São Paulo - Líder estudantil, líder comunitário, economista, funcionário do Itaú, deputado estadual. Luiz Cláudio Marcolino foi o primeiro bancário com origem em banco privado a presidir o Sindicato. Enfrentou o período neoliberal como dirigente e assumiu a entidade em um cenário diferente, mais democrático e popular, porém, cheio de desafios, como as grandes fusões no setor, a terceirização e a rotatividade.
> Página especial com as entrevistas dos 90 anos
Sua habilidade nas mesas de negociação rendeu-lhe, além da liderança entre os bancários, que o reelegeram para a presidência do Sindicato em 2008, o voto do povo nas eleições de 2010 como deputado estadual. Hoje, líder da bancada do Partido dos Trabalhadores (PT) na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), o deputado dorme em média quatro horas por noite, ainda menos do que quando presidia o Sindicato, ferrenho na luta pelos direitos de quem o elegeu.
Você foi o primeiro dirigente sindical oriundo de banco privado a presidir o Sindicato após a retomada. Como foi enfrentar esse desafio?
É importante contextualizar a presidência do Sindicato de 2004 a 2010 por conta da mudança do perfil da categoria no início dos anos 1990. Tínhamos bancos públicos fortes e também os privados grandes. Tomamos a decisão – quando entrei no Sindicato ainda como diretor, quando Gilmar Carneiro era presidente e Ricardo Berzoini secretário-geral – de que era necessário potencializar a organização dos funcionários dos privados. Foi quando criamos os coletivos de cada banco. Vivemos um processo de refluxo dos funcionários dos bancos públicos nas assembleias. Na década de 1990, com greves mais fortes nos privados, como no Itaú, e as paralisações surpresas, ganhamos força. Antes, banco privado não parava. E quando parava era o funcionário da retaguarda. Passamos a ter encontros estaduais, mais ações nos bancos privados, enfim, toda a base de preparação dos trabalhadores feita por todo o Sindicato.
Quais as primeiras fortes manifestações que marcaram sua militância na categoria?
A mais forte foi em 1990 no Itaú. Eu ainda não era diretor do Sindicato. Trabalhava com mais onze pessoas no numerário do Ceic e decidimos que íamos entrar em greve. Fomos a outros departamentos e no dia seguinte 150 pessoas pararam. Foram 11 dias de greve. O banco começou a pressionar e indicar por onde era para entrar, mas ninguém furou a greve. Nos dias seguintes, começamos a parar agências da região e foi ali que tive contato com a diretoria do Sindicato. Eu já havia passado pelo movimento estudantil, popular, mas a atuação sindical mesmo começou nessa situação.
Como dirigente você realizou diversas manifestações. Algumas inusitadas?
Logo que entrei para o Sindicato, em 1991, o Itaú queria fechar o crédito imobiliário por conta da queda de venda dos imóveis na década de 1990. E o banco anunciou que demitiria 50 pessoas. Montei um acampamento em frente ao Ceic. Para cada demissão montávamos uma barraca de lona em frente ao banco. Ficamos lá nove dias, parados, até que o banco suspendeu o processo de demissão.
Outro momento foi quando o banco aumentou os preços na lanchonete. Começamos um boicote e no primeiro dia de ato fizemos churrasco e vendemos espetinhos. Depois levamos salgadinhos, que custavam, junto com o refrigerante, R$ 0,50. Vendíamos para o pessoal não comer na lanchonete. Fizemos um levantamento e mostramos que as lanchonetes da região eram todas mais baratas que a do Ceic e conseguimos reverter os preços. Foi uma derrota para o Itaú nas duas situações.
Esse tipo de mobilização fez com que eu me tornasse uma for te liderança. A direção percebeu que o Sindicato tinha mais liderança lá dentro do que o próprio banco. E começamos a negociar e garantir PCR, convênio médico, auxílio-educação.
