São Paulo - Participantes de audiência pública na Comissão de Direitos Humanos (CDH) do Senado, na quinta 23, foram unânimes em afirmar que a reforma da Previdência prejudicará especialmente as mulheres, podendo, também, significar o fim da aposentadoria para todos os brasileiros.
Promovida em conjunto com a Procuradoria da Mulher do Senado e a Procuradoria da Mulher da Câmara dos Deputados, a audiência debateu questões o como tripla jornada de trabalho da mulher e diferença salarial, entre outras.
De acordo com a presidenta do Instituto dos Advogados Previdenciários, Luciana Farias, igualar a idade da mulher com a do homem para a aposentadoria acaba com a igualdade material, que é necessária, segundo a própria Constituição, para dar isonomia.
"Não é uma vantagem a mulher se aposentar cinco anos antes; é uma necessidade para igualar homem e mulher. A mulher não vai conseguir trabalhar o mesmo tanto que o homem. Ela vai ter que sair do emprego para cuidar do filho, ela vai ter quatro horas a mais [de trabalho] para cuidar da casa. Para se igualar, deve haver essa diferenciação na legislação em respeito à isonomia e à mulher", afirmou Luciana.
A advogada disse também que a PEC 287 é inconstitucional porque afeta o princípio da proibição do retrocesso social, que impede que sejam desconstituídas conquistas já alcançadas.
Discriminação - A coordenadora-geral da Auditoria Cidadã da Dívida Pública, Maria Lúcia Fattorelli, lembrou que a mulher sofre discriminação no mercado de trabalho, pois, além de receber menos que os homens que ocupam o mesmo posto, têm menos acesso a postos de chefia e não têm o apoio de creches para deixar seus filhos.
"Desconsideram a nossa jornada de trabalho, de quem cria os filhos, de quem cuida da saúde da família", disse, referindo-se ao fim da diferença de idade para a aposentadoria de homens e mulheres.
Maria Lúcia revelou também que, em 2014, 64,5% das aposentadorias concedidas a mulheres foram por idade, enquanto que, para os homens, apenas 36%. "As mulheres não conseguem completar tempo de contribuição por causa de toda essa intermitência".
A mulher do campo - As participantes da audiência pública também alertaram para a situação das mulheres que trabalham no campo, especialmente na agricultura familiar. Para Maria Inez Rezende, presidente da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Anfip), o benefício rural vai cair drasticamente, uma vez que a PEC exige uma contribuição mensal de todos os membros da família, além de exigir 25 anos de contribuição.
"Se ele só tem receita na hora em que vende sua produção, como vai conseguir contribuir mensalmente para todos os membros da família?"
Maria Inês Rezende lembrou que até 1991 a trabalhadora rural não tinha benefício previdenciário, que conquistou com a Lei 8.213. Até então, só o pai de família rural conseguia a sua aposentadoria. A partir daí, a família passa a ter direito ao benefício, com o pagamento da contribuição quando da venda a produção rural. Na avaliação de Maria Inês Rezende, essas medidas irão provocar o êxodo rural.
Expectativa x sanidade - Luciana Farias afirmou ainda que é preciso diferenciar o que é expectativa de vida do que é sanidade de vida. Ela disse que, embora no Brasil a expectativa de vida seja de 75 anos, a sanidade de vida, ou seja, a plena condição para o trabalho é de 63 anos.
Europa x Brasil - As participantes da audiência pública também criticaram a afirmação do presidente Michel Temer de que o Brasil está seguindo uma tendência da Europa ao aumentar a idade de aposentadoria para 65 anos. Denise Gentil lembrou que na Europa a idade de 65 é a idade de referência, mas é possível se aposentar antes. Além disso, está sendo implantada aos poucos, sendo que a probabilidade de um europeu não chegar aos 65 anos é muito menor do que a de um brasileiro.