Delegados e delegadas de todo o Brasil estiveram reunidos, nesta quinta-feira (6), em São Paulo, para o Encontro Nacional dos Funcionários do Santander. Após um longo dia de debates, que incluiu análise de conjuntura, apresentação dos resultados da pesquisa de saúde, destaques do último balanço do banco e discussão das propostas, os participantes aprovaram a minuta de reivindicações específicas, que servirá de base para as discussões da renovação do Acordo de Trabalho Coletivo (ACT) aditivo. O documento será entregue ao Santander no dia 10 de junho.
“Tivemos um encontro muito representativo, com a presença de mais de 100 delegados vindos de todo o país. Durante o dia, foi possível debater a conjuntura nacional e internacional, que nos impactam diretamente, já que o banco está presente em mais de 26 países. Debatemos também as nossas reivindicações específicas, que foram aprovadas”, avalia a coordenadora da Comissão de Organização dos Empregados (COE/Santander), Wanessa Queiroz.
“Vale destacar que incluímos na nossa minuta de propostas que já foram clausuladas no acordo dos bancários da Espanha, como, por exemplo, a redução da jornada de trabalho, cláusulas ambientais, para que o banco possa dar cobertura aos seus funcionários em caso de catástrofes e emergências climáticas, e também propostas que atendam o grupo de trabalhadores, bem como seus filhos, que se enquadram como neuro divergentes”, afirma Wanessa. “Tudo isso, além das propostas de valorização das cláusulas econômicas, que concentram as bolsas de estudo, os programas próprios e o PPRS, que será negociado em breve”, acrescenta.
Encerrado o encontro, a coordenadora da COE/Santander destacou como fundamental a mobilização e a participação dos funcionários e funcionárias do Santander em todas as etapas da Campanha Nacional 2024, seja acompanhando as negociações, se mobilizando nas redes sociais ou participando das assembleias.
Análise de conjuntura
Para dar início ao Encontro Nacional, o cientista social e professor Moisés Marques e o ex-presidente do Sindicato dos Bancários de São Paulo João Vaccari Neto fizeram uma ampla análise de conjuntura nacional e internacional.
Moisés Marques começou afirmando que vivemos atualmente um cenário de policrises, com pelo menos oitos crises acontecendo simultâneas (saúde, ordem social e governança, do sistema alimentar, segurança internacional, energética, ambiental, dos transportes e tecnologias da informação e econômica). “Nos próximos anos, muitas mudanças tecnológicas afetarão nosso trabalho. Além disso, conviveremos com a geopolítica de um mundo em transição. Ou seja, estamos diante de um cenário bastante complexo”, afirmou.
Na sequência, o professor resumiu os fatos sobre algumas das últimas eleições no mundo e apontou para um cenário de baixa popularidades dos líderes políticos, marcado por uma crise global da democracia, pela ascensão da extrema direita na Europa e pelo crescimento do conservadorismo. O déficit fiscal dos Estados Unidos e a baixa popularidade do atual presidente norte-americano Joe Biden também fizeram parte da análise.
“Temos, com isso, uma nova geografia do poder, com o crescimento dos Brics e tendo China e Índia com os dois maiores volumes de subsídios do mundo”, afirmou. Marques também abordou os conflitos entre Rússia e Ucrânia, Israel e Palestina e encerrou destacando a questão ambiental, que tem afetado todo o planeta. “Apesar de parecer um cenário catastrófico, nós temos algumas coisas interessantes acontecendo, como, por exemplo, a eleição de Claudia Sheinbaum Pardo no México. O que nos aponta que é preciso continuar lutando, pois lutar vale a pena”, encerrou.
João Vaccari Neto, por sua vez, iniciou sua análise de conjuntura nacional na questão do petróleo. “Desde 1975 a questão do petróleo nos afeta. Qual foi a base operativa da Lava Jato? Justamente o petróleo. Qual foi a primeira coisa que fizeram quando derrubaram a Dilma? Mudaram a legislação do petróleo, acabando com a partilha”, pontuo, defendo que enquanto o petróleo não for desnecessário, é preciso agir de forma a proteger o meio ambiente e criar fundos que garantam a industrialização e o desenvolvimento do País.
