.
Essa também é a visão da vice-presidente da CUT (Central Única dos Trabalhadores) do Espírito Santo, Noêmia Simonassi. Conforme ela, uma reforma não pode piorar a situação do trabalhador. Ela preocupa-se especialmente com a possibilidade de que a negociação prevaleça sobre a legislação, permitida pela proposta. “Não temos sindicatos fortes o suficiente para contrapor o que é colado na mesa pelo patrão”, disse. Ela acredita que hoje existem muitas ações trabalhistas, “porque tem muita coisa errada” e que, para diminuir esse número, basta que os patrões cumpram a legislação.
Ainda segundo Noêmia, as mulheres serão as mais prejudicadas pela reforma, pela possibilidade da extensão da jornada de trabalho para até 12 horas. Ela chamou atenção para a jornada dupla de trabalho da mulher, por conta dos trabalhos domésticos.
O presidente da CUT-ES, Jasseir Alves Fernandes, afirmou que a proposta de reforma significa o desmonte do sistema de proteção do trabalhador. Para ele, a reforma vai precarizar a Justiça do Trabalho e vai privilegiar o “mau empresário”.
Presidente do TRT/ES - O desembargador Mário Ribeiro Cantarino Neto concorda que a proposta de Temer visa à redução de custos para empregadores, principalmente por permitir a ampliação do trabalho temporário, e visa também aumentar o campo da negociação coletiva. Para ele, essa é uma tentativa de afastar a jurisdição da Justiça do Trabalho, que tem anulado vários acordos coletivos que ultrapassam os limites legais. Na visão dele, os sindicatos mais fracos vão sofrer mais e poderá haver redução de direitos, em troca de pequena vantagem compensatória.
Ele também afirmou que “assusta” a possibilidade, contida no projeto, de aumento da jornada de trabalho, hoje restrita a oito horas. “Jornadas de 12 horas vão se tornar mais frequentes, porque tem efeitos, por exemplo, na saúde do trabalhador, e aumenta os riscos de acidentes de trabalho”, destacou.
Inconstitucionalidade - Também presente ao seminário, o desembargador do TRT Carlos Henrique Bezerra Leite acredita que o projeto é inconstitucional. Ele salientou que a Constituição diz que é direito do trabalhador uma relação de emprego protegida contra a despedida arbitrária ou sem justa causa, mas isso não foi regulamentado ainda pelo Congresso. Para ele, os parlamentares deveriam discutir neste momento essa regulamentação, proporcionando “o mínimo de condições de permanência no emprego”.
Na visão do desembargador, apenas com essa regulamentação e com a reforma do modelo sindical poderia ser implementada a prevalência do “negociado sobre o legislado”, como prevê a reforma. De acordo com Bezerra Leite, a proposta de reforma foi baseada no modelo dos Estados Unidos, onde os sindicatos são muito fortes. Ele defendeu a reforma do modelo de unicidade sindical existente no Brasil, em que há apenas um sindicato para cada categoria em cada unidade territorial. Para ele, apenas com a liberdade sindical, “o negociado sobre o legislado” poderia vigorar no País.
Fracasso retumbante - O deputado Helder Salomão (PT-ES), um dos que solicitou o seminário, informou que a Organização Internacional do Trabalho (OIT) fez pesquisa em 63 países que flexibilizaram as leis trabalhistas, a qual constatou que em nenhum caso houve aumento na geração de emprego. Para Salomão, não é a legislação que é um entrave para a geração de emprego, mas as medidas econômicas.
Também autor do pedido de realização do seminário, o deputado Sérgio Vidigal (PDT-ES) acredita que os argumentos utilizados pelo governo para promover a reforma são extremamente questionáveis. Esses argumentos seriam de que a reforma vai proporcionar a retomada do crescimento econômico e de que vai reduzir o número de ações trabalhistas.
“Da forma como está apresentada, a reforma poderá suscitar mais questões trabalhistas”, disse. “Não se aumenta competitividade em cima do salário do trabalhado”, completou.