São Paulo – Os gastos sociais quebraram o Estado? Com essa questão, o professor da Universidade Federal do Pará Claudio Puty deu início ao painel de debates do Congresso Extraordinário da Contraf-CUT, onde será construído um plano de lutas contra as propostas de retirada de direitos feitas pelo governo Temer. O evento começou na quarta 8 e vai até sexta 10, na Quadra do Sindicato.
A um público formado por dirigentes sindicais bancários eleitos em assembleias em todo o país, Puty refutou os argumentos em torno da alegada necessidade de reforma na Previdência e explicou as mudanças descritas na Proposta de Emenda Constitucional 287, em discussão no Congresso Nacional.
O acadêmico reforçou o malabarismo utilizado pelo governo Temer e propagado pela imprensa tradicional para fazer a opinião pública acreditar que a Previdência Social opera em déficit.
O cálculo leva em conta apenas a relação entre o total de gastos com as aposentadorias e o valor arrecadado através da contribuição dos trabalhadores e empregadores, ignorando outras fontes de receita do sistema de seguridade previstas na Constituição Federal como: Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), PIS/Pasep.
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Ele lembrou que em 2015 o país gastou R$ 502 bilhões com o pagamento de juros da dívida pública, R$ 280 bilhões com desonerações tributárias, e perdeu outros R$ 452 bilhões com sonegações fiscais. Os gastos previdenciários, por sua vez, somaram R$ 486 bilhões.
“Mas os gastos previdenciários são o único item desconcentrador de renda", ressaltou Puty. "Quantos municípios do interior do Brasil vivem de transferências previdenciárias? Em muitos deles [os recursos das pensões do INSS] são mais importantes que a verba do fundo de participação dos municípios."
A recessão econômica foi lembrada por Puty, que destacou a queda de 3,6% no Produto Interno Bruto em 2016. “Quando a receita diminui, é obvio que tem de cortar gastos”, continuou. “Mas o que os neoliberais fazem é aproveitar um momento de crise para fazer reformas no estado e caçar os nossos direitos. Eles misturam a necessidade de ajustes eventuais nas contas com desmonte do país, privatização, venda de terras para estrangeiros, retirada de direitos.”
Tendo afirmado que os gastos sociais não são os responsáveis pelo desajuste nas contas públicas, Puty expôs os danos que a reforma na Previdência provocará na sociedade brasileira.
Os brasileiros só poderão se aposentador aos 65 anos, seja homem ou mulher, trabalhador urbano e rural, servidor público e trabalhador da iniciativa privada. Além disso, passa-se a exigir do trabalhador o mínimo de 25 anos de contribuição (contra os atuais 15 anos) para receber apenas 76% do valor da aposentadoria contra os atuais 85%. Para receber 100%, o trabalhador terá que contribuir por mais 24 anos, totalizando 49 anos de contribuição.
Os danos - Para efeito de comparação, em 2015, 60% das aposentadorias por idade foram concedidas a trabalhadores que não chegaram aos 20 anos de contribuição; 79% dos aposentados por idade haviam contribuído por menos que os 25 anos que serão exigidos pela reforma. Atualmente, em dez estados do Brasil, sobretudo nos mais empobrecidos no Norte e Nordeste, 90% das aposentadorias são concedidas por idade.
Atualmente, 69% dos benefícios previdenciários são iguais a um salário mínimo e 92% são inferiores a três salários mínimos, ou seja, em valores de hoje, inferiores a R$ 2.640.
Pelas regras atuais, uma pessoa que perder a capacidade para o trabalho recebe 100% do valor do benefício (média de todas as contribuições desde julho de 1994). Com as novas regras, passará a receber 51% deste valor mais 1% por ano de contribuição.
Além disso, as novas regras proíbem a acumulação de mais de uma aposentadoria por parte do mesmo segurado, o que trará impactos severos sobre a população idosa de renda baixa, como é o exemplo das trabalhadoras do campo que acumulam aposentadoria rural com a pensão deixada pelos seus cônjuges, ambas limitadas ao salário mínimo. Como a pensão poderá, com a reforma, ser um benefício de valor inferior ao mínimo, a renda familiar poderá ser reduzida drasticamente no momento do óbito do segurado.
“Somente um governo de exceção poderia propor uma reforma como essa, sem debate com a sociedade”, criticou Puty.