“Sendo assim, precisamos continuar fazendo o desenvolvimento da exploração do petróleo com todos os cuidados que isso requer e com toda a tecnologia necessária. Para nós, é importante agregar isso ao nosso patrimônio, pois significa uma mudança de patamar. Precisamos que o petróleo seja o condutor do desenvolvimento, já que ainda temos que fazer a industrialização do Brasil, caso não queiramos estar fadados a plantar soja e milho.
Ao falar da política nacional, Vaccari afirmou que estamos vivendo um governo marcado por contradições. “Isso porque nós não temos a maioria no Congresso Nacional e estamos reféns de um conjunto de deputados que está mais preocupado com a pauta dos costumes, já que não têm um projeto econômico para o País”, disse. Segundo ele, ao fazer mudanças na legislação do trabalho, do petróleo e do sistema financeiro, esses políticos propiciaram o surgimento de novos operadores financeiros, que não existiam anteriormente e que não cumprem as regras estabelecidas com os trabalhadores do Ramo Financeiro.
“Precisamos avançar no debate da regulamentação do setor financeiro, pressionando para que ela ocorra de forma a respeitar os nossos direitos, conquistados com anos de organização. A luta dos trabalhadores passa por um momento difícil, mas nós precisamos continuar combatendo a precarização, e para isso precisamos mobilizar, denunciar, discutir, negociar e propor mudanças”, concluiu.
Saúde como prioridade
Após a análise de conjuntura, foi a vez do secretário de Saúde da Contraf-CUT, Mauro Salles Machado, apresentar a síntese da pesquisa “Modelos de gestão e patologias do trabalho bancário” para os delegados e delegadas do Encontro Nacional. O dirigente iniciou sua fala contextualizando as profundas mudanças por que passa a organização do trabalho bancário.
“Atualmente, vivenciamos nos bancos um clima organizacional crítico, marcado pela incerteza no futuro. São reestruturações permanentes, demissões, fechamento de agências e terceirização, além do aumento da pressão por resultados. Somam-se a isso a gestão pelo medo, o ambiente hostil e a desregulamentação na legislação trabalhista”, resumiu Mauro.
Segundo o secretário de Saúde, esse conjunto de fatores se traduz em um “mecanismo adoecedor”, que se caracteriza pela busca do lucro, com aumento do ritmo de trabalho e a pressão por resultados, com metas abusivas, gerando um ciclo em que a remuneração variável está atrelada às avaliações. Tudo isso gera um aumento das violências e do assédio moral a que os bancários estão submetidos e, ao final, culmina no adoecimento.
“Tal mecanismo foi desvelado, no caso do Santander, pela sentença condenatória do Ministério Público do Trabalho (MPT), em que os Autos de Infração lavrados contra o réu comprovam de maneira irretorquível e indelével que o banco vem adotando medidas precarizantes, com exigência de metas abusivas e excessivas, entre tantas outras”, ressaltou Salles. “A sentença estabelece ainda três principais obrigações ao banco, que compreendem a implementação de nova sistemática de metas; a negociação coletiva sobre taxas de incremento de metas e frequência; e as vedações de práticas patronais no que tange ao manejo de metas. Cabe a nós acompanharmos e cobrar respostas do Santander!”, concluiu.
Ao apresentar os resultados da pesquisa, Salles informou que 5.803 trabalhadores bancários de todo o Brasil responderam ao questionário. Destes, a maior parte declarou estar trabalhando (86,7%). Outros 9% declararam estar em afastamento devido a licença-saúde e 15,5% dos respondentes declararam estar com atestado médico recomendando afastamento do trabalho.
Para 54,5% dos participantes, o principal motivo para buscar tratamento médico foi o trabalho e 76,5% declarou ter tido pelo menos um problema de saúde que considera relacionado ao trabalho no último ano. Quase metade dos respondentes (40,2%) disse estar em acompanhamento psiquiátrico e mais da metade (59,7%) informou estar em acompanhamento com outras especialidades. Entre os que estão em acompanhamento psiquiátrico, 91,5% estão utilizando medicações prescritas.