Em sua gestão na presidência houve crescente concentração bancária, principalmente com fusão de grandes bancos. Como foi lidar com essa situação?
Primeiro o Bandeirantes foi vendido para o Nacional. O HSBC comprou o Bamerindus. O Bradesco comprou o BCN, Mercantil de São Paulo, entre outros. O Itaú comprou o Bemge, Banerj e Banestado. Essa concentração bancária ocorreu durante toda a década de 1990. E em cada uma foi uma experiência diferente. Quando o Unibanco comprou o Nacional, ganhou um milhão de clientes, um ano depois tinha perdido um milhão de clientes. Foi uma fusão mal administrada. E nós fomos acumulando conhecimento. Quando foi a fusão entre Itaú e Unibanco, por exemplo, conseguimos o comprometimento do banco na manutenção de direitos e a experiência acumulada serviu para diminuir o impacto das fusões.
Como foi a construção da Campanha Nacional Unificada, iniciada em 2004 e que perdura até os dias atuais?
Sempre defendemos uma única campanha salarial e convenção coletiva. Tivemos em 2003, com o Lula assumindo a Presidência da República, abertura para negociar com as diretorias do Banco do Brasil e da Caixa Federal, o que não tínhamos no governo do Fernando Henrique Cardoso. Abrimos espaço de diálogo, o que possibilitou garantir um acordo unificado. Foi um processo de construção combinando negociação e mobilização. E a greve de 2004 é um exemplo disso.
As marchas a Brasília uniram diversas centrais e tiveram papel importante no governo Lula. Como foi a participação do Sindicato?
Começamos a conversar com os metalúrgicos para organizar mobilizações pela correção da tabela do imposto de renda. Abrimos negociação com o Palocci (ministro da Fazenda de 2003 a 2006) e conseguimos avançar no primeiro ano. Quando fomos fechar o acordo com o governo, chamamos as centrais sindicais, por ser um acordo nacional. No ano seguinte, conseguimos a correção da tabela do IR e aumento do salário mínimo. Foi aí que começou a luta pela valorização do salário míni mo. Construímos a plataforma dos trabalhadores e passamos a ter a Marcha a Brasília todos os anos. Nosso Sindicato teve um papel muito importante nesse processo.
Também em sua gestão foi criada a Rede Brasil Atual, que vai além do universo de comunicação do Sindicato. Como nasceu esse projeto?
Percebemos que os trabalhadores não tinham voz. Um dia, eu, o José Lopez Feijóo (Metalúrgicos do ABC), e o Paulo Lage (Químicos do ABC), voltávamos de Brasília discutindo sobre a tentativa da grande imprensa de fragilizar o PT. E pensamos em colaborar na construção de um veículo que fosse para todos os trabalhadores. Começamos com a
Revista do Brasil , depois veio o portal Rede Brasil Atual e por aí vai. Criamos a editora Atitude, que é gestora desse processo. É uma combinação entre comunicação e educação.
Eos desafios de ser dirigente sindical nos anos 1990 e 2000 e ser parlamentar nos dias atuais?
O maior desafio era retomar o processo de organização e mobilização, já que não tínhamos espaço para negociar soluções. E então o desafio, com outro perfil dos bancários que não é mais aquele da década de 1980, 1990, mudou. Quando percebemos essa mudança, criamos, por exemplo, o Centro de Formação Profissio nal do Sindicato, para aproximar esses trabalhadores, investir na formação deles. Também construímos laços entre a categoria e cidadania, por meio de projetos como o CineB e o Olhar Local. Tentei por seis anos fazer um diálogo muito forte com a categoria. E hoje, na Alesp, penso sempre na categoria bancária, nos trabalha dores, no movimento popular, seja para educação, transporte, lazer.
Gisele Coutinho - 21/5/2013
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Deputado estadual Luiz Claudio Marcolino fala sobre prazer e desafio de presidir o Sindicato nos anos 2000
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