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Crise não pode ser pretexto para flexibilização

Linha fina
Dieese e centrais discutiram alternativas de combate ao desemprego, que ameaça "avanço civilizatório", diz professor. Recuperação depende do investimento, principalmente do Estado
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São Paulo – A crise econômica não pode ser pretexto para medidas de flexibilização, disse terça 24 o diretor técnico do Dieese, Clemente Ganz Lúcio, durante debate com as centrais sindicais sobre alternativas de combate ao desemprego. Ele alertou para a possibilidade de responsabilizar pela crise o próprio trabalhador, devido à baixa qualificação da mão de obra, ou mesmo o movimento sindical, por resistir a mudanças nas leis trabalhistas. "O emprego é resultado da dinâmica econômica", afirmou Clemente, chamando a atenção para a retomada de um antigo discurso, que ele chamou de "ladainha", sobre empregabilidade.

Entre as possíveis ações, o diretor do Dieese lembrou do Compromisso pelo Desenvolvimento, firmado no final do ano passado entre centrais e associações empresariais, contendo diretrizes como retomada da produção e da capacidade de investimento do Estado, e ampliação do crédito para empresas e famílias. "Estamos acabando com um dos setores estratégicos da economia brasileira", observou, referindo-se à construção civil, diretamente atingida pela Operação Lava Jato. Segundo Clemente, é preciso manter as investigações sobre corrupção, mas permitindo que as empresas mantenham suas atividades.

"O emprego depende fundamentalmente da intensidade da capacidade da produção de bens e serviços", afirmou o professor Paulo Baltar, do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho (Cesit), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), lembrando que o Produto Interno Bruto (PIB) nominal (em reais) cresceu 3,8% de 2014 para 2015, enquanto a inflação foi de 7,9%. "O grau de utilização da capacidade de produção caiu fortemente." Na mesma base de comparação, o consumo das famílias recuou 4% e o do governo, 1%.

"A queda da economia foi se acentuando ao longo do ano", disse Baltar. O nível de emprego, que ainda foi positivo nos primeiros dois trimestres de 2015, caiu nos três períodos seguintes, de forma cada vez mais intensa.

Em 12 meses, o número de desempregados cresceu em mais de 40%, com acréscimo de 3 milhões, para um total superior a 11 milhões, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), do IBGE. Com isso, jovens e pessoas de baixa escolaridade voltam a pressionar o mercado de trabalho, interrompendo o que ele chamou de sinais importantes de "avanço social civilizatório", agora ameaçado pela crise.

Renda - Boletim divulgado pelo Dieese aponta interrupção da trajetória de elevação do rendimento do trabalho, causada pela deterioração do mercado. Do quatro trimestre de 2014 até o primeiro de 2016, o rendimento médio caiu 2,4% e a massa recuou 4,3%. Foram perdidos quase 1,9 milhão de empregos com carteira, enquanto o trabalho por conta própria aumentou.

"Já começamos a ter, em algumas regiões, a volta do desemprego de longo prazo", afirmou a coordenadora da Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED) no Dieese, Lúcia Garcia. E o problema atinge também trabalhadores com maior nível de escolaridade: pelo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho, o total de desempregados com nível superior subiu de 6,7%, no quarto trimestre de 2013, para 8,1% em igual período do ano passado. Já os dados da PED, feita pelo Dieese e pela Fundação Seade, mostram que os desempregados com experiência anterior representam mais de 80% do total.

Clemente afirma que, além de retomada da dinâmica da economia, é preciso pensar em políticas de promoção e proteção ao emprego. O Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (Codefat), por exemplo, pode ampliar o número de parcelas de seguro-desemprego. Outras medidas podem ser discutidas no Conselho Curador do FGTS e no Conselho de Administração do BNDES, todos com representação dos trabalhadores.

"Não é um problema de curta duração. Levaremos alguns anos para recuperar o nível de emprego de dois anos atrás", diz o diretor técnico do Dieese. É preciso ainda pensar em política industrial, acrescenta, considerando "balela" afirmar que o país tem uma economia baseada no serviços e argumentando que isso não se sustenta sem que haja "base material" proporcionada pela indústria.


Vitor Nuzzi, da Rede Brasil Atual - 24/5/2016
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