Conforme destacou o secretário de Saúde, os resultados apurados na pesquisa indicam presença intensa de todos os fatores e riscos psicossociais. Trata-se, portanto, de um resultado crítico que indica a alta ocorrência de situações associadas a um modelo de gestão pautado no controle e na vigilância, causando patologias da sobrecarga e da violência e múltiplos sintomas de adoecimento no nível físico, psicológico e social.
“Diante desses dados, é importante chamar atenção para que a Saúde seja prioridade da Campanha Nacional dos Bancários 2024. E no Santander, em especial, não podemos normalizar essa situação. Precisamos dar visibilidade ao problema, conversando com os bancários e também com a sociedade. Mais do que isso, os trabalhadores estão pedindo socorro e nós precisamos organizá-los, mobilizá-los e lutar para pactuar com os bancos cláusulas que, no mínimo, aliviem essa pressão que está insustentável”, finalizou.
Destaques do lucro trimestral
Após o almoço, os delegados e delegadas do Encontro Nacional voltaram a se reunir para a apresentação da análise dos resultados do banco no primeiro trimestre de 2024 e emprego, com a economista e técnica na subseção Contraf-CUT do Dieese, Vivian Machado. Ela abriu sua fala relembrando que, em 2023, a soma dos lucros dos cinco maiores bancos totalizou R$ 108,6 bilhões. Somente o Santander lucrou R$ 9,38 bilhões.
Já no primeiro trimestre de 2024, o lucro líquido dos três maiores bancos privados no Brasil somou R$ 17,0 bilhões. Nesse período, o Santander lucrou R$ 3,02 bilhões, uma alta de 41,2% se comparado ao último trimestre de 2023. Em consequência, a Rentabilidade sobre o Patrimônio Líquido (ROAE) do banco também subiu 3,5 p.p., atingindo uma das melhores rentabilidades que o Santander tem para o balanço global. “Ao considerar o lucro líquido global de € 2,852 bilhões, a unidade brasileira representou 19,7% do resultado do Grupo Santander”, destacou a economista.
Na sequência, Vivian abordou o crescimento da Carteira de Crédito do banco, impulsionado pelo segmento Pessoa Física e Consumo, bem como os negócios estratégicos, com destaque para os segmentos de cartões, consignados, financeira e agronegócio. A técnica do Dieese também abordou o crescimento dos investimentos em captação de clientes.
Sobre a inadimplência, a economista afirmou que ela se manteve estável, dentro da média do sistema. “As taxas de inadimplência estão caindo, mas ainda se mantêm acima do período anterior a pandemia”, destacou. Ainda segundo ela, as despesas de PDD reduziram quase pela metade. “No início de 2023, as despesas de PDD cresceram significativamente, acompanhando a alta da carteira, da inadimplência PF, do caso das Lojas Americanas e de outra empresa do atacado não detalhado pelo banco. Contudo, essas despesas estão se reduzindo a partir do primeiro trimestre de 2024”, informou.
Já com relação às receitas com tarifas e prestação de serviços, a economista destacou que, no primeiro trimestre, elas cresceram 14,2%% em relação ao período anterior. As despesas com pessoal cresceram 10,1%, impulsionadas pelos encargos e remuneração. Apesar disso, as receitas com tarifas e prestação de serviço cobriram o equivalente a 175,4% das despesas de pessoal do banco. Para finalizar, Vivian apresentou o crescimento do número de postos de trabalho no primeiro trimestre na holding Santander, em doze meses, embora o banco não divulgue mais dados específicos de bancários. “O saldo, em 12 meses, é de 1.654 postos abertos, porém, no trimestre, foram fechados 401 postos de trabalho”, informou. O Brasil representa 27,0% do emprego global do Santander e 29,6% do número de agências. O banco também não publica mais o número de agências físicas, a informação é agregada como pontos de atendimento. No primeiro trimestre de 2024, o Santander fechou 89 pontos de atendimento e, em 12 meses, fechou 374 pontos.