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Chapéu
No Congresso

Projetos preveem desmonte de empresas públicas

Linha fina
Especialistas destacaram importância de se lutar contra ameaças privatizantes e apontaram fortalecimento dos canais de comunicação como um dos caminhos
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Foto: Comitê em Defesa das Empresas Públicas

Brasília – Tramitam no Congresso Nacional, entre mais de 50 projetos considerados prejudiciais para os trabalhadores, pelo menos 34 sobre empresas públicas estatais, desde as propostas de reforma da Previdência e trabalhista, matérias para modificar de normas reguladoras a textos sobre participações acionárias e contratações. Por isso, uma maior atenção com o Legislativo não pode ficar de fora do debate dos trabalhadores deste setor. O alerta foi feito pelo analista político Neuremberg Dias, durante seminário promovido na quarta-feira 7 pelo Comitê Nacional em Defesa das Empresas Públicas, realizado com o apoio da Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa (Fenae). A reportagem é da Rede Brasil Atual.

Dias, que é também assessor legislativo do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), afirmou que mesmo diante do momento político pelo qual passa o país e com as pessoas mais preocupadas em saber como se dará a sucessão do presidente da República Michel Temer, é importante que se mantenha a preocupação com o caráter conservador dos deputados e senadores que formam o Congresso.

Segundo ele, os trabalhadores das estatais precisam ficar atentos e participar da discussão destas matérias que tramitam agora. “A agenda é atual e os parlamentares são, em sua maioria, partidários do que deseja o mercado, por isso é importante não baixarmos a guarda”, ressaltou.

Para Neuremberg Dias, o tom conservador da agenda imposta pelo Congresso Nacional, hoje, é semelhante às agendas privatistas observadas nos governos de Fernando Collor e de Fernando Henrique Cardoso.

Também o advogado Luiz Alberto dos Santos, autor do livro A Reforma da Previdência no governo Temer e o desmonte da Previdência Pública no Brasil, que assessora a Fenae, mostrou prejuízos observados com planos de demissão incentivada promovidos pelas administrações das estatais, bem como danos também causados pelo ajuste fiscal e a terceirização. Este último item, a seu ver, “surge com a sua face mais perversa e atropela todo um debate que já estava em curso, quando se tentava restabelecer critérios”.

Redução da atuação – De acordo com Santos, há um enfraquecimento de atuação das estatais  enquanto instrumento de política pública, principalmente nos setores elétrico e de petróleo, onde houve intensa redução de investimento público nos últimos anos. E isso prejudica principalmente as estatais, que precisam de recursos orçamentários para sobreviver e que, em função dos constantes planos de demissão voluntária, terminam reduzindo de forma significativa sua força de trabalho.

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O advogado destacou o projeto de lei sobre o ajuste fiscal, aprovado recentemente, como um dos itens nocivos no tocante a matérias legislativas, já que em sua avaliação, vai restringir ainda mais financiamentos de dívidas fiscais para estados e municípios que querem quitar tais dívidas com a União – com obrigatoriedade de privatização de empresas. “No Rio de Janeiro já foi iniciado esse processo, que passará por vários outros estados”, exemplificou.

Comunicação – Uma das formas de os trabalhadores atuarem para lutar contra a agenda conservadora do Congresso e pelo fortalecimento das estatais, discutida amplamente no seminário, é o fortalecimento dos canais de comunicação, tema de palestra do jornalista Paulo Vannuchi. Representante do Brasil na Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (e ministro de Direitos Humanos de 2005 a 2015), Vannuchi lamentou o fato de que, à época do governo Lula, as concessões para empresas de comunicação terem mantido a prioridade aos grandes veículos de mídia.

Segundo ele, entre 100 a 200 concessões de rádio, o então governo deveria ter incluído 30 com conteúdo voltado para os trabalhadores. Na avaliação do jornalista, “é preciso ter claro que mesmo essa comunicação produzida por entidades sindicais deve ter em mente a necessidade de amplitude, atingindo o maior número de receptores para romper bolhas, pois não se pode pregar apenas para convertidos”.
Ainda de acordo com Vannuchi, “o caminho da mobilização é o que nos resta, pois não se vive hoje uma ditadura, mas um estado democrático de Direito muito suspeito”.

A ênfase à comunicação também foi destacada com a apresentação, por parte da pesquisadora Vilma Bokani, de estudo sobre percepções e valores políticos observados na periferia de São Paulo, realizada pela Fundação Perseu Abramo. Vilma, que coordena o núcleo de pesquisa da fundação, destacou dentre os resultados constatados a forma superficial como essa população distingue os termos direita e esquerda, com influência da mídia hegemônica e o modo como categorias analíticas tradicionalmente usadas pelos estudos não fazem sentido neste universo.

“Para eles direita é o certo, esquerda é o que faz bagunça”, contou. A população pesquisada demonstrou, conforme a pesquisadora, entender política institucional como um bloco monolítico, sem discernir sobre instâncias ou poderes; reconhecer a periferia como classe média e ter a percepção de que o Estado é o inimigo. De acordo com Vilma, “existe um liberalismo particular das classes populares que precisa ser melhor compreendido”.

Já o diretor técnico do Dieese, Clemente Ganz Lúcio, citou investidas privatizantes em curso, como no caso da Petrobras, entre muitas outras, e os riscos ao crescimento do Brasil e à perda de soberania política. “Os (compradores) chineses dirão onde investir na energia, os espanhóis talvez os portos, outros onde investir nos aeroportos”, enfatizou.

Clemente destacou que o projeto de reforma trabalhista do governo Temer tem forte impacto negativo, tanto sobre os trabalhadores, uma vez que se reduz o custo do trabalho, quanto sobre os sindicatos e demais entidades representativas. Ele sugeriu que seja melhor observada a situação das empresas estatais, a exemplo dos observatórios já organizados, para produção de conhecimento que possibilite estratégias de intervenção.

Na mesma linha de Vannuchi e de Vilma Bokani, o diretor do Dieese propôs maior investimento em comunicação, para que a discussão chegue à sociedade brasileira, esclarecendo-se o papel do Estado, das empresas e políticas públicas.

‘Unidade fundamental’ – A coordenadora do comitê, Rita Serrano, e o presidente da Fenae (Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal), Jair Ferreira, consideraram o evento positivo. “Reunimos representantes de dezenas de entidades e de vários estados brasileiros. O bom nível dos debates possibilitou uma unidade fundamental nesse momento, inclusive com a apresentação de propostas e estratégias às quais deveremos dar encaminhamentos”, disse Rita. “Na atual conjuntura esse tipo de unidade é imprescindível”, acrescentou Ferreira.

O Comitê Nacional em Defesa das Empresas Públicas é uma instância organizativa nascida em janeiro de 2016 como consequência da mobilização contra o Projeto de Lei do Senado 555, que estabelecia o Estatuto das Estatais (ou Lei de Responsabilidade das Estatais). Tem a participação de centrais (CUT, UGT, Nova Central, Intersindical, Conlutas e CTB) e o apoio de entidades como a Fenae, Contraf-CUT (trabalhadores no setor financeiro) e FUP (petroleiros), representando centenas de categorias de trabalhadores em todo o Brasil.

Em junho do ano passado, o comitê lançou no Rio de Janeiro a campanha “Se é público, é para todos”, de alcance nacional, para denunciar os riscos das privatizações, tanto para trabalhadores de empresas atingidas como para a sociedade brasileira.

 

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