São Paulo - Ricardo Berzoini ingressou no Banco do Brasil em 1978. A ideia inicial era conciliar o trabalho bancário com a faculdade, mas ele foi “ficando, ficando”. Na greve geral de 1983, que acabou com o Sindicato sofrendo intervenção, Berzoini iniciou de vez sua luta junto aos bancários na organização da greve no Centro de Comunicações e Serviços, conhecido como Cesec – atual Complexo Verbo Divino.
> Página com as entrevistas dos 90 anos
“A greve não deu certo, teve prisão de três companheiros e naquele período eu comecei a participar apoiando a resistência à intervenção no Sindicato. Em 7 de dezembro de 1984, quando fizemos uma greve de 24 horas no Banco do Brasil, eu fui um dos líderes da paralisação no Cesec. E conquistamos eleições para delegado sindical e para fiscal de restaurante”, conta.
E foi justamente para a função de fiscal de restaurante sua primeira eleição. Em 1985, foi eleito delegado sindical de base, função que se dedicou até 1988, quando passou a compor a diretoria do Sindicato. De lá para cá, a trajetória política de Berzoini passa pela presidência do Departamento Nacional dos Bancários da CUT, da Confederação Nacional dos Bancários (CNB, atual Contraf) e do Sindicato. Foi eleito deputado federal pelo Partido dos Traba- lhadores (PT) por quatro legislaturas e esteve ao lado de Lula na Presidência da República como ministro da Previdência Social e do Trabalho e Emprego. Esse ano, Berzoini completa 30 anos de militância no movimento sindical bancário.
A Convenção Coletiva Nacional foi conquistada na sua gestão na CNB? Como foi esse processo?
É importante lembrar que o grande defensor da negociação nacional foi o Luiz Gushiken, durante o seu período como presidente (de 1985 a 1988). Porém, naquele momento, faltavam ainda os instrumentos, pois não tínhamos, por exemplo, uma entidade nacional que representasse todos os bancários.
Trabalhávamos na época com a Contec, mas que já estava em um processo cada vez maior de conservadorismo. Então fundamos a CNB, o que representou o instrumento concreto para buscar a convenção nacional. E foi uma luta. O instrumento por si não é motivo de mobilização, pois muitos não tinham o grau de consciência para lutar por uma convenção nacional. Mas a direção estava convencida disso e fizemos muita pressão junto aos banqueiros para queeles acabassem concordando.
Como foi o início do debate sobre o papel do Sindicato Cidadão?
Chegamos à conclusão de que o Sindicato tinha de cumprir seu papel tradicional, como negociar condições de trabalho e salário, mas também deveria buscar cumprir um papel maior. Esse debate, inclusive, fazia parte do Sindicato na década de 1950, cujo objetivo era buscar maior politização do bancário com a sociedade.
Além disso, já tinha muita gente na categoria que atuava como voluntário ou agia em outros espaços, como nas universidades ou nos conselhos, debatendo a questão da saúde, educação e luta por creche. Por isso chamamos para dentro da entidade. Nessa época, o Sindicato se aproxima muito das associações de moradores de bairro, das favelas, das lutas por moradia.
E a parceria com o MST na histórica greve de 1996, como foi essa integração entre a luta urbana e rural?
Nós mantivemos uma aproximação com o MST no apoio à luta pela reforma agrária. Fizemos vários eventos e debates para a categoria que vive na cidade entender a importância do tema, o que não é uma tarefa fácil. Quando chegou no auge do governo FHC, fizemos movimentações para que a greve de 1996 fosse vitoriosa. No segundo dia de greve, estávamos na Rua Boa Vista quando uma coluna do MST veio descendo com sua militância para a surpresa de todos. E durante toda a paralisação eles nos auxiliaram.
E como foi a negociação com os banqueiros nessa greve?
A década de 1990 foi um período duro, mas também de afirmação do Sindicato. Em 1996, por exemplo, o objetivo deles era fechar a campanha com aumento abaixo da inflação. Fomos então para a greve e no sexto dia eles fecharam acordo com a Contec. Porém, tínhamos aprovado em assembleia que a greve continuava, pois o que a Contec havia aprovado não nos interessava. Nós corremos contra a informação. Toda a mídia dizia que acabou a greve dos bancários e a gente na porta dos locais de trabalho dizendo que não. E a greve continuou por mais quatro dias.
Quando eu fui votar na eleição, domingo de manhã, ligou um dirigente de um banco querendo conversar sobre negociação. Falei: Ué, mas vocês dizem que não tem greve. E ele começou assim: nós reconhecemos que a greve atingiu vários segmentos do sistema financeiro e queremos chegar a um acordo. Eu tinha os parâmetros da reivindicação na cabeça, falei os números e reivindiquei o pagamento dos dias parados. Ele falou que era muito e então respondi que a greve continuava na segunda-feira. Quando deu 5 horas da tarde, ligou o coordenador da Febraban para fazer a proposta e encerrar a greve. Fechamos um acordo muito melhor e desmoralizamos a tentativa deles de usar a Contec contra nós.
E não chegou ao ponto de irpara dissídio coletivo?
Esse foi um problema que não enfrentamos no meu período como presidente do Sindicato, mas enfrentamos quando eu presidia a CNB. Na época, conseguimos convencer os dirigentes de que o dissídio coletivo não era uma proteção para o trabalhador, mas para o capital. Eu até brincava que o juiz do Trabalho em sua maioria se identifica mais com o banqueiro do que com o trabalhador.
Foi nesse ano, em 1991, que eu fui preso. Na saída da Assembleia na Praça da Sé, quando eu atravessei a rua, a Polícia Federal veio e me levou lá para a Rua Piauí. Era a greve só do pessoal do BB e da Caixa. O Tribunal queria decidir e eu defendi em assembleia que enfrentássemos a decisão e mantivéssemos a greve.
Linha fina
“Nenhuma escola ou faculdade permitiria aprender tanto como no Sindicato. A luta pelos direitos dos trabalhadores durante os anos neoliberais do governo FHC foi uma experiência única”